25 novembro 2012

"O Brasil vai receber bilhões de dólares em investimentos"

José Olympio Pereira, presidente do Credit Suisse Brasil, é um observador privilegiado da economia brasileira.

 O banco que comanda é interlocutor dos maiores investidores mundiais. A subsidiária brasileira da tradicional casa bancária suíça participou de quase todas as aberturas de capital dos últimos anos. Ao avaliar o cenário para 2013, o tradicionalmente cauteloso Pereira diz estar bastante otimista. Apesar do crescimento fraco da economia brasileira em 2012 e do cenário internacional adverso, ele avalia que o Brasil entrou, de vez, no radar dos grandes negócios globais. Melhor do que isso, o capital que está chegando ao País é de longo prazo, que quer vincular-se em profundidade ao crescimento esperado da economia nos próximos anos. Recém-chegado dos Estados Unidos, Pereira falou com a DINHEIRO na nova sede do banco, na zona sul de São Paulo. A seguir, os principais trechos da entrevista: 

DINHEIRO – Os prognósticos de crescimento da economia brasileira em 2012 eram de 3%, mas o resultado será pior. O que esperar para 2013?
 JOSÉ OLYMPIO PEREIRA – Estamos mais otimistas. Esperamos um crescimento de 4%, por vários motivos. Um deles é estatístico: em 2012, a base de comparação é menor. Outro é por acreditarmos em uma melhora do cenário internacional e das expectativas do consumidor e dos investidores. Finalmente, a política econômica será fundamental para isso. Os juros menores, a desoneração da folha de pagamentos e os incentivos fiscais vão superar o impacto negativo do cenário internacional.

DINHEIRO – Os juros estão em patamares historicamente baixos. Isso veio para ficar? Quais serão as consequências para os investimentos no ano que vem?
PEREIRA – Não apenas os juros estão menores, os spreads bancários também caíram e tudo indica que devem continuar nesses patamares no ano que vem. O cenário de 2013 será benigno para o consumo e para os investimentos. Eu acredito que a principal mudança no Brasil aconteceu no patamar estrutural dos juros. É como um paciente que precisava de uma dose cavalar de remédio para controlar uma doença crônica. Por isso, o Banco Central (BC) administrava juros em doses cavalares. Agora, esse tratamento mudou. Quando o BC quiser segurar a inflação, não terá mais de manter juros reais de 5% ou de 8% ao ano. O BC tem conseguido controlar a inflação com juros reais de 1% a 3%.

DINHEIRO – A inflação tem ficado sistematicamente perto do teto da meta. Há riscos de descontrole?
PEREIRA – Não deve ocorrer nenhuma alta significativa dos preços. Por isso, descartamos a hipótese de uma elevação significativa dos juros. Claro, é necessário discutir se a meta de inflação de 4,5% é adequada no longo prazo, se é possível mantê-la nesse nível, se é possível ser mais agressivo. Tudo isso pode ser discutido, mas o que é relevante é que não vemos nenhum sinal de descontrole inflacionário no horizonte. Não se trata de dizer que o Brasil precisa de investimento. Ele precisa de muito investimento, e pode sublinhar esse muito na hora de publicar esta entrevista (risos).

DINHEIRO – Qual o principal impacto positivo desse juro estruturalmente mais baixo?
PEREIRA – Comecemos pelas contas públicas, onde a queda dos juros corrige uma distorção histórica. A dívida pública brasileira está ao redor de 50% do Produto Interno Bruto (PIB). Não é um percentual elevado, mas o problema é que essa é uma dívida muito cara. Se mudarmos o patamar dos juros que o governo paga para rolar sua dívida, isso vai permitir que as contas melhorem sem que seja necessário arrecadar mais impostos. Ou, alternativamente, o governo pode manter o mesmo superávit primário, mas haverá mais recursos para investir. O setor privado também será beneficiado. Juros mais baixos reduzem o custo de financiamento das empresas, o que aumenta sua capacidade de produção. Taxas menores também permitem que a classe média se endivide de forma mais sustentável, e é esse endividamento que vai continuar sustentando o crescimento da economia.

DINHEIRO – O mercado interno continuará sendo um vetor de crescimento?
PEREIRA – Sem dúvida. O consumo brasileiro ainda tem muito espaço, os limites do mercado interno estão longe de ser atingidos. As justificativas para isso são as mesmas. Já não é novidade falarmos da ascensão da classe C, e, mais recentemente, da migração das pessoas da classe D, mas o fato inegável é que há mais gente passando para uma classe superior, e, com isso, o potencial de consumo cresce.

DINHEIRO – Há riscos?
PEREIRA – Eu diria que há alguns cuidados a ser tomados. É importante que o governo resista à tentação de elevar os gastos. A melhora nas contas públicas deve ser repassada para a sociedade como um todo, seja por meio de redução de impostos, seja por meio do aumento do percentual de investimentos. Remarcação de preços em supermercado em São Paulo: sem riscos de inflação

DINHEIRO – Há uma saída de recursos da bolsa. Como o sr. vê o interesse dos investidores estrangeiros?
PEREIRA – Nós temos interlocução com clientes ao redor do mundo e notamos, nos últimos dois anos, um certo desinteresse com relação ao Brasil, especialmente na bolsa. Os investidores estrangeiros abandonaram um pouco a bolsa, mas isso é temporário. Eles, com certeza, vão retornar.

