08 janeiro 2014

O efeito da venda de ativos na dívida e no múltiplo FV/Ebitda

Embora muito criticado, o múltiplo FV/Ebitda ganhou popularidade nos últimos anos. Algumas empresas brasileiras como Vale (VALE5), a de telecomunicações Oi (OIBR4), Fibria (FIBR3), Marfrig (MRFG3) e Suzano (SUZB5) têm recorrido à venda de ativos não estratégicos para redução de suas dívidas o que produz impacto sobre o múltiplo. Com base na estratégia de desalavancagem da companhia e na análise do múltiplo FV/Ebitda, o blog O Estrategista já havia inclusive indicado a possibilidade de valorização das ações de Suzano em post do início de 2012. Entenda como a operação de venda de ativos afeta a análise por múltiplos.

 O firm value (“FV” ou valor da firma, em português) é calculado somando-se o valor de mercado da empresa (base acionária multiplicada pela cotação) com o endividamento oneroso líquido, ou seja, a dívida contabilizada no passivo menos o caixa alocado no ativo. O Ebitda (lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização) é considerado, grosso modo, a geração operacional de caixa da companhia, embora essa aproximação seja imperfeita. Embora a crítica seja pertinente, a utilização do múltiplo FV/Ebitda se disseminou, logo é necessário entender como os investidores o utilizam. 

Considere ume empresa que gere um Ebitda de R$ 100 milhões anuais e tenha um valor de mercado de R$ 200 milhões e uma dívida líquida de R$ 400 milhões, logo um valor da firma de R$ 600 milhões. Dessa forma, a empresa estaria negociando a um múltiplo FV/Ebitda de 6 vezes. Imagine que a empresa tenha ativos não estratégicos avaliados a R$ 100 milhões e que esses não produzam resultado, nem negativo nem positivo. Com a venda desses ativos, a companhia pode reduzir sua dívida em R$ 100 milhões. Com isso, o valor da firma cairia para R$ 500 milhões e o múltiplo para 5 vezes. Qual seria a provável reação do mercado com a atitude tomada pela administração? Fazer com que o múltiplo voltasse a negociar a 6 vezes. Dessa forma, o valor de mercado se elevaria para R$ 300 milhões, 50% superior à situação inicial. Em outras palavras, o preço da ação aumentaria nessa proporção.

 Com as economias brasileira e mundial cambaleantes nos últimos anos o que restringe o crescimento das vendas, a estratégia de vender ativos não estratégicos tem sido bastante utilizada.

 A mineradora Vale vendeu US$ 6 bilhões em ativos ao longo de 2012, conforme noticiado pelo Valor Econômico em 27 de dezembro último. No final de dezembro, a empresa vendeu sua participação na companhia de logística Log In em leilão na bolsa de valores por R$ 234,8 milhões. Em setembro, a empresa alienou 62,4% da Valor da Logística Integrada (VLI), focada no transporte de cargas, por R$ 4,7 bilhões (US$ 1,990 bilhão).

 “A companhia também vendeu a fatia que detinha na fabricante norueguesa de alumínio Norsk Hydro, por US$ 1,82 bilhão, considerado o exercício de opções. Além disso, acertou a venda da produção de ouro em Salobo, no Pará, e de níquel em Sudbury, no Canadá, por US$ 1,9 bilhão.

 Em dezembro, a Vale concluiu a venda de quase metade de sua participação de 9% na Norte Energia, empresa responsável pela construção, operação e exploração da usina hidrelétrica de Belo Monte (PA), para a Cemig, por US$ 90 milhões.

 A empresa também se desfez da produtora de cobre Minera Tres Valles, por US$ 25 milhões, para a Inversiones Porto San Giorgio (ISG) – empresa controlada pelo grupo chileno Vecchiola. Em linha com a estratégia de levantar recursos para os projetos de minério de ferro, a Vale alienou ainda uma fatia de 44% na Fosbrasil para a Israel Chemicals, por US$ 52 milhões.”

 E essa estratégia deve continuar ao longo de 2014, segundo o jornal: “entre os itens disponíveis para venda estão a fatia de 40% que tem na Mineração Rio do Norte (MRN) e ativos de óleo e gás, geração de energia e parte da frota de navios. A companhia disse que pretende reduzir a participação de 70% no corredor logístico de Nacala, em Moçambique, à metade.”

 A telefônica Oi também tem se valido desse expediente para reduzir o endividamento. Em 2013, a companhia arrecadou R$ 4,167 bilhões com a venda de torres (R$ 2,211 bilhões), da Globenet, de cabos submarinos (R$ 1,750 bilhão) e com imóveis (R$ 210 milhões). Após o anuncio da venda de 2.007 torres à SBA Torres Brasil no início de dezembro, as ações preferenciais (OIBR4) e ordinárias (OIBR3) tiveram alta de 13,06% e de 11,58% em apenas um pregão.

 A fabricante de celulose Fibria (FIBR3) pretende levantar R$ 1 bilhão com a venda de florestas plantadas de eucalipto localizadas em diversos Estados brasileiros. Segundo apurou o Valor Econômico em reportagem de novembro : “a direção da Fibria vem reiterando há meses a intenção de vender ativos que não são considerados estratégicos, com vistas à redução do endividamento e reconquista da nota grau de investimento junto às agências de classificação de risco de crédito”.

 A empresa de proteína animal Marfrig (MRFG3) também adotou essa tática ao repassar a Seara Brasil e a Zenda para a concorrente JBS em junho deste ano por R$ 5,85 bilhões, numa operação envolvendo assunção de dívidas pela JBS.

 Por fim, a empresa de papel e celulose Suzano (SUZB5) efetuou algumas vendas para reduzir seu passivo. Como consequência, o preço de suas ações apresentaram forte valorização de 40,5% desde dezembro de 2011. O blog havia comentado sobre a possível apreciação dos papéis em post de 2 de janeiro de 2012: “A tese de investimento de Suzano possui riscos, mas pode trazer excelente retorno aos acionistas se a administração for bem sucedida na sua estratégia de desalavancagem. Mesmo com o múltiplo permanecendo constante, a ação tem espaço para valorização. Quem sabe 2012 não será melhor para as ações preferenciais (SUZB5), após a queda de 52,6% em 2011?”

 Contudo, apenas a decisão de vender ativos não significa a redenção da companhia. É necessário que após a operação, a companhia esteja bem posicionada em seu segmento de atuação e gere caixa operacional consistente. Só assim, as ações tendem a se apreciar. Do contrário, as operações de venda apenas postergarão o problema. Nos casos analisados acima, Marfrig e Oi, mesmo com essas vendas, podem não conseguir superar seus importantes problemas estruturais. Por Estrategista Andre Rocha
Fonte: estrategista 08/01/2014


08 janeiro 2014



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