20 dezembro 2016

A única saída para a crise econômica

O governo federal percebeu a dimensão do bloqueio à retomada do crescimento. Sob intensa pressão política e empresarial a equipe econômica mudou de atitude e agora procura saídas. É preciso entender que a situação é especialmente difícil e que a restauração da confiança quanto à sustentabilidade fiscal e previdenciária em longo prazo, não será suficiente para recuperar a economia. Tampouco reformas microeconômicas, embora necessárias e úteis poderão, per se, ressuscitar o crescimento.

Diferentemente de outras retomadas do crescimento ocorridas em 1983-84, 1994-95, 2003-04 hoje não existem motores externos e internos capazes de quebrar o círculo vicioso da recessão. Na verdade os motores estão engripados, quando não em marcha à ré. Por exemplo, o consumo das famílias, principal componente do PIB (60%), caiu significativamente em 2015 (- 4%) e persistiu caindo mais em 2016 (-5%) sem expectativa de reversão já que o desemprego continua subindo (1,5 milhão de vagas fechadas em 12 meses até outubro passado).

Desemprego em alta eleva a inadimplência, formando-se um círculo vicioso de cautela entre consumidores e bancos. As famílias, que acumularam dívidas desde 2004, pisaram no freio dos gastos e vem buscando reduzir-las. Por isso não é realista esperar uma recuperação firme do consumo enquanto o emprego não voltar a crescer, ainda que a taxa de juros seja significativamente reduzida nos próximos meses.

Do lado dos gastos públicos a margem de expansão é nula diante da retração da arrecadação tributária da União e dos Estados, tendo em conta que o governo federal fixou metas difíceis para o superávit primário de 2016 e 2017. No caso dos Estados a situação é periclitante, obrigando forte contração dos gastos.

Não é realista também esperar retomada do investimento privado. Ao contrário, com demanda anêmica, elevada ociosidade industrial, endividamento sufocante e crédito escasso e oneroso, o setor privado tão cedo não voltará a investir. A formação de capital fixo e a construção civil caem sem parar desde 2015.

A pauta atual é de desalavancagem, venda de ativos, ajuste de custos. Uma queda significativa dos juros, junto com medidas de reescalonamento de dívidas a custos mais baixos, encurtará o calvário, mas a recuperação do investimento empresarial ainda vai demorar.

Finalmente, não é plausível esperar que as exportações líquidas possam redinamizar a economia como fizeram no passado. Apesar do aumento físico das exportações em 2015-16, e de modesta melhora recente dos preços dos produtos exportados, a remuneração continua baixa. A realidade é que o comércio mundial encolheu, o viés protecionista aumentou e a concorrência está acirrada. Dois fatores poderiam melhorar seu desempenho: 1- a valorização do dólar-Trump e a redução da taxa Selic induzem o real mais depreciado; 2- o governo deveria reforçar o comércio exterior, acordando estratégias exportadoras com o setor privado interessado em ocupar sua alta ociosidade. Resumindo, embora tenha impacto limitado uma política pró-exportação pode, sim, auxiliar a recuperação.

Mas, para sair da crise será imprescindível induzir - em grande escala - um ciclo de investimentos em infraestruturas e energia, puxados pelo setor privado. É a única saída. São necessários investimentos novos, efetivos, crescentes, começando com pelo menos R$ 65 bilhões no ano que vem. Desafio de grande complexidade, requer dedicação intensiva da cúpula do governo e da equipe econômica. É necessário combinar medidas de curto prazo com iniciativas estruturantes. De saída, o desafio de recompor um estoque de projetos de boa qualidade.

A preparação de projetos e a adequação das infraestruturas (especialmente de logística) às grandes transformações tecnológicas em curso exigem planejamento de longo alcance e novas modelagens. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) precisa ser urgentemente reforçada com quadros técnicos qualificados. No curto prazo, contratos aditivos poderiam viabilizar investimentos imediatos em concessões existentes, de ferrovias e rodovias, desde que se apresentem projetos executivos consistentes. A MP 752, recentemente editada, visa esse objetivo ao normatizar prorrogações e relicitações de contratos de concessão mas demanda aperfeiçoamento para ganhar eficácia.

Além disso, apesar da folga conjuntural de oferta, resultante do regime hídrico favorável neste ano e da desaceleração da demanda, os investimentos em energia precisam ser retomados com visão de longo prazo. A atualização do marco regulatório das telecomunicações, embora tardia, também abre caminho para mais inversões em redes de banda-larga.

Outra iniciativa relevante pode vir da oferta de seguros e garantias aos projetos de longo prazo para viabilizar financiamentos através de project finance. E, enfim, concluída a colaboração com a justiça e fechados acordos bilionários de ressarcimento, é urgente resolver com segurança jurídica os processos de leniência, para permitir a sobrevivência das empresas de construção. Tais tarefas são difíceis e complexas, mas a indução firme e persistente de investimentos em infraestruturas é a única alavanca disponível para o país voltar a crescer. Além de necessária, é a oportunidade para tornar a economia brasileira mais sustentável e competitiva. Voltaremos ao tema em próximos artigos. Por Luciano Coutinho, - economista, foi presidente do BNDES e escreve mensalmente neste espaço. Valor econômico Leia mais em portal.newsnte 20/12/2016

20 dezembro 2016



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