O trabalho de Ian Cheshire é ajudar a milhões de clientes europeus a reparar goteiras, trocar lâmpadas queimadas e pintar suas casas. Mas hoje em dia, o diretor-presidente da britânica Kingfisher PLC, a terceira maior rede de lojas de construção e reformas do mundo, tem um problema que nem mesmo o mestre de obras mais destro pode consertar: quase metade dos lucros da empresa é gerada na Europa.
Cheshire e os acionistas da Kingfisher, 50% dos quais estão na América do Norte, são passageiros do trem desgovernado de desunião europeia, incertos sobre se ele vai descarrilar ou se voltará aos trilhos.
"O resultado é muito binário", disse Cheshire, numa conversa durante o Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça. "Realmente está tudo na mão dos políticos".
Minutos depois, Angela Merkel, inadvertidamente, confirmou seu argumento. Em discurso durante o Fórum em Davos, a chanceler alemã eliminou as esperanças de investidores de que ela afrouxaria sua oposição a mais ajuda financeira para Itália, Espanha e Portugal, pedindo, em vez disso, mais austeridade teutônica para os países em dificuldades.
Muita tinta foi gasta para analisar as reações dos mercados a essa experiência ao vivo e em cores de como não administrar uma união monetária. A twittosfera e os blogs estão cheios de relatos sobre as consequências sociais dos problemas do euro. Mas, surpreendentemente, pouco tem sido dito sobre um elemento-chave da compacta economia europeia: as empresas e seus acionistas.
Se esta crise estivesse ocorrendo nos Estados Unidos, não seria possível ligar a televisão ou abrir um jornal sem esbarrar numa empresa ou comentarista conclamando os políticos a liberar o Grande Espírito Empresarial Americano.
Na Europa, é revelador que o debate não tenha conseguido se concentrar nos centros comerciais e avenidas onde a economia real acontece, permanecendo confinado a salas pouco arejadas de Bruxelas e gráficos áridos de especialistas dos mercados de capitais.
No entanto, é impossível ter uma macroeconomia saudável sem a microeconomia, alimentada por empresas que vão das grandes multinacionais a pequenas e médias empresas da Alemanha e firmas familiares da Itália.
É aqui que Cheshire entra. Nos últimos meses, esse executivo de fala mansa e 51 anos de idade acrescentou outra tarefa à sua lista de afazeres. Além de supervisionar uma empresa com cerca de 10 bilhões de libras esterlinas (US$ 15,7 bilhões) em vendas anuais e mais de 900 lojas que vão desde a rede B&Q no Reino Unido à Castorama, na França, e a Brico Depot, na Espanha, Cheshire vem lidando com verdadeiros jogos de guerra.
A Kingfisher vai bem, apesar das condições do mercado. Mas tem copiado os bancos e feito "testes de estresse" em seus negócios, elaborando planos de contingência para cenários tenebrosos na zona do euro.
A rede britânica não está sozinha. Todos os líderes empresariais europeus com quem conversei em Davos disseram que eles têm de se preparar para o pior.
Os cenários considerados por Cheshire são bastante inusitados para um vendedor de pincéis e chaves de fenda.
Em vez de fazer previsões sobre, por exemplo, novas construções ou a renda disponível, as mentes mais brilhantes da Kingfisher estão tentando avaliar: como os sistemas de pagamentos da zona do euro reagiriam à expulsão de um ou mais países do bloco; o grau de resistência do caixa da empresa, caso seus bancos se vejam em problemas e se agravem as condições de financiamento para os vários fornecedores dos quais depende.
"Apenas queremos ter certeza de que, se houver problemas, nós ainda seremos capazes de movimentar dinheiro", disse Cheshire. Essa também é uma das principais preocupações de muitos investidores em empresas europeias.
"É difícil avaliar as empresas, se você não sabe o quão grave a situação vai ficar", disse um gestor de recursos dos EUA com investimentos na Europa.
Quando perguntei a Cheshire sobre a atitude de seus investidores dos EUA — que incluem fundos gigantes de investimentos como a BlackRock Inc. e a Thornburg Investment Management—, em relação à situação na Europa, ele fez uma pausa antes de responder. "Impaciência e confusão", disse, num resumo eficaz da visão mundial sobre os acontecimentos na zona do euro. "Esse é o tema das conversas entre as multinacionais e seus investidores".
Mas é mais do que apenas conversa. As convulsões de um bloco econômico tão vasto estão forçando as empresas a fazerem mudanças mais profundas.
Um diretor-presidente de uma empresa italiana me disse recentemente que, dadas as sombrias perspectivas econômicas, sua empresa — uma das pedras angulares da base industrial da Itália — estuda transferir a produção para fora do país.
Na Kingfisher, Cheshire quer mudar o sistema de pagamento de bônus para a equipe — uma parte crucial da remuneração — para contabilizar a imprevisibilidade dos mercados. Em vez de associar o bônus a metas absolutas de vendas, ele quer atá-los à diferença entre o desempenho das lojas e do mercado geral. Dessa forma, mesmo um crescimento modesto seria recompensado, desde que a loja supere a concorrência.
Os governos europeus deveriam prestar atenção. Já que (quase) tudo falhou, talvez valesse a pena associar o salário dos políticos ao crescimento econômico de seus países. Pelo menos, eles teriam incentivo para fazer um trabalho melhor de reconstrução da problemática moeda única da Europa. Por FRANCESCO GUERRERA
Fonte:WSJAmericas31/01/2012
01 fevereiro 2012
Empresas da União Europeia se preparam para o pior
quarta-feira, fevereiro 01, 2012
crise, Investimentos, Tese Investimento, Transações MA
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Ruy Moura
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