21 setembro 2015

‘Apostamos no Brasil no longo prazo’

Em um momento que o Brasil enfrenta uma da maiores crises de sua história, com um cenário político turbulento com reflexos sobre a economia, um dos maiores fundos de pensão canadense, o Canadian Pension Plan Investment Board (CPPIB), não descarta investir no País. Em entrevista ao Estado, o presidente da instituição, Mark D. Wiseman, disse que vê oportunidades em infraestrutura e até em varejo.

Com ativos líquidos globais da ordem de US$ 270 bilhões, o CPPIB planeja dobrar de 3% para 6% a fatia da América Latina nas alocações de recursos que faz ao redor do mundo. “Conseguimos nos afastar das preocupações de curto prazo. Quando se considera o cenário em 25 ou 30 anos, há um padrão de crescimento contínuo (no Brasil)”, afirmou.

Mesmo com a perda do grau de investimento do País pela Standard & Poor’s, Wiseman ainda mantém o discurso de que o País está entre as prioridades para investimentos. O valor já aplicado pela CPPIB no País é de quase US$ 4 bilhões, em empresas e por meio de parceiros como os fundos Tarpon e Pátria. A seguir, os principais trechos da entrevista.

O Brasil está vivendo uma situação difícil e a América Latina não vai muito melhor. Por que investir mais agora nesses mercados?
Investimos na região desde 2006, embora tenhamos aberto nosso escritório regional, em São Paulo, somente em abril de 2014. Concordo que o atual ambiente no Brasil e na América Latina é complicado. Mas nossa visão é de longo prazo. Em muitos casos, vemos oportunidades justamente quando os outros investidores estão deixando o mercado. Olhamos de forma muito cautelosa e diligente as apostas que podem dar resultado no longo prazo.

Qual é a filosofia de investimento no Brasil?
Não agimos como um fundo de pensão, mas como uma empresa de gestão de ativos que tem apenas um cliente: o fundo de reservas do plano nacional de pensões do Canadá. São 19 milhões de trabalhadores e aposentados beneficiários do plano. Nós nos parecemos muito com gestores como o Blackrock, Blackstone ou o BTG. A diferença é que as nossas obrigações têm prazo de 20, 30 ou até 50 anos.

Ou seja: vocês não se assustam tanto com a crise?
Sabemos que há altos e baixos, mas temos a vantagem de poder esperar o fim dos ciclos econômicos. E isso quer dizer que, em períodos como o atual, podemos comprar ativos. Podemos esperar o mercado virar. Não sabemos qual será o fundo do poço. Mas posso dizer que estamos mais perto do fundo do poço no Brasil do que estávamos há um ano.

Quais são os ativos interessantes para vocês no momento?
Queremos ativos estáveis e que fiquem no mercado por muito tempo. Eles podem ter baixas momentâneas, mas vão estar lá em 20, 30 anos. No setor imobiliário, estamos focados em imóveis para varejo, como shopping centers bem localizados. É por isso que compramos uma fatia da Alliansce. Também temos investimentos com a GLP e a Cyrela em propriedades industriais que são usadas por empresas importantes, como Unilever e P&G. Em ambos os casos, o mercado pode ter flutuações, mas as propriedades são bem geridas.

Considerando a taxa de juros do Brasil, não seria melhor investir em papéis atrelados à Selic do que em ativos reais?
Todos os dias fazemos escolhas para buscar o melhor retorno em relação ao risco. Temos de olhar para impostos, macroeconomia e não só as taxas de juros. No Brasil, a taxa de juros é alta, mas a inflação também é. E também o câmbio, porque, no fim das contas, precisamos que o rendimento seja vantajoso quando convertido para dólar canadense.

Por que planeja elevar a fatia da América Latina nos aportes de 2,9% para 6% neste cenário?
Quando a gente fala América Latina, falamos especificamente de Brasil, Chile, Colômbia, Peru e México. O Brasil é o mais importante. Acreditamos na economia brasileira no longo prazo. O crescimento dos cinco mercados que eu mencionei será maior, no longo prazo, do que o de países como Canadá, EUA, Japão e Europa em geral. Podemos, daqui a cinco ou sete anos, dobrar nosso porcentual de aportes na América Latina. E serão 6% de um total muito maior. Hoje, a região representa 3% de cerca de US$ 270 bilhões, mas pode virar 6% de um total de US$ 400 bilhões ou US$ 500 bilhões.

Como é o processo de seleção de parceiros locais?
Trabalhamos com parceiros locais de alta performance. Nós não sabemos construir estradas, mas sabemos fazer contas, prover capital e dar direcionamento estratégico.

Muitos aconselharam o CPPIB a sair do Brasil neste momento?
Sim. Quando abrimos o escritório, em abril de 2014, as coisas já começavam a ir mal. Muita gente nos aconselhou a sair. Mas estudamos o País. Os governos vão mudar, um pouco mais à direita ou à esquerda, mas essa direção geral de uma economia de livre mercado vai continuar.

Há negociações em curso no momento?
Sim. Mesmo que a situação ainda piore antes de melhorar, pode ser bom para a gente. Teremos oportunidades de comprar ativos que poderiam não ficar disponíveis se tudo estivesse bem. E nós aprendemos uma lição na crise global de 2009. Compramos muitos ativos na época, mas nosso erro foi não ter comprado mais.

O Brasil é atraente mesmo com a perda do grau de investimento da S&P? 
A perda do grau de investimento não afeta nossa decisão de investir no País, mas pode fazer com que haja uma exigência maior do ponto de vista de retorno para os projetos.

E em que setores vocês buscam oportunidades?
Olhamos imóveis, infraestrutura e private equity (compra de participações de empresas).

Em infraestrutura, analisam concessões do governo?
Queremos ativos de infraestrutura críticos para o País. Estamos em estradas no Chile, na Austrália, no Canadá e na Índia. Também estamos olhando o setor elétrico, portos e já fizemos ofertas por aeroportos. O Estado de S.Paulo - Leia mais em abinee 21/09/2015


21 setembro 2015



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