13 junho 2016

Venda de ativos pode ajudar no curto prazo, mas momento dificulta iniciativa

Diante de um governo que prometeu um forte ajuste fiscal mas que, desde que tomou posse, não conseguiu emplacar nenhum corte significativo de gastos, a venda de ativos pode ser a salvação de curto prazo, dizem especialistas. Num cenário complicado, receitas atípicas continuam a ter papel fundamental na recuperação das contas públicas. A questão, ponderam esses economistas, é que o momento atual pode azedar até mesmo esse tipo de iniciativa.

O volume a ser arrecadado com a fatia que o governo federal tem em grandes empresas e bancos não é animador, ainda que ele abrisse mão de praticamente tudo o que tem. Exercício feito pela GO Associados aponta que se a União se desfizesse integralmente de sua participação no capital social de empresas como Petrobras, Caixa, Banco do Brasil, Correios, Infraero, IRB e Eletrobrás, o potencial de recursos que poderiam ser obtidos seria de pouco mais de R$ 127 bilhões. Somada à carteira do BNDES, de R$ 47,2 bilhões, segundo dados do primeiro trimestre, o governo conseguiria arrecadar R$ 174,2 bilhões, ou algo próximo a 3% do Produto Interno Bruto (PIB).

Além de tema altamente sensível, as privatizações resultariam em algo bem próximo ao rombo estimado para as contas públicas neste ano e representariam apenas uma fração da dívida pública do setor público, que é de cerca de R$ 4 trilhões (67,3% do PIB). Para as empresas com capital aberto, a GO usou o valor de mercado da empresa, de acordo com a cotação da ação em 12 de maio. Para as demais empresas, usou o patrimônio líquido, de acordo com o dado divulgado em balanço.

Embora ninguém considere a venda integral dos ativos, as opiniões se dividem sobre a oportunidade ou não do negócio. Luiz Castelli, economista da GO Associados, adverte que, além de todos os entraves políticos que a venda integral das participações enfrentaria, este talvez não seja o melhor momento para a venda de ativos, que tiveram seus preços bastante deprimidos nos últimos anos. Como reflexo desse "mau momento", Castelli diz que as oito empresas consideradas no levantamento perderam 31% do valor total de mercado nos últimos 48 meses, de R$ 391 bilhões (considerando não só a participação do governo) para R$ 269,4 bilhões. Nos últimos 24 meses, a perda foi de 21,5%.

Castelli estima, no entanto, que se o governo se propuser a vender R$ 40 bilhões em ativos e usar esses recursos para abater sua dívida, conseguiria economizar cerca de R$ 5,7 bilhões (ou 0,1% do PIB) com pagamento de juros em um ano, o que considera positivo. "Talvez o melhor seria vender apenas uma parte e aos poucos. Do contrário, seria vender no pior momento possível", diz Castelli. Ele ressalta que a Infraero, por exemplo, está com um patrimônio líquido praticamente zerado e deve precisar de aporte do Tesouro. "A empresa está totalmente endividada e fica difícil avaliar um caso desses. Provavelmente ela vale mais".

A despesa primária do governo ainda deve crescer em 2017, diz o economista-chefe da Icatu Vanguarda, Rodrigo Melo. Logo, a solução para melhorar o endividamento poderia vir do lado das receitas, por meio de uma combinação de alta de impostos e venda de ativos. A venda de ativos, diz o economista, poderia ajudar a reduzir um pouco o tamanho da dívida pública, de modo que o governo prescindisse de um primário entre 2% e 2,5% do PIB para estabilizar a dívida.

"Assim se conseguiria reduzir o prêmio de risco, reduzindo também a taxa de juros sobre a dívida. Consequentemente, o superávit necessário para estabilizá-la também pode ser menor", diz Melo, para quem tudo depende de uma série de variáveis, inclusive do mercado comprar esse cenário mais positivo.

Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores, lembra que a estratégia de consolidação fiscal do fim da década de 1990 em diante, combinou, em um primeiro momento, aumento carga tributária - com CPMF e Cide, por exemplo - e receitas não recorrentes de privatização. "Como a economia crescia pouco, o peso da venda de ativos foi crucial no primeiro momento de ajuste fiscal para depois passar a depender menos dessas receitas atípicas", afirma o economista.

Borges diz que, mesmo que a economia dê sinais de estabilização e trabalhe com nível de ociosidade ainda muito elevada, a arrecadação recorrente vai demorar a voltar. E, como não existe espaço para grandes aumentos de carga, a venda de ativos pode fechar o buraco no curto prazo, assim como qualquer outro tipo de modalidade de receita atípica expressiva, como repatriação de recursos ou securitização da dívida ativa da União.

Menos otimista, Pedro Jucá Maciel, assessor econômico do Senado, avalia que algo um pouco acima de R$ 100 bilhões com a venda de ativos seria "muito pouco", dado que o governo gastou com juros no ano passado cerca de R$ 500 bilhões. "Ajuda a reduzir a dívida, mas não vai resolver o problema. E aí, olhando a proposta com pragmatismo, imagina a confusão que vai ser privatizar os Correios. E quem vai ser o comprador? As empresas brasileiras estão muito endividadas. Não sou tão otimismo com a proposta", afirma ele.

Sem entrar no mérito da dificuldade em se desfazer do ativo, Borges vê como oportunidade a abertura de capital dos Correios, por exemplo, cujo serviço postal, o Sedex, é visto pelo economista como operação mais valiosa - assim como os aeroportos de Congonhas e Santos Dumont para a Infraero, que estão entre os mais rentáveis do mundo. Borges considera. ainda, que há ativos regionais que o governo poderia exigir que fossem privatizados como contrapartida à renegociação de dívida dos Estados. "Mais ou menos como ocorreu na década de 1990, quando o governo federalizou a dívida. A presença em saneamento e distribuição de gás dos governos regionais é forte", diz.

Para Jucá Maciel, propostas estruturais que olhem para o longo prazo seriam mais adequadas neste momento. "Vender ativo é positivo, mas confesso que é preciso ver o que á viável politicamente. Fora que não vai ser a salvação da pátria. E é preciso reduzir os juros de maneira sustentada, com uma política de confiança e credibilidade. Essa é a grande distorção da economia brasileira: a maior taxa de juro do mundo".  Valor Econômico - Leia mais em abinee 13/06/2016

13 junho 2016



0 comentários: