13 fevereiro 2012

Os executivos que valem ouro

Pesquisa mostra os cargos mais buscados por empresas, em que se destacam setores como finanças, vendas, marketing, óleo e gás e engenharia. 'Namoro' para atrair profissionais pode durar até dois anos

Quem achava que conhecia o mercado brasileiro para executivos de alto escalão está sendo obrigado a rever conceitos. Com a evolução da economia brasileira e a emergência de alguns setores - como a construção civil, o varejo no Nordeste e o setor de óleo e gás no Rio de Janeiro -, velhas verdades foram desafiadas. Hoje, por causa da falta de profissionais, um diretor financeiro ganha mais no Rio do que em São Paulo. Um gerente de manutenção para a área de engenharia é mais bem pago no Nordeste que no Sul, segundo pesquisa de cargos e salários da consultoria britânica Michael Page (veja quadro abaixo).

Para certos cargos, o "namoro" com um candidato de boa formação pode durar dois anos. Foi o que ocorreu com Vinicius Gouveia, que acabou de assumir a gerência de vendas da americana World Compliance no País (o grupo vende informações sobre regulação para empresas). Gouveia, que estava na Serasa Experian havia cinco anos, tinha sido entrevistado pela Michael Page em 2010. Foi convidado para participar de alguns processos seletivos e sempre disse não. A proposta da World Compliance, porém, o fez mudar de ideia. "Sou o primeiro contratado da empresa. Caso atinja as metas de vendas, posso ficar à frente do escritório da companhia no Brasil", diz Gouveia.

O executivo de 31 anos diz que a mudança exigiu uma boa dose de autoconfiança, já que o êxito da World Compliance no País depende basicamente de sua capacidade de convencer os empresários locais da importância do serviço. O tamanho do desafio, conta Gouveia, pesou mais do que o dinheiro na hora da troca. "No pacote anual, a diferença vai ser de 10%", explica. Houve também um claro aumento de responsabilidade em relação às funções exercidas na Serasa, considerada uma das melhores empresas para trabalhar no País. O contrato com a World Compliance começou há menos de duas semanas, mas Gouveia - que agora trabalha em home office - já se vê correndo atrás do plano de negócios que traçou. "Estou fazendo várias reuniões para apresentar o projeto ao mercado. Vou para Miami na semana que vem fazer um treinamento."

Para as consultorias, a melhor forma de atender à demanda do mercado é manter um banco de entrevistados. A prática é especialmente importante para os cargos mais disputados, como diretor financeiro, diretor de marketing, gerente de vendas, engenheiros civis e técnicos para o setor de óleo e gás. "Somos proativos nas entrevistas. É a única forma de termos candidatos em número suficiente para apresentar quando as vagas surgem", explica Paulo Pontes, diretor geral da Michael Page no Brasil. O consultor Marcelo Santos, da Doers, diz que essa ação preventiva, comum entre head hunters, poderia se estender aos RHs corporativos. "A grande maioria das empresas só começa a procurar quando a demanda se apresenta. Não há acompanhamento de profissionais. Isso dificulta o recrutamento."

Motivação. O desafio de atrair executivos muda conforme o setor. Os engenheiros dá área de óleo e gás, por exemplo, são resistentes a mudanças. "Eles prezam a estabilidade. Para os profissionais que fizeram concurso e estão na Petrobrás, por exemplo, a gente nem olha", conta o diretor da Michael Page. Os diretores financeiros estão interessados em expandir seu leque de funções - quanto maiores as responsabilidades, mais atraente a oferta. Os executivos de marketing e vendas são seduzidos pelo produto. Nesse caso, uma marca conhecida terá mais chance de atrair um nome "top de linha".

Para facilitar a busca de talentos, a empresa da tecnologia Totvs deu status de vice-presidência à sua diretoria financeira. Em outubro, a Totvs trouxe Alexandre Dinkelmann para seu quadro. O executivo estava há um ano na incorporadora Brookfield quando foi sondado pela empresa. Ele conta que o acúmulo de responsabilidades foi fator decisivo para a segunda troca de emprego no curto prazo. "O cargo na Totvs se distancia da atribuição clássica do CFO. Tenho de entender sobre o negócio e o cliente. Sou responsável pelas áreas de fusões e aquisições, relações com investidores, expansão internacional e novos negócios", enumera Dinkelmann. "A área de finanças é o pilar da minha carreira, mas sempre me orientei pelo desafio de longo prazo representado por uma oferta de trabalho."

Uma mudança também pode abrir um novo caminho na carreira. Com passagens pela Avon e O Boticário, o diretor de marketing Fábio Gilioli Gomes tinha 18 anos de experiência restrita ao setor de cosméticos. Era uma vida estável. No ano passado, enquanto acabava de reformar o apartamento onde morava em Curitiba, recebeu um telefonema com uma proposta da Basf que mudou todos os seus planos. Resultado: mudou-se com a família para São Paulo e assumiu o marketing da Suvinil, marca de tintas decorativas do grupo alemão no Brasil. "A oportunidade alavancou minha carreira, ganhei uma chance de conhecer um novo setor."

A chance de trabalhar para uma marca popular pesou na troca de emprego feita pelo executivo Marcus Duarte, que assumiu em agosto de 2011 a diretoria de marketing do Flamengo. Ele construiu a carreira no ramo esportivo - passou pelo marketing do Comitê Paraolímpico Brasileiro e por clubes como o Vitória, da Bahia, e Vasco da Gama. Chegou a deixar o setor, trabalhando por um período na Geo Eventos, joint venture entre a Rede Globo e o grupo de comunicação gaúcho RBS. Diante da chance de comandar as estratégias do Flamengo, cuja marca é avaliada em R$ 568 milhões, o profissional trilhou o caminho de volta.

O escopo do desafio ficou claro para o diretor de marketing na semana passada, quando ele se viu envolvido em duas crises que ganharam a mídia: o rompimento do contrato do Flamengo com a empresa de marketing esportivo Traffic e a dificuldade do time de fechar sua cota master de patrocínio, no valor de R$ 20 milhões. A gestão da imagem do Flamengo contempla ainda a negociação de direitos de transmissão de partidas, licenciamentos de produtos, permutas e a expansão das lojas de produtos do clube, administradas em sistema de franquia.

Salto. Empreender uma mudança de carreira, mesmo em um mercado aquecido, pode exigir que o profissional dê um passo para trás para andar dois à frente. Paulo Pontes, da Michael Page, explica que um dos setores mais agressivos atualmente, o de óleo e gás, está em busca de profissionais já formados, justamente o que está em falta no mercado. No entanto, quem busca mudar para esse segmento sem experiência vai precisar de uma dose de humildade. "No início, pode ser que a pessoa tenha de aceitar ganhar menos", explica. "Mas as perspectivas profissionais se expandem."

Fora de setores de perfil técnico, como óleo e gás e tecnologia da informação, o profissional generalista começa a ganhar espaço. "Embora a prática ainda seja impensável em companhias japonesas, é algo comum nas empresas americanas", explica Marcelo Santos, da Doers. Aos poucos, o consultor diz que as características de liderança começam a ficar mais importantes do que a formação técnica também no Brasil. Para Pontes, da Michael Page, isso ocorre porque um cargo executivo exige bom senso, conhecimento de processos e capacidade de tomar decisões - habilidades que não se aprendem nos bancos da escola.Por FERNANDO SCHELLER
Fonte:OEstadodeSP13/02/2012

13 fevereiro 2012



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