Ao longo da década de 70, Warren Buffett fez uma transição importante na sua estratégia de investimentos. Incentivado por Charlie Munger, seu parceiro de longa data, Buffett passou a priorizar cada vez mais a qualidade dos negócios e das pessoas envolvidas nas empresas, ao invés do tamanho do desconto com que as ações dessas companhias eram negociadas. Saíam de cena os "cigar butts" e entravam os negócios com franquias sólidas e executivos fortemente alinhados. Segundo Buffett, essa evolução foi fundamental para a continuidade dos seus bons resultados como investidor.
No Brasil, o investidor que seguisse a estratégia de Buffett olharia com ceticismo empresas de commodities (dependentes de fatores externos pouco previsíveis), empresas estatais (que têm interesses frequentemente distintos dos investidores) e outros setores cada vez mais sujeitos à "mão pesada" do governo. Buscaria negócios com pessoas bem-intencionadas e competentes, marcas conhecidas, altos retornos sobre o capital investido e posições competitivas que tornassem a vida dos rivais cada dia mais difícil.
Na década de 90, as empresas brasileiras que atendiam a tais critérios de qualidade eram raras e, em sua maioria, de baixa capitalização, baixa liquidez e ofereciam poucos direitos ao investidor.
De lá para cá, a situação melhorou. A Bovespa criou o Novo Mercado e, em seguida, veio uma onda de aberturas de capital repleta de novos negócios de qualidade para os investidores locais. Ainda assim, das pouco mais de 300 empresas listadas hoje na bolsa brasileira, um olhar realmente criterioso selecionaria aproximadamente 40 como de altíssima qualidade. É um universo restrito e, quanto mais as alternativas se mostram arriscadas, mais os investidores parecem escolher os mesmos negócios, inflando os preços e reduzindo retornos potenciais.
Para ampliar o escopo de excelentes empresas com preços razoáveis, é necessário olhar para fora do Brasil. Com número virtualmente infinito de opções, é possível encontrar centenas de empresas de altíssima qualidade e um bom número que negocia a preços atraentes. Muitas delas com modelos de negócios que não existem para o investidor no Brasil. De fato, empresas como a Getty Images (licenciamento de imagens), a Thermo-Fisher (equipamentos para pesquisas e laboratórios), a Coca-Cola ou mesmo a Berkshire Hathaway não encontram semelhantes no mercado nacional.
Até recentemente, o processo de investir no exterior era complicado. Envolvia a criação de um fundo offshore, a remessa pelo investidor de dólares por meio de seu banco para a conta do fundo e o recolhimento cuidadoso dos eventuais ganhos no carnê-leão. Na prática, todo este arrasto burocrático só se justificava para carteiras de maior valor, raramente inferiores a US$ 5 milhões.
Com o recente surgimento dos Fundos de Investimento no Exterior, registrados na CVM, o processo melhorou. Com eles, as aplicações e os resgates são feitos em reais (já que é o fundo que faz o câmbio) e o Imposto de Renda é retido na fonte, como nos demais fundos. Há ainda a possibilidade de compensação de eventuais prejuízos contraídos em fundos de um mesmo administrador.
Uma pergunta natural é se gestores brasileiros são capazes de ganhar dinheiro no exterior. A resposta deve ser em parte empírica. Como em qualquer investimento em fundo, é fundamental não só compreender a estratégia do gestor como garantir que ele está alinhado tanto para os ganhos como para as perdas, além de exigir um longo histórico de bons resultados.
Nos últimos meses, assistimos a uma demanda cada vez maior por investimentos no exterior. O movimento se reforça com a estagnação do crescimento brasileiro e a deterioração dos fundamentos do real. Isso acontece ao mesmo tempo em que os EUA parecem liderar mais uma vez o mundo na saída da recessão.
Buffett mostrou que é fundamental evoluir para sustentar bons retornos ao longo do tempo. A maior facilidade de investir no exterior é um avanço positivo para o mercado de capitais e oferece novas opções para o investidor brasileiro. Aqueles que compartilham a ansiedade e a dúvida em relação à condução da política brasileira têm agora uma alternativa para dormir um pouco melhor.
(A IP tem posições em Berkshire Hathaway e Thermo-Fisher)
POR Roberto Vinhaes | Valor Econômico FONTE:
clippingmp 31/07/2013