24 junho 2018

Financiamento a aquisições já passa de R$ 40 bilhões

Bancos brasileiros e estrangeiros fecharam grande volume de financiamentos a aquisições neste primeiro semestre. Transações como a compra da Fibria pela Suzano, na área de celulose, da Somos pela Kroton, em educação, e da Eletropaulo pela Enel, em energia, terão boa parte do pagamento financiada. Com investimentos em baixa e passivos renegociados, é essa modalidade que deve responder pela maior parte do crédito corporativo bancário este ano.

"O financiamento a aquisição voltou com força. Hoje há mais apetite dos bancos para empréstimos de prazos mais longos em que cabe uma operação dessas", diz Renato Ejnisman, diretor-executivo do Bradesco BBI. As transações anunciadas no ano até agora já representam mais de R$ 40 bilhões em financiamentos e, nos cálculos de profissionais da área, a cifra pode quase dobrar rapidamente.

Uma das razões é o ritmo acelerado de transações. No acumulado do ano, até 21 de junho, o aumento do volume total foi de 12% em dólares, conforme levantamento da consultoria Dealogic, somando US$ 25,43 bilhões. Em reais, a alta foi de 20%. "O volume de operações aumenta diretamente a necessidade de financiamento, especialmente em operações de grande porte", diz Hans Lin, diretor da área de banco de investimento do Bank of America Merrill Lynch no Brasil.

Para Ejnisman, do BBI, além da queda da taxa de juro no mercado local e da redução do prêmio de risco das companhias brasileiras na comparação com anos anteriores, também pesa a favor o fato de que as empresas-alvo estão menos alavancadas. "Como antes as empresas estavam mais endividadas, o financiamento vinha de brinde. E o cheque a ser pago pelas ações era menor", diz.

Além da demanda do lado das empresas, há um reforço considerável do lado da oferta. "O apetite de bancos estrangeiros e locais está muito grande, todos com liquidez e ávidos por transações com visibilidade. Juntou a fome com a vontade de comer", diz Ricardo Leoni, diretor-executivo do J.P. Morgan responsável pela área de renda fixa. Esse apetite das instituições também se justifica pelo arrefecimento de outras modalidade de crédito, com a economia patinando. "Então a demanda que restou foi de financiamento a aquisições. Não só os bancos têm participado mais como tem até uma certa briga para financiar algumas operações", diz Miguel Queen, co-responsável pelo Corporate Banking do Citi Brasil.

A venda da TAG, o gasoduto da Petrobras na região Nordeste, em andamento, deverá ser a principal responsável por encorpar o número de financiamento deste ano e é um dos alvos da cobiça de bancos. Estima-se que o cheque da compra seja da ordem de US$ 8 bilhões. Hoje, a francesa Engie negocia o ativo com exclusividade e já tem financiamento arranjado com Bradesco, Itaú e Banco do Brasil. Mas ainda não está totalmente fechado. O Citi, que foi assessor da Engie, também quer entrar na estruturação de financiamento.

A compra da Somos pela Kroton, anunciada em abril, deverá ser financiada por uma emissão de debêntures de R$ 5,5 bilhões. Os títulos irão a mercado, mas terão garantia firme de Itaú e Bradesco. As instituições não comentaram. Outra aquisição mereceu destaque no semestre, a compra da americana National Beef pelo frigorífico Marfrig. O pagamento de quase US$ 1 bilhão conta com crédito de Rabobank e Bradesco, que deve ser quitado quando a Marfrig vender a controlada Keystone Foods.

Uma das disputas mais agressivas ainda em curso é no financiamento da compra da Fibria. A Suzano acertou com um consórcio de bancos estrangeiros duas linhas. Um empréstimo-ponte de US$ 6,9 bilhões por três anos (mais longo que o habitual) e taxa de juro Libor mais 1,65% ao ano. E outros US$ 2,3 bilhões em pré-pagamento de exportações com prazo de seis anos e taxa Libor mais 1,16%. Mesmo com a operação acertada, o Valor apurou que o Bradesco ainda tenta ficar com parte do financiamento de longo prazo e teria oferecido uma linha em reais mais swap cambial a uma taxa competitiva à Suzano. O banco não confirma. A intenção declarada da Suzano era alongar esse empréstimo-ponte com uma emissão de US$ 5 bilhões em bônus no exterior.

Na agitada briga pela aquisição da Eletropaulo, bancos estavam tão ansiosos quanto as potenciais compradoras. O Santander já tinha assegurado o financiamento total para a Iberdrola e o Citi garantiu a proposta da Energisa. A vencedora, a italiana Enel, fechou um financiamento com três bancos. Somente o Credit Suisse deu uma linha de até R$ 5 bilhões para a Enel Américas. "A companhia não tem a pressão de rating Brasil, então viabiliza uma transação com taxa mais barata", diz Bruno Fontana, responsável pelo banco de investimento do Credit Suisse. Ele diz que o banco tem apetite por esse tipo de estrutura porque faz um pacote de garantias, que inclui o ativo adquirido, e avalia ainda a capacidade de geração de caixa com a sinergia da empresa resultante.

Alberto Fernandes, vice-presidente do Itaú BBA responsável pelas áreas de corporate e banco de investimento, acredita que o fenômeno desse tipo de crédito é pontual. "Não se trata de uma tendência. Isso se deu porque algumas transações grandes foram fechadas", diz.

Em sua avaliação, outras duas a quatro aquisições de porte podem ser financiadas até o fim de 2018, a depender do cenário eleitoral, enquanto o crédito para empresas, de forma geral, não está crescendo. "Portanto, não tenho dúvida de que esses financiamentos a aquisições representarão grande parte do crédito novo a empresas neste ano." O Itaú tem adotado uma postura mais conservadora. "Não temos apetite por tíquetes elevados, como no passado. Queremos pulverizar a carteira de empréstimos", diz.

Os bancos ressaltam que, quando boa parte das operações foi fechada, as condições de mercado estavam melhores. Segundo Fernandes, a volatilidade dos últimos dois meses está dificultando o acesso ao mercado de capitais. Um financiamento de aquisição tradicional é composto por um empréstimo-ponte que depois é substituído por uma operação de emissão de dívida doméstica ou internacional. "A parte de mercado de capitais, que se imaginava fazer mais rapidamente, terá que esperar. E os bancos estão vendo como acomodar isso em seus balanços", diz. Como os empréstimos-ponte têm prazo de dois a até três anos, não há um problema iminente.

Para Leoni, do J.P. Morgan, por ora a volatilidade não afetou o custo do crédito bancário, mas sim o mercado de capitais. "Até o pós-eleições, todas as aquisições que ocorrerem tendem a sair via empréstimos-ponte ou via balanço de banco, dado que as empresas não vão querer tomar risco de mercado de capitais com tanta volatilidade", corrobora Queen, do Citi. Leia mais em portal.newsnet 25/06/2018

24 junho 2018



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