Em um mês, três operações foram anunciadas; a Advent, fundo internacional que investiu na Kroton em 2009, volta ao mercado neste ano para formar nova rede de instituições
Grupo Ser Educacional adquiriu faculdade no Rio de Janeiro e fortalece expansão para o Sudeste
As mudanças regulatórias do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) promovidas pelo Ministério da Educação (MEC) no final de 2014 deixaram muitas instituições de ensino superior privado preocupadas e impactadas. O setor, no entanto, não está paralisado e, depois do choque de realidade, dá início a uma nova série de fusões e aquisições.
No último mês, três operações foram anunciadas: a aquisição de duas faculdades e um colégio do litoral Norte de São Paulo pela Cruzeiro do Sul Educacional; a volta do fundo de investimento Advent (grande responsável pelo crescimento do grupo Kroton no País) ao mercado de educação, com a compra da Faculdade da Serra Gaúcha (FSG), em Caxias do Sul; e a compra do Centro Universitário Bennet, no Rio de Janeiro, pela Ser Educacional, que no ano passado adquiriu a Universidade Guarulhos, em São Paulo.
Para Marcos Boscolo, sócio da KPMG no Brasil para a área de educação, a reação do mercado vem da necessidade de mostrar força aos investidores. "Se a oportunidade do Fies foi reduzida, tenho de crescer de forma orgânica, ou aumentar minha base de alunos. Parte desse movimento são respostas dos grandes grupos dizendo 'eu reduzi a base de alunos do Fies, mas, em contrapartida, vou expandir meu negócio via aquisição para retomar o crescimento", explica.
A partir deste ano, para ter acesso ao Fies, os alunos precisam ter nota mínima de 450 pontos no Enem. Também houve uma mudança no esquema de repasses e recompras do FNDE (órgão ligado ao Ministério da Educação) às instituições de ensino - serão 8 parcelas, em vez de 12. Além disso, as faculdades com notas 4 e 5 no MEC terão prioridade para novos contratos.
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Segundo Carlos Monteiro, da CM Consultoria, enquanto as instituições que criaram uma grande dependência do FIES vivem um momento de crise, os private equitys (empresas que compram empresas menores, melhoram seus indicadores e as vendem valorizadas) interessados em investir no setor e as grandes redes de ensino com dinheiro em caixa enxergam no período boas oportunidades. "As instituições pequenas têm dois caminhos: ou elas fazem um arranjo institucional e começam a pensar em um tipo de organização em rede para criarem musculatura e enfrentar o mercado ou vão ser vendidas", diz.
A Advent, que em 2009 comprou parte do grupo de ensino Kroton e viu o número de alunos da rede se multiplicar 25 vezes, já anunciou que a aquisição da FSG é a primeira de uma série. Há pelo menos outras seis em negociação em andamento nas regiões Sudeste, Norte e Nordeste e uma delas deve ser fechada ainda este ano.
"A posição é parecida com a que tivemos na Kroton. Há duas avenidas de crescimento. Vamos investir em ampliação dos cursos nas unidades atuais e a construção de um novo campus, já que queremos dobrar o número de alunos em três ou quatro alunos. Mas também teremos outras aquisições. No Rio Grande do Sul, estamos olhando instituições menores com pelo menos mil alunos, e fora do Estado, instituições que tenham perfis de qualidade e liderança na região e ao menos três mil alunos", conta Newton Maia, diretor da Advent em São Paulo.
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Segundo Maia, depois do aporte na FSG e da aquisição de outras instituições, a ideia é formar um grupo de educação que "não será do tamanho da Kroton, mas com qualidade acima da média". A Advent vendeu sua participação na Kroton há um ano e meio – à época do investimento, em 2009, o grupo valia R$ 400 milhões; hoje, vale cerca de R$ 18 bilhões.
"Os fundos de private equity entram em um negócio sem pensar em se eternizar nele. Diversos fundos já saíram do investimento com muito lucro. Eles realizam os lucros e procuram um novo negócio. A Advent agora tem um novo ciclo e outras organizações financeiras também estão vendo isso. É um movimento cíclico", afirma Monteiro.
Segundo dados da empresa Transactional Track Record (TTR), que monitora operações de fusões e aquisições, em 2014 foram celebradas 36 operações de compra de ativos, formação de joint ventures e fusões no setor de educação (9 delas incluíram empresas estrangeiras). Este ano, já aconteceram seis.
De acordo com estudo da KPMG, 2007 foi o ano em que houve mais operações no mercado educacional (57).
Valores podem cair, mas operações não serão pequenas
Ainda é difícil prever se as operações serão maiores ou menores do que as que ocorreram nos últimos anos. O iG apurou que a Advent está investindo R$ 500 milhões nas novas aquisições – o investimento inicial na Kroton foi de R$ R$ 280 milhões. Mas, segundo Carlos Monteiro, o valor por aluno caiu. "O preço que a Advent pagou por aluno na serra gaúcha é menor do que o praticado no segundo semestre do ano passado. O que vemos no mercado é uma queda de preço, mas não sabemos se essa queda representa uma tendência. Vai depender da reação do mercado e do Fies", diz Monteiro.
Para Boscolo, o que veremos em 2015 são fusões e aquisições de empresas de médio e grande porte. "Não compensa para um grupo que tem 60 mil alunos comprar uma instituição de 3 mil. O investimento em adaptação de currículo e outras coisas é maior que o retorno. Eu imagino que operações maiores vão acontecer e o movimento de operações dessas menores não será grande", afirma.
Segundo ele, o cenário de operações a curto prazo pode surpreender. "Temos menos ativos disponíveis, e grandes grupos que não se mexem. Sempre ouço falar que tem muitas companhias abertas em educação e concordo. Acho que podemos ver a fusão de algumas."
Mas isso não quer dizer que as pequenas instituições não estejam interessadas em fazer negócio. As mudanças no Fies deixaram muitas delas com o caixa apertado. Segundo Maia, depois das alterações, muitas faculdades se abriram para negociações.
"Se o Fies diminuir e os agentes financeiros privados continuarem a privilegiar as grandes redes com convênios milionários, não vai sobrar dinheiro para as pequenas. Sem poder financiar os alunos, muitos alunos irão para as grandes instituições e as pequenas vão começar uma guerra de preços", especula Monteiro.
Para Boscolo, as instituições menores terão dificuldades em encontrar compradores que paguem o que elas pedem. "O que eu vejo é que pode ocorrer um movimento de fusão das pequenas faculdades. Se eu tenho quatro mil alunos e você tem três mil alunos, vamos fazer um negócio de sete mil."
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Mudanças no Fies deixam cenário mais real
Apesar das alterações do MEC terem sido vistas por muitos como um banho de água fria, Monteiro acredita que o atual cenário deixa as projeções mais reais. "O Fies, de 2010 a 2014, foi uma bolha que cresceu muito. Todo mundo adorou, mas não era um círculo magico, ele foi até o momento que o governo tinha dinheiro no caixa. Todas as instituições que planejaram a expansão com base no programa estão hoje impactadas. Agora, vamos ter um movimento mais organizado, um portfólio mais ampliado."
"Sempre é preciso tomar cuidado ao projetar crescimento em algo regulatório que, se mudar do nada, você vai ter um baque. Agora as projeções se tornam realistas e devemos ver uma recuperação no valor das ações de empresas de capital aberto", concorda Boscolo.
Para o sócio da KPMG, o setor educacional no Brasil ainda é muito atrativo. "O mercado ainda é muito rentável. Com a pressão do mercado ao governo, acho que eles vão entender que não estão tão bem para ganhar mais um inimigo, então acho que o governo vai rever as medidas e dar algum incentivo."
A Advent não tem dúvidas de que o mercado ainda pode crescer. "Achamos que é um setor que tem baixa penetração, porque o percentual de pessoas adultas com ensino superior é baixo e as empresas valorizam muito o diploma universitário. E o Brasil teve uma explosão de universidades e, especialmente em um momento, desse com mudança regulatória e aperto de cinto, faz sentido ganhar escala, ter uma musculatura maior, então tem possibilidade de aquisição", diz Maia.
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Grupos educacionais internacionais podem entrar no mercado
Segundo Boscolo, algo que não pode ser descartado é a entrada de grupos educaionais internacionais no setor. "Já houve a compra da FMU pela rede americana Laureate [que é dona da Anhembi Morumbi, e outros grupos fortes fora do País continuam prospectando no Brasil", conta.
Ele diz que, caso um grande grupo estrangeiro entre no mercado, não deve ser para fazer pequenos negócios. "Se eles entrarem, vão entrar para comprar ativos grandes." Por Bárbara Libório -
Leia mais em iG São Paulo | 30/03/2015