Temos recebido inúmeras perguntas relativas ao impacto da crise do coronavírus no dia a dia da Astella. Nas últimas semanas, dada a intensidade da crise, temos divido nosso tempo entre
(i) criação de valor — ajudando as empresas do portfólio a tomar as decisões mais racionais possíveis e preservar caixa, conforme esse Playbook que publicamos na semana passada e (ii) avaliação de oportunidades de investimento tanto em scale ups novas quanto em follow-ons.
E sobre esse cenário que vamos falar hoje. Quero expor o que sabemos sobre impacto das crises passadas nas atividades de investimento e fundraising e colocar alguns de nossos posicionamentos e questionamentos até esse momento.
Impacto das crises passadas
De acordo com Pitchbook, a crise de 2007–2009 reduziu total de funding para venture capital em 28% nos Estados Unidos. A média de tamanho dos deals também diminuiu, mas não o volume de deals. Ao contrário, o número de rodadas feitas durante a crise aumentou em 2008 e apresentou pequena redução de 5% em 2009, mostrando que os gestores permaneceram ativos, apesar de optarem por rodadas menores.
Se pensarmos nos diferentes estágios, o valuation dos deals de pre-seed e seed permaneceram praticamente constantes, mas caíram para deals a partir da Série A. Alguns fatores nos vem em mente para justificar esse movimento:
- (i) a partir da crise os fundos puderam concentrar seus investimentos novos em modelos de negócios que pudessem se beneficiar de um novo cenário pós crise;
- (ii) a aversão a risco aumenta e portanto, empresas com alto burn rate ficam menos atrativas e se não tiverem um posicionamento claramente defensivo, o crescimento esperado pode estar mais longe de ser alcançado e
- (iii) com a queda no mercado de ações (público) os valuations das rodadas mais maduras tendem a seguir os novos múltiplos negociados.
A mediana das rodadas imediatamente após a crise mostram uma valorização de 1,35x em relação à rodada anterior, o que infere que muitas empresas tiveram que enfrentar down rounds e diluições desproporcionais em função das cláusulas de liquidation preference. Se antes da crise as empresas levavam em média 1,7 anos para levantar uma outra rodada, depois da crise esse período médio entre rodadas ficou em 2,1 anos explicado pela maior cautela dos fundos, negociações mais conflituosas e crescimento mais baixo.
Diante de uma crise da magnitude desta provocada pelo coronavírus, duas reflexões importantes pairam sobre os gestores:
- (i) devemos considerar uma correção nos níveis de valuation e
- (ii) o que muda na tese e desafio de cada gestora.
Valuation de Startups
Sempre que gestores de Venture Capital se deparam com uma correção nos preços das ações dos mercados públicos tentamos entender “se” e “em que momento” o valor das transações e rodadas de Venture Capital sofrerão impacto, e qual a magnitude do ajuste. Dado que em algum momento IPOs podem ser a saída para os VCs, é relativamente fácil de entender que, depois de uma queda como a que vimos, os valuations de empresas em rodadas anteriores devem ser ajustados para que os retornos médios entre as rodadas sejam preservados. Para entrar nos detalhes desse dilema é importante entender a dinâmica de precificação de Venture Capital.
Normalmente, empresas maduras são valoradas de acordo com a sua capacidade estimada de gerar caixa e risco atribuído a execução disso. Ocorre que em Venture Capital não se espera que a empresa vá ter fluxo de caixa positivo tão cedo e as estimativas de longo prazo estão sujeitas a premissas extremamente voláteis e incertas. Daí a maxima que VC precifica deals por que é muito difícil acessar o potencial de criação de valor de uma empresa nos estágios iniciais.
Hoje, depois de inúmeros anos e ciclos vivenciados pela indústria de VC no mundo, conseguimos entender o comportamento das empresas bem sucedidas ao longo do tempo — taxa de crescimento, margem bruta, unit economics, foco e riscos — ou seja, já podemos contar um arquétipo de crescimento que nos indica quanto de recursos e tempo foram necessários para que as empresas fossem de um ponto ao outro da jornada e quanto de diluição para os founders e para os acionistas anteriores esses recursos acarretaram. Com isso temos indicação de tamanho médio de rodadas e valuation. Nos últimos anos, percebemos um descolamento expressivo do valor das rodadas das medianas históricas. Esperamos que toda a cadeia de VC ajuste os preços próximos à mediana histórica.
Os números médios da indústria e os casos de sucesso de cada setor/segmento nos dão uma indicação do que é possível fazer e com que montante de recursos. Os fundos se diferem estrategicamente em relação às teses e formas de atuação: alguns acreditam que no início o importante é empreender crescimento elevado a qualquer custo, que após a conquista de uma fatia relevante de mercado ou escala, os unit economics se tornam saudáveis e outros, como nós na Astella, acreditamos que dá para ser eficiente mesmo crescendo rápido e que é fundamental avaliar a eficiência das empresas através dos unit economics adequados para cada fase da jornada.
A visão da Astella para Unit Economics e como ponderamos níveis históricos de valuation
Nosso ponto de partida para precificar uma oportunidade é a mediana histórica de valuation de empresas semelhantes no mesmo estágio e o montante de recursos que foi necessário para empreender um crescimento médio esperado até a próxima rodada.
Depois, quando partimos para o deep dive (entendimento profundo dos números e processos de cada empresa) avaliamos vários fatores quantitativos e qualitativos e ponderamos o crescimento esperado pelos founders com medidas de eficiência (unit economics) e com a maturidade dos processos. Com isso, conseguimos ter uma matriz de risco ou probabilidade do crescimento esperando realmente se concretizar ao longo do tempo.
Para nós, as métricas mais importantes para avaliarmos uma oportunidade são as projeções de
- (i) margem bruta,
- (ii) eficiência ou custo de crescimento (CAC e LTV) e
- (iii) eficiência de capital (ARR/Burn rate).
Com essas três variáveis conseguimos avaliar o quanto de recursos o time vai precisar para chegar na tração que possibilita a empresa aa levantar uma próxima rodada com tranquilidade e o quanto de valor essa rodada será capaz de criar.
Para chegar no valuation de cada oportunidade, nós ajustamos o valor da mediana histórica com as métricas de cada empresa e com nossa percepção de risco, dada a maturidade dos processos constatada versus a esperada (máquinas). Assim, chegamos no quanto de equity devemos comprar de cada empresa e que tipo de colchão de risco estamos criando.
No entanto, um ponto muito importante a se considerar ao avaliarmos as novas oportunidades e as empresas do nosso portfólio, nesse momento, é que a crise não impacta as empresas de forma equânime. Muito pelo contrário. Ela catalisa mudanças estruturais e de comportamento na sociedade, o que envolve mais riscos para alguns players e uma gama de novas oportunidades para outros...... Por Laura Constantini - Co-Founder @ AstellaInvestimentos. Venture Capital. Investor. Entrepreneur. Impact Seeker. We help entrepreneurs master all stages of business Leia mais em /medium.com/astella-investimentos 13/04/2020
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