Acelerada na década passada, a escalada das multinacionais brasileiras já acumulou ativos de mais de US$ 100 bilhões lá fora.
Há muitos anos, o executivo Luiz Eduardo Moreira Caio, presidente da Metalfrio, fabricante paulista de refrigeradores comerciais, mantém o hábito de ler um, às vezes dois livros por semana. Nos últimos cinco, passou a incluir nessa lista livros de história, antropologia e religião com foco no México, na Turquia e Rússia. O interesse recente por essas culturas tem uma razão de ser: no ano passado, 43% dos R$ 783 milhões das receitas da companhia que comanda vieram de suas subsidiárias do México, da Turquia e Rússia, países que concentram quase a metade de seus quatro mil funcionários. Graças a um projeto audacioso de expansão internacional, iniciado em 2006, a Metalfrio tornou-se, em muito pouco tempo, uma das empresas mais globalizadas do País.
De la rosa, Ceo da marcopolo: a terceira fase da internacionalização prevê a compra de concorrentes no Exterior.
É a quinta num ranking da Fundação Dom Cabral, liderado pela JBS-Friboi, “O grande desafio é combinar o que é local e o que é global”, diz Caio. A trajetória da Metalfrio desenvolvida ao longo dos últimos seis anos não é um caso isolado. É exemplar de uma transformação revolucionária no ambiente empresarial brasileiro. Na última década, algumas dezenas de grupos romperam as fronteiras e passaram a atuar no Exterior, não só com escritórios de representação comercial, mas com pontos de venda, centros de pesquisa e de armazenamento, além de fábricas, agências bancárias e canteiros de obras, entre outros. Muitas delas mudaram de patamar ao comprar seus concorrentes estrangeiros – caso da Vale, que virou a segunda maior mineradora do mundo ao adquirir a canadense Inco, em 2006, por US$ 13 bilhões.
Moreira Caio, da Metalfrio: "O grande desafio é combinar o que é local e o que é global".
Algumas multinacionais verde-amarelas são atualmente líderes mundiais em seus setores, como o frigorífico JBS e a fabricante de artigos de cama, mesa e banho Coteminas. A empresa fundada pelo ex-vice-presidente da República José Alencar, e hoje dirigida por seu filho Josué Gomes da Silva, foi capa da edição 423 da Dinheiro, em 19 de outubro de 2005, quando adquiriu o controle da americana Springs. Até os anos 1990, dava para contar nos dedos o número de empresas brasileiras com presença no Exterior. Basicamente, esse grupo restrito era formado por construtoras (Odebrecht, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez) e algumas siderúrgicas (CSN e Gerdau). O cenário começou a mudar no início da década passada e rapidamente mostrou-se uma tendência irreversível.
Em 2006, o fenômeno chamou a atenção. Pela primeira vez, o fluxo de saída de investimento direto, US$ 28 bilhões, foi maior que o de entrada, US$ 19 bilhões, fazendo com que o Brasil fosse, naquele ano, o maior “exportador” de investimentos entre os países em desenvolvimento, atrás apenas de Hong Kong. Segundo a Fundação Dom Cabral, em 2010, o total de ativos no Exterior das 20 empresas mais internacionalizadas do País chegava a US$ 100 bilhões e o número de funcionários, a 216 mil. Mais recentemente, os empresários ainda contaram com uma conjuntura favorável para a expansão no Exterior. A crise financeira internacional e a valorização do real deixaram os ativos mais baratos no exterior.
Coteminas: num lance surpreendente, a têxtil mineira comprou ocontrole da americana Springs, em 2005.
A Stefanini, empresa de tecnologia da informação, comandada pelo empresário Marco Stefanini, conta com filiais lá fora desde 1996, mas deu um salto no seu processo de internacionalização em 2010, com a compra de duas empresas nos Estados Unidos e uma na Colômbia.
Atualmente, ela ocupa a segunda posição no ranking da Dom Cabral.
No mesmo ano, a fabricante de motores Weg anunciou a aquisição do controle de duas companhias na África do Sul e no México. A empresa de Jaraguá do Sul (SC) tem 40% da receita no Exterior e fábricas em oito países.
Com o pé fora do Brasil desde 1991, a montadora de ônibus Marcopolo, de Caxias do Sul (RS), presidida pelo executivo José Rubens de La Rosa, deu início, no ano passado, à terceira fase da sua expansão internacional.
A regra, agora, é adquirir empresas no Exterior. Em dezembro, a empresa gaúcha, que opera uma fábrica na Índia com o grupo Tata, comprou, por US$ 52 milhões, 75% da australiana Volgren. A ideia é repetir a dose em outras regiões como o sudeste asiático. “O momento é apropriado”, diz Ruben Bise, diretor de desenvolvimento e estratégia da Marcopolo. “Temos caixa, suporte do BNDES e o dólar favorável.” Ao contrário do que ocorria no passado – quando a companhia exportava os kits do Brasil e apenas montava os ônibus no Exterior – a meta agora é manter lá fora boa parte da produção e do desenvolvimento de produto. “Por causa do câmbio e do custo Brasil, o modelo antigo perdeu a competitividade”, diz Bise. Em outras palavras: se existe algo que as múltis brasileiras têm em comum é a habilidade de dançar conforme a música.
Fonte: Revista Isto É Dinheiro 21/04/2012
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