DINHEIRO – O Brasil não deixou de ser a bola da vez?
PEREIRA – Muito ao contrário. O que ocorreu foi que o perfil do investidor mudou, e para melhor. Há menos interesse pelo investimento em empresas abertas, listadas em bolsa, que costuma ser um investimento de mais curto prazo, e há um maior interesse pelas participações em companhias fechadas, com grande potencial de crescimento. Há muito dinheiro de private equity chegando. Todos os grandes fundos internacionais, como Carlyle, Texas Pacific, Blackstone e KKR, estão aqui ou querem entrar no mercado brasileiro. Isso sem contar os gestores nacionais, como a GP Inves­timentos, o BTG, a Vinci Partners. Eles não têm dificuldade na hora de levantar capital para investir. O País entrou, de fato, na rota dos investimentos e vai receber bilhões de dólares nos próximos anos.

DINHEIRO – Quais os indícios disso?
PEREIRA – Há vários. Vamos olhar uma transação recente, a aquisição da Amil pela americana United Health Group. É, até agora, o maior investimento isolado de uma companhia americana no Brasil – foi uma aquisição de US$ 5 bilhões. A UHG é a maior do mundo na área de seguro-saúde, tem uma capitalização em bolsa de US$ 60 bilhões e nunca havia, até então, feito uma expansão. O fato de uma empresa desse tamanho e com esse perfil ter investido tanto dinheiro no Brasil mostra que, de fato, o País entrou definitivamente no radar dos investidores, mas de maneira diferente. Hospital da Amil na Grande São Paulo

DINHEIRO – Por que esse negócio indica uma mudança?
PEREIRA – Se a United fosse seguir o script tradicional, ela teria primeiro investido nos vizinhos, como o Canadá e o México. Depois iria para a Europa, em seguida o Leste Europeu, e só então seria a vez de a América Latina e o Brasil entrarem no radar. O fato de ter começado pelo Brasil é um sinal de que o interesse está muito maior e diferente. Outro exemplo foi a primeira rodada de concessão dos aeroportos, que contou com a participação de grupos nacionais e estrangeiros, numa disputa acirrada. Quando o investidor olha o mercado mundial, ele vê as vantagens do Brasil: tamanho da economia, estabilidade e potencial de crescimento. O Brasil está muito bem colocado, até mesmo em comparação com os demais Brics.

DINHEIRO – A infraestrutura vai continuar atraindo dinheiro, então?
PEREIRA – Por muitos anos, e em grande quantidade. O potencial é imenso. Há uma enorme necessidade de investimentos em estradas, ferrovias, portos, aeroportos, só para citar os exemplos mais evidentes. Se o governo criar estruturas financeiras e societárias seguras e favoráveis ao investimento, vai atrair muito capital. Não podemos nos esquecer de que as taxas de juro mundiais estão em recorde de baixa, e essa situação não deve mudar tão já. Em várias economias desenvolvidas, o juro real está negativo, e por isso o capital busca alternativas de rentabilidade. O Brasil aparece bem nessa foto, há muito dinheiro interessado em vir para cá. Só temos de ter em mente que o capital procura uma relação entre risco e retorno que faça sentido e estabilidade nas regras. Nesse ponto, a privatização da telefonia, na década passada, foi exemplar. Criou competição, ampliou o acesso dos consumidores aos serviços e garantiu a vinda de muito dinheiro para fazer os investimentos que eram necessários.

DINHEIRO – Onde estão as maiores oportunidades?
PEREIRA – O potencial inexplorado de consumo do Brasil ainda é imenso. Tomemos o setor de saúde, por exemplo. É um setor grande, que está em franco crescimento devido à melhoria da renda, e também é um setor fragmentado, com um enorme espaço para consolidação. Isso ocorre também com outros setores, como consumo, varejo e outros serviços. Também não podemos nos esquecer que há um volume significativo de poupança doméstica disponível.

DINHEIRO – De onde virão esses recursos?
PEREIRA – Muitos investidores estão órfãos da renda fixa, depois da queda das taxas de juros. Acreditamos que esses recursos, hoje aplicados em títulos públicos, vão buscar três grandes nichos de mercado. Um deles serão os fundos imobiliários, que foram o grande negócio de 2012 e devem atrair ainda mais dinheiro em 2013. Outro são os fundos de crédito, que permitem uma rentabilidade melhor. Finalmente, haverá uma grande migração de dinheiro para a bolsa. Nesse caso, os investidores vão procurar ações mais defensivas, como aquelas de empresas que são boas pagadoras de dividendos. Na nossa avaliação, os setores mais interessantes são os mais voltados ao mercado interno: educação, varejo, shoppings e bancos.
 Por Cláudio GRADILONE
Fonte:Isto É Dinheiro 25/11/2012

25 novembro 2012



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