16 agosto 2017

Como a Estre, gigante do lixo, foi parar na Nasdaq

A Estre Ambiental, a maior empresa de serviços ambientais do País, está sendo capitalizada em US$ 370 milhões, numa operação que reduz dramaticamente sua dívida e lista a companhia numa Bolsa americana, a Nasdaq.

O capital para a Estre está vindo do Boulevard Acquisition Corp II, um veículo de aquisição de propósito específico — ou SPAC, na terminologia em inglês — listado na Nasdaq e cujo chairman é Marc Lasry, o fundador e CEO da Avenue Capital Group, uma firma de investimentos que administra cerca de US$ 10 bilhões em Nova York. Lasry e sua sócia, Sonia Gardner, fizeram seu nome e fortuna investindo em empresas altamente endividadas.

A Avenue Capital captou os recursos do Boulevard há dois anos, vendendo 37 milhões de units a US$ 10 cada. A transação anunciada hoje faz a fusão da Estre com o Boulevard, listando a companhia brasileira na Bolsa americana quando a operação for concluída, o que deve acontecer no quarto trimestre.

Como parte da transação, todos os atuais acionistas da Estre serão diluídos mas continuarão sócios da empresa. O fundador e chairman da Estre, o empresário Wilson Quintella Filho, ficará com uma participação minoritária e será um consultor estratégico da companhia. (Outros acionistas da Estre incluem o BTG Pactual, um fundo administrado pela Angra Partners, e os empresários Gisele de Moraes e Wilson de Lara.)

Comuns nos EUA e inexistentes no Brasil, os SPACs são o equivalente ao IPO de um cheque em branco. Os criadores do SPAC levantam recursos junto a investidores com a promessa de encontrar um ativo rentável. Por exemplo, em 2012, um SPAC chamado Justice Holdings — levantado pelo gestor Bill Ackman, da Pershing Square — fundiu-se com o Burger King, trazendo a rede de hambúrgueres de volta para a Bolsa.

O Boulevard precisava de um bom ativo, e a Estre precisava de dinheiro. No final de 2016, a Estre tinha uma dívida líquida de R$ 1,5 bilhão — a maior parte rodando a CDI — e uma geração de caixa de R$ 400 milhões naquele ano. A empresa tem crescido seu faturamento a 7% nos últimos 4 anos, um período no qual não fez aquisições.

A transação dá à Estre um valor de mercado inicial de US$ 816 milhões e um valor da firma (o que inclui a dívida) de US$ 1,1 bilhão, o que dá um múltiplo de 7,7 vezes sua geração de caixa estimada para 2018. Do capital que entra, US$ 200 milhões serão usados para reduzir a dívida líquida, que cairá de 5,2 para 2,2 vezes a geração de caixa anual. Com o saldo, a Estre deve retomar aquisições.

Fundada por Quintella e sua sócia Gisele de Moraes em 1999, a Estre é dona de 13 aterros sanitários, tem outros cinco em desenvolvimento, e faz a coleta de lixo em 15 cidades brasileiras.

A transação de hoje abre um novo capítulo numa trajetória empresarial ambiciosa que foi atropelada pela inadimplência do setor público, o alto endividamento da companhia e o fechamento do mercado de capitais na crise do impeachment, num momento em que a taxa de juros disparou.


Com o sonho de criar uma ‘Ambev do lixo’, entre 2008 e 2013 Quintella comprou sete empresas, começando pela operação de lixo perigoso da multinacional Veolia, que estava saindo deste business do Brasil.

Sua primeira grande aquisição veio em 2010, quando a Estre comprou a Cavo Ambiental da Camargo Correa por R$ 610 milhões. O BTG Pactual financiou 100% da compra com um empréstimo, e mais tarde injetou capital na empresa, gradualmente chegando a uma participação de 35%, que agora será diluída.

Em seguida, a Estre comprou duas operações de aterro e coleta de lixo: a Leão Leão, de Ribeirão Preto, e a Viva, que opera em Salvador, Feira de Santana, Maceió e Taboão da Serra.

Em maio de 2015, o BTG e Quintella instalaram Sergio Pedreiro como CEO da Estre, e Quintella assumiu a presidência do conselho. Pedreiro — um executivo experiente que passou pela GP Investimentos, foi CFO da ALL e, mais tarde, da empresa global de cosméticos Coty — já era conselheiro da Estre desde 2011. O novo CEO começou a profissionalizar a empresa, cortou custos e introduziu critérios de meritocracia na remuneração dos executivos.

No início de 2016, com a água pelo nariz, a Estre sentou-se com os três bancos que mais lhe davam crédito: o BTG, Itaú e Santander. O primeiro tinha R$ 900 milhões de exposição ao crédito da Estre; os dois últimos, cerca de R$ 250 milhões cada. Os bancos concordaram em restruturar a dívida: alongaram o perfil e pediram a venda de ativos ou uma injeção de ‘equity’. A Estre optou pela segunda alternativa.

O negócio do lixo ainda tem um vasto potencial de crescimento no Brasil, onde grande parte da população ainda não é atendida por serviços de coleta e quase metade dos resíduos vão para ‘lixões’ em vez de aterros sanitários. Há ainda muito que as empresas podem fazer no que o setor chama de 'valorização do lixo' (a reciclagem) e na geração de energia a partir do lixo. O volume de resíduos sólidos tem crescido 4% ao ano.

As possibilidades de consolidação são gigantescas. Nos EUA, as duas maiores empresas do ramo, a Republic Services e a Waste Management, recebem 50% de todo o lixo final. No Brasil, a Estre, a maior de todas, recebe 8%. (Republic e Waste Management negociam a 10x EV/EBITDA de 2018, e entre 21 e 24 vezes o lucro do ano seguinte.) Na França, as duas maiores — a Suez e a Veolia — têm 80% do mercado, e são ambas listadas. Geraldo Samor  Leia mais em braziljournal 16/08/2017
(Balanços patrimoniais)

16 agosto 2017



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