Os maiores bancos do País se atropelam para comprar a principal processadora independente de cartões de crédito
Nos últimos dias de fevereiro, o executivo mexicano Manuel Medina-Mora, copresidente do Citigroup e responsável pelas atividades de banco de varejo do gigante americano, fez uma discreta visita ao Brasil. Na agenda, além da inspeção regulamentar das tropas aquarteladas no edifício de granito rosado e vidros azuis da avenida Paulista, Medina-Mora reuniu-se com um interlocutor em especial, o banqueiro Roberto Setubal, CEO do Itaú Unibanco. Ambos discutiram a compra da Credicard, empresa administradora de cartões de crédito controlada pelo Citi e que está à venda desde o início deste ano. O acesso às informações da Credicard, conhecido como data-room, foi aberto no início de março.
Se não houver atraso, os candidatos terão até os primeiros dias de abril para elaborar suas propostas. O nome do novo proprietário deverá ser anunciado em meados do mês. Transações desse tipo são tratadas como segredo de Estado, daí nenhum dos sete entrevistados para esta reportagem ter concordado em aparecer. No entanto, o quadro que emerge das conversas é bastante claro. Setubal desponta como o franco favorito. Mesmo assim, nada garante a vitória do Itaú. O arquirrival Bradesco, também está participando do páreo, seguido de perto pelo Santander e pelo Banco do Brasil. O BTG Pactual, do banqueiro André Esteves, chegou a fazer exercícios de alongamento, mas abandonou a corrida em seus primeiros metros.
Esperam-se fortes emoções na que será a maior transação no mercado de cartões realizada nos últimos dez anos, desde que o controle da Credicard, que era compartilhado por Citibank, Itaú e Unibanco, ficou apenas com o banco americano. O que está em jogo é a última grande emissora de cartões disponível no mercado, com 7 milhões de plásticos. A Abecs, entidade de classe que representa o setor, não tem números fechados para 2012. No entanto, uma estimativa informal dos profissionais avalia que os pagamentos com cartões no Brasil e no Exterior movimentaram R$ 470 bilhões no ano passado, um crescimento de 21% em relação a 2011. Os cartões de crédito da Credicard responderam por 4,5% dessas transações.
Além da fatia relevante de mercado e da equipe azeitada, a Credicard conta com uma das marcas mais fortes no segmento. Não por acaso, o preço final de venda poderá superar R$ 2 bilhões – o dobro do valor patrimonial da companhia. O negócio faz sentido para todos os participantes da corrida. O líder é o Itaú Unibanco, cujos cartões movimentam 28% das transações. Essa cifra não considera os sete pontos percentuais de participação da Hipercard, adquirida pelo Unibanco em 2003. A compra da Credicard colocaria o banco dirigido por Setubal na liderança isolada no mercado. Essa não é a única vantagem. A Credicard é uma administradora de cartões, mas não possui uma processadora de transações, que são realizadas por computadores instalados fora do Brasil.
Para o Itaú, que conhece bem a empresa, é relativamente simples capturar esses negócios usando os recursos de que já dispõe, principalmente a empresa de adquirência Redecard, cujo capital foi fechado no início do ano. Há outro item, menos tangível, mas igualmente importante. Um dos fundadores da Credicard nos anos 1970, o Itaú não veria com bons olhos essa marca no portfólio do arquirrival da Cidade de Deus. No caso do Bradesco, as vantagens de ganho de escala são semelhantes. A diferença é o peso da marca Credicard, cujas transações internacionais funcionam como um excelente complemento à bandeira nacional Elo, lançada pelo banco presidido por Luiz Carlos Trabuco em parceria com o BB e com a Caixa Econômica Federal em março de 2011.
A aquisição colocará o banco mais perto do Itaú na área de cartões, uma das principais ferramentas dos bancos para capturar clientes e garantir sua fidelidade. Os plásticos fornecem informações instantâneas sobre gastos e padrões de consumo, e permitem oferecer produtos e empréstimos sob medida, uma informação muito preciosa para qualquer instituição financeira. Um raciocínio semelhante vale para o Banco do Brasil. A diferença é a estratégia de atuação do bancão presidido por Aldemir Bendine. A compra do controle de uma empresa privada vai sujeitