O governo quer estimular grupos brasileiros a disputar a fatia de 39% que a espanhola Iberdrola tem na Neoenergia, terceiro maior grupo privado de energia elétrica no País. Colocada à venda recentemente, a participação acionária atraiu o interesse de empresas estrangeiras. O Palácio do Planalto, no entanto, tem outros planos: aproveitar a oportunidade para "nacionalizar" o controle da companhia.
Não é a primeira vez que o governo tenta impor sua vontade na Neoenergia. Há dois anos, o Planalto apoiou a tentativa da CPFL, controlada pela Camargo Corrêa e pelo fundo de pensão Previ (dos funcionários do Banco do Brasil), de comprar a participação da Iberdrola. Daquela vez, os espanhóis não quiseram vender. Agora, acredita Brasília, eles estão pressionados pela crise na Europa.
"A Iberdrola agora dá sinais de que deseja sair da Neoenergia e este governo gostaria que grupos brasileiros entrassem em seu lugar", diz uma fonte de Brasília. Oficialmente, ninguém fala do assunto. Mas duas fontes do governo disseram ao Estado que a intenção é evitar que a participação dos espanhóis, se for mesmo vendida, vá parar nas mãos de outros estrangeiros.
Foi por isso que semanas atrás o governo agiu para bloquear a negociação entre a Iberdrola e a chinesa State Grid, e pode fazer o mesmo com os alemães da E.On, que também estão interessados na empresa.
No Brasil, os candidatos potenciais são a Cemig, estatal mineira de energia, e a CPFL. Esta semana, o diretor financeiro da Cemig, Luiz Fernando Rolla, admitiu que a empresa tem interesse nos ativos da Neoenergia. Fontes ligadas à estatal mineira dizem que já há conversas em andamento, no Brasil e na Espanha.
"Eles estão bastante animados e acham que têm boas chances de negociação", afirmou um executivo que prefere não ser identificado. Procurada ontem, a companhia mineira não quis falar sobre o assunto.
Nos últimos anos, a Cemig ampliou seus negócios para além das fronteiras de Minas. Em 2009, adquiriu participação na Light, distribuidora do Rio de Janeiro. Com a Neoenergia, ela estrearia no Nordeste, mercado que hoje apresenta as maiores taxas de crescimento de consumo do País (até março, a expansão foi de 7,4%).
A Neoenergia tem a concessão de três distribuidoras no Nordeste, 445 quilômetros (km) de linhas de transmissão e 1,4 mil megawatts (MW) de capacidade instalada - potência que deve alcançar 4.048 MW até 2018, quando entram em operação projetos como a Hidrelétrica de Teles Pires. Em 2011, faturou R$ 9,8 bilhões e teve lucro de R$ 1,55 bilhão.
Peso político.
Além do peso político, o governo pode influenciar o negócio por meio do Banco do Brasil e da Previ (fundo de pensão dos funcionários do banco), donos de 61% da Neoenergia. As últimas ações do Planalto imobilizaram os movimentos dos espanhóis.
No ano passado, eles tentaram comprar a participação do Banco do Brasil e parte da fatia da Previ, mas a operação foi vetada em Brasília. Agora, a Iberdrola quer vender suas ações e o governo está espantando os investidores estrangeiros.
Os espanhóis estão pressionados, além da crise europeia, pela entrada em vigor de novas regras contábeis na Europa. Sem o controle da empresa, a Iberdrola não poderá mais incluir os números brasileiros nos resultados da holding. A medida tem impacto no relacionamento comercial com o mercado financeiro. Como foram impedidos de aumentar a participação na operação brasileira, os espanhóis partiram para a tentativa de venda.
Uma possibilidade aventada por executivos do mercado seria a aquisição da participação da Iberdrola pelos dois sócios estatais, que poderiam exercer o direito de preferência. Mais tarde, eles venderiam as ações para uma empresa nacional. Mas essa não seria a primeira alternativa, porque o governo não quer que a manobra seja interpretada como uma reestatização.
Tempos atrás, esse receio afastou a Eletrobrás da rota da Neoenergia. A estatal ensaiou uma aproximação com a empresa, mas foi advertida pelo Planalto, que a queria fora do processo.
Fontes do governo afirmam que o objetivo não é reestatizar a Neoenergia. Mas lembram que o setor elétrico é considerado estratégico por eles e, por isso, alguns segmentos não são, segundo essa visão, lugar para empresas estrangeiras.
A interferência nos negócios de grandes companhias privadas tem sido uma marca da gestão petista. A presidente Dilma Rousseff, que no governo passado estava na Casa Civil, forçou os sócios da Vale a trocar de presidente e escolher um executivo afinado com ela, criou um "consórcio privado" para fazer a Hidrelétrica de Belo Monte e está usando os bancos públicos para pressionar as instituições privadas a baixarem os juros. Em todos esses episódios, ela conseguiu o que queria. Por DAVID FRIEDLANDER, RENÉE PEREIRA
Fonte: O Estado de São Paulo 23/05/2012
23 maio 2012
Governo quer empresas brasileiras no lugar de espanhóis na Neoenergia
quarta-feira, maio 23, 2012
Compra de empresa, Desinvestimento, Energia, Infraestrutura, Investimentos, Transações MA, Venda de Empresa
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Ruy Moura
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