O Brasil se descolou do resto do mundo no crescimento da economia. Após a crise global de 2008, a maior desde a Grande Depressão de 1930, os países ao redor do mundo já escaparam da recessão e mostram resultados positivos, enquanto o Brasil engatinha numa recuperação ainda incerta. Segundo projeções de Alessandra Ribeiro, sócia e economista da Tendências Consultoria, o Brasil ainda estará andando atrás do mundo no quesito crescimento econômico na próxima década.
— No nosso cenário, olhando para os próximos dez anos, o país crescerá em média 2,6%, enquanto o mundo deve ter expansão média de 3,2% no mesmo período — projeta a economista.
Mas o que nos jogou na lanterna do crescimento? Entre mais de 40 países, o Brasil ocupou a penúltima posição no desempenho do segundo trimestre deste ano, divulgado na última sexta-feira pelo IBGE. A alta de 0,3% frente ao mesmo período de 2016, a primeira nesse tipo de comparação depois de três anos, só ficou acima do desempenho da Noruega, que sofreu com as oscilações do preço do petróleo, item forte na sua economia, segundo levantamento da Austin Rating.
Na avaliação da economista Monica de Bolle, professora da Escola de Estudos Avançados da Universidade Johns Hopkins e pesquisadora sênior do Peterson Institute for International Economics, tudo começou a dar errado para o Brasil em 2011. Entre 2004 e 2011, crescíamos em média 4,4%, e o mundo, 4,25%.
— Começamos a descolar do mundo quando o ciclo da commodities virou, e os preços começaram a cair. Coincide com o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. Isso levou a que vários preceitos de política econômica fossem alterados no Brasil. Usou-se crédito público para irrigar a economia, houve afrouxamento na questão fiscal, para manter o crescimento. No fim, deu tudo errado. Foram nossas escolhas que nos puseram na situação de hoje.
APOSTA NA DEMANDA E DESONERAÇÕES
O efeito foi sentido logo a seguir. Entre 2012 e 2016, enquanto o mundo crescia em média 3,4%, a economia brasileira recuava 0,4% ao ano. Alessandra lembra que a política econômica adotada para enfrentar o freio no boom das commodities incentivava a demanda:
— Entendia-se que o país não crescia por falta de demanda. Então vamos inflar a demanda, reduzindo impostos, dando subsídios, depreciando o câmbio para exportar mais. Mas não tínhamos capacidade para atender a essa demanda, e os preços subiram. Quem não se lembra da inflação dos serviços, que bateu mais de 12%? Restaurante no Rio era mais caro que em Nova York. Havia alguma coisa errada, claro.
Isso começou a bater nas nossas contas com o resto do mundo: o déficit em transações correntes chegou a 4% do PIB. Precisava-se importar muito para atender ao consumo em alta.
Monica afirma que outros países também sofreram com o fim do ciclo de alta das commodities, mas mantiveram as políticas macroeconômicas, sem ameaçar as contas públicas. Perderam em crescimento, mas não amargaram dois anos seguidos de recessão, que fez a economia brasileira recuar quase 8%, deixando mais de 13 milhões de desempregados.
— Chile, México, Peru e Colômbia enfrentaram a reversão do ciclo das commodities de forma mais ordenada. Quando se esgotou aquele cenário externo muito benéfico, eles se readequaram. Mantiveram a política macro, ninguém fez maluquice no lado fiscal, elevando o déficit nas contas públicas e aumentando a dívida.
Atualmente, esses países têm mostrado crescimento bem superior ao do Brasil. O Chile cresceu 0,9% no segundo trimestre e vem nessa trajetória de alta pelo menos desde o início de 2016, de acordo com levantamento feito pelo economista Alex Agostini, economista-chefe da Austin Rating. Naquela época, enquanto o Brasil recuava 5,4%, o Chile crescia 2%.
Até o México — que vem enfrentando a ameaça do fim do Nafta, acordo de livre comércio com Estados Unidos e Canadá, feita repetidas vezes pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump — exibe taxas mais robustas que o Brasil. Cresceu 1,8% no segundo trimestre. Os EUA, berço da crise global, também já avançam mais do que o Brasil: a economia americana cresceu 2,2% de abril a junho.
As distorções econômicas atacaram dois pontos. A inflação subiu pela demanda forte, e as desonerações para sustentar o consumo afetaram a situação fiscal, a ponto de sairmos de um superávit primário (receita menos despesas antes do pagamento de juros) de 1,72% do PIB em 2013 para déficit de 2,66% do PIB este ano.
As intervenções também fo
ram microeconômicas. O preço da gasolina foi contido e forçou-se uma queda nas tarifas do setor elétrico. Em 2013, as contas de luz ficaram 15,66% mais baratas. Mas, nos dois anos seguintes, subiram 17,06% e 51%. Alessandra lembra que esses controles afetaram as empresas de energia e as usinas de cana.
— Ainda estamos pagando o preço pelos estragos do governo Dilma. Estamos remontando uma economia que foi destruída. Houve intervenções erráticas, tentou-se jogar o preço da energia para baixo, e os preços administrados dispararam em 2015 — afirma Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados.
Conseguiu-se segurar a inflação dentro da meta, de até 6,5%, em 2013 e 2014, mas ela disparou em 2015. O Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 10,67%. E a recessão se instalou: o PIB caiu 3,8% em 2015 e 3,6% em 2016. Este ano, as previsões estão em torno de 0,7%.
‘PROBLEMA DO BRASIL É POLÍTICO’
Na comparação com os países da União Europeia que sofreram mais com a crise de 2008, o Brasil também perde. Até a Grécia, que viu seu PIB desabar 25% e enfrentou uma crise política, cresce mais que o Brasil. No segundo trimestre, a alta foi de 0,8%. Portugal e Espanha, outros exemplos de forte retração, cresceram 3,1% e 2,7% respectivamente.
— Lá fora não houve mudança de orientação da política econômica. Se o país tivesse mantido o receituário no início de 2011, com ajuste das contas públicas e alta de juros para conter a inflação, ao invés de queda, não estaríamos tão mal. A adoção da nova matriz econômica trouxe resultado medíocre de atividade — diz Thais Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados.
Para Agostini, o grande entrave é a dificuldade de lidar com a crise política:
— O problema do Brasil é político.
Já Monica de Bolle ainda crê que é possível o Brasil acompanhar o crescimento mundial:
— Podemos acompanhar o resto do mundo em 2022, se no ano que vem conseguirmos eleger alguém articulado para fazer as reformas necessárias, como a da Previdência e do sistema financeiro, que trabalhe no ajuste fiscal, pois vai receber um legado horroroso. O Globo Leia mais em newsstand 04/09/2017
04 setembro 2017
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segunda-feira, setembro 04, 2017
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Ruy Moura
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