15 julho 2012

A BM&FBovespa precisa flexibilizar as regras de listagem do Bovespa Mais para atrair empresas?

SIM 
Quase Novo Mercado 
Custos semelhantes aos do segmento premium afastam empresários do mercado de acesso 
Ivan Clark

 O Bovespa Mais foi criado para que pequenas e médias empresas pudessem acessar o mercado de capitais. No entanto, não vem cumprindo esse objetivo, embora haja, no País, de 15 mil a 20 mil empresas com faturamento entre R$ 20 milhões e R$ 400 milhões e número de funcionários entre 250 e 1.000.

O BNDES e a BNDESPar têm sido os principais agentes financeiros na concessão de financiamento para esse segmento, mas, como as operações de crédito não poderão se expandir eternamente, o mercado de capitais logo será pressionado a assumir um papel relevante na captação de recursos dos negócios emergentes.

 Na prática, o Bovespa Mais demonstra pouca receptividade para ofertas públicas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês) menores. Prova disso é o valor médio dos IPOs nos últimos anos no Brasil, que é de US$ 460 milhões. Na Austrália, a média em 2011 foi de US$ 66 milhões, enquanto no Canadá não passou de US$ 28 milhões. Não por acaso, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) está avaliando flexibilizar as regras para incentivar aberturas de capital inferiores a US$ 300 milhões.

 A maioria das empresas busca o mercado de acesso para expor a evolução de seus negócios aos analistas visando a atrair um número reduzido de acionistas estratégicos, normalmente investidores qualificados que não necessitam de tantas garantias. Uma análise gerencial de informações patrimoniais e operacionais selecionadas a cada trimestre seria suficiente para acompanhar o progresso financeiro de uma companhia nesse mercado.

 Os Estados Unidos, maior mercado bursátil global, recentemente reconheceram que a mão pesada do regulador estava impactando negativamente a safra de IPOs. O Jobs Act, lei aprovada em abril deste ano, veio para permitir que emerging growth companies (empresas com receita anual bruta de até US$ 1 bilhão) se beneficiem de algumas isenções, como a auditoria das demonstrações financeiras de somente dois exercícios (em vez de três) anteriores ao IPO e a exclusão, nos primeiros cinco anos após a abertura de capital, da obrigação de auditoria externa dos sistemas de controles para a publicação de balanços anuais.

 As exigências do Bovespa Mais para um IPO não são muito diferentes das do Novo Mercado.
Reduzir os exercícios auditados na oferta inicial de três para dois, permitir a divulgação de demonstrações financeiras anuais somente no website e deixar de arquivar os informes trimestrais (ITRs) na CVM durante os primeiros três exercícios pós–IPO seriam incentivos que aliviariam as empresas. Por que não adotar algumas fases intermediárias e conceder um prazo de sete anos para que o degrau mais elevado (o atual) seja atingido?

Talvez o documento que assuste o empresário seja o formulário de referência, que exige um batalhão de profissionais para detalhar a vida da empresa e os riscos enfrentados por ela. Para o registro no Bovespa Mais, talvez fosse o caso de a CVM diminuir os requisitos dessa ferramenta de divulgação e controle. Ou, eventualmente, redefinir o atual conceito de supervisão, passando parte da responsabilidade de compliance hoje exercida pela CVM para os agentes de mercado. No AIM, o mercado de acesso da Bolsa de Londres, o Nominated Advisor (Nomad), geralmente um banco de investimento, assume a responsabilidade por checar e guiar a empresa no caminho do IPO. Um pouco de simplificação de processos ajudaria o Bovespa Mais a repetir parte do êxito do Novo Mercado.

 NÃO 
Pronto para embalar
Fatores que atrasaram o desenvolvimento do mercado de acesso estão sendo superados
Álvaro Gonçalves 

 Três fatores — nenhum deles de natureza regulamentar ou estrutural — retardaram até recentemente o interesse de empresários em tentar uma captação no Bovespa Mais.

O primeiro e mais importante foi a fase de aguda predileção por ativos mais líquidos e pelas operações de grande porte. O Bovespa Mais surgiu em 2006, numa época imediatamente anterior a uma forte turbulência nos mercados. As empresas foram desestimuladas a considerar a abertura de capital em razão de um sentimento de crise presente ou iminente, que produziu um período de valorização da liquidez "do dia seguinte" e dos altos volumes. Esse apego à dimensão das operações contaminou irracionalmente o funcionamento do nosso mercado: o Brasil tem um número de companhias de capital aberto reduzido quando comparado ao de outros emergentes, mas tem, paradoxalmente, o maior tamanho médio de ofertas públicas iniciais de ações (IPOs, na sigla em inglês) do mundo.

 O segundo fator foi o ciclo de elevação da taxas de juros que marcou a maior parte do período após o lançamento do Bovespa Mais. Com menos opções de financiamento (alternativo ou internacional), as empresas médias sofreram pressão desproporcional e não acumularam lucros ou taxa de crescimento capazes de lhes dar a segurança necessária para ofertar ações ao mercado. Esse obstáculo vem sendo transposto e, em breve, os balanços estarão suficientemente atrativos para alçar muitas novatas à bolsa. 

Por último, um aspecto mais operacional e silencioso prejudicou o processo de preparação de estreantes no pregão. A situação geral das empresas brasileiras no que diz respeito a contabilidade e auditoria começou a se aproximar da normalidade e da qualidade apenas nos últimos anos. Grande parte do nosso parque de negócios de capital fechado ou ainda não é auditado ou não tem auditoria compatível à de uma companhia aberta. Do lado da contabilidade, as mudanças recentes na legislação impactaram profundamente o funcionamento e os prazos de elaboração de demonstrativos contábeis — afetando até mesmo as grandes empresas de capital aberto. Também nesse caso já se pode notar uma evolução positiva, prestes a impulsionar uma fila de empresas na direção do Bovespa Mais.

 É importante ressaltar que não há nenhuma necessidade específica de ajustes no regulamento do segmento nem no que diz respeito aos custos. As três primeiras entrantes tiveram gastos de listagem bastantes reduzidos ante outras alternativas de financiamento. O benefício institucional (além do financeiro) da abertura de capital é muito maior. Além disso, uma comparação internacional também indica que temos um dos processos mais acessíveis do planeta. Aprimoramentos podem ocorrer e serão sempre bem–vindos, mas não existem evidências concretas e relevantes de impedimentos, fora os três fatores aqui citados, os quais, por sua vez, estão se esgotando. Essa constatação já resulta numa postura renovada dos agentes de mercado, que vêm estimulando e garimpando empresas no cenário nacional.

 O Bovespa Mais é, portanto, uma realidade. Logo as companhias brasileiras vão descobri–lo como um espaço excepcional para iniciar a relação com o mercado de capitais, aprimorar a gestão financeira, melhorar a estrutura de capital, ampliar sua base de acionistas de forma sustentável no longo prazo e, sobretudo, financiar seus projetos de crescimento.
 Fonte: Revista Capital Aberto 14/07/2012

15 julho 2012



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