02 abril 2013

Falta ousadia no mercado de aquisições

A batalha pela aquisição da Dell Inc. DELL tem de tudo: uma marca muito conhecida, chefiada por um famoso diretor-presidente e fundador; uma disputa entre duas firmas de investimento agressivas e uma audaciosa oferta do investidor Carl Icahn.

 A única coisa que falta é alguém que realmente queira comprar a companhia.

 Não me interpretem mal: os três candidatos — o grupo da Silver Lake Partners e Michael Dell, a Blackstone Group LP BX e Icahn — parecem estar falando sério sobre suas ofertas de mais de US$ 20 bilhões. Mas os termos financeiros oferecidos e a linguagem corporal dos candidatos indicam mais preocupações do que entusiasmo com o futuro da empresa.

 As perspectivas sombrias para o setor de computadores pessoais tem muito a ver com isso. Mas a briga pouco acirrada também reflete um dilema maior no mercado de fusões e aquisições: o dinheiro está barato nos Estados Unidos, as ações atingiram valores recorde, muitos investidores desejam consolidações. Mas fusões e aquisições continuam surpreendentemente escassas.

 As razões para essa situação intrigante podem ser encontradas nos gabinetes dos diretores e nas salas de reuniões, mas falaremos mais sobre isso adiante.

 Em um nível superficial, os três primeiros meses do ano não foram tão ruins. Foram anunciadas aquisições de firmas americanas num total superior a US$ 268 bilhões, segundo a Dealogic. É uma quantia menor que no último trimestre de 2012, mas, com exceção desse período, teríamos que voltar a meados de 2008 para encontrar um trimestre tão forte como o que terminou na semana passada.

 Um olhar mais atento, porém, revela um mercado fraco. Três negócios — as propostas para a Dell, os planos de venda da H.J. Heinz Co. HNZ  para um grupo que inclui Warren Buffett, e a compra, pela Comcast Corp., CMCSA  da participação da General Electric Co. GE  na NBC Universal — representam mais de 40% do total.

 As aquisições de menos de US$ 1 bilhão constituem só um terço do total, a pior porcentagem em pelo menos cinco anos. Aqueles, inclusive eu, que saudaram a volta da época dos grandes negócios não estavam errados. São os pequenos e médios negócios que estão em dificuldades.

 O fluxo das fusões e aquisições é sabidamente imprevisível, mas banqueiros e advogados estão preocupados: a multidão de consultores empresariais não pode sobreviver de verdade com alguns poucos meganegócios.

 "Não me lembro de nenhuma outra época da minha carreira em que o mercado estava em alta e as fusões e aquisições estavam em baixa", diz Robert Kindler, diretor global de fusões e aquisições do banco Morgan Stanley MS . "Num ambiente de baixo crescimento, a expectativa era que as fusões e aquisições subiriam acentuadamente. Mas isso não aconteceu até agora." Ele preferiu não comentar o caso da Dell porque o Morgan Stanley está assessorando a Blackstone.

 Evidências empíricas e acadêmicas sugerem que, em épocas normais, ações em alta e baixo crescimento geram mais aquisições. A forte cotação das ações incentiva a venda das empresas e a economia lenta estimula compradores a tomar medidas para aumentar os lucros. Mas desta vez falta um ingrediente chave: a confiança (exagerada) dos diretores-presidentes. Em qualquer transação, é preciso haver dois para dançar o tango e os diretores-presidentes e conselheiros não vêm mostrando disposição para entrar na pista de dança.

 A culpa é do tumulto dos últimos anos. A lembrança da crise financeira, a confusão causada pela dívida soberana europeia e as conflagrações no Oriente Médio, sem falar do papel exagerado dos bancos centrais na economia mundial, estão mantendo os executivos e os conselhos longe das aquisições. Um regime regulatório mais apertado também contribui.

 Frank Aquila, codiretor para empresas globais do escritório de advocacia Sullivan & Cromwell LLP, descreve o cenário à maneira de Charles Dickens. "Estamos vendo o melhor dos tempos e o pior dos tempos", disse. "Estamos vendo um renovado apetite pelo risco, mas também conselhos e diretorias muito cautelosos."

 Investidores e banqueiros podem até pressionar a favor das aquisições, mas, neste cenário frágil, o risco de errar é alto demais. Além disso, o ambiente de dinheiro tem dois lados: um comprador pode tomar empréstimo barato, mas as empresas também, o que alivia a pressão sobre elas para vender ativos.

 Trata-se, realmente, de dois mercados. Os investidores com fome de riscos estão em busca de bons rendimentos (e de dinheiro), enquanto as empresas, avessas ao risco, almejam segurança. "Há uma diferença entre o sentimento do investidor e o sentimento dos gestores", diz Jim Woolery, vice-presidente do escritório de advocacia Cadwalader, Wickersham & Taft LLP.

 Os investidores que esperam a chegada de uma grande onda de aquisições ainda não devem vestir o calção de banho. Por FRANCESCO GUERRERA
Fonte: WST 02/04/2013

02 abril 2013



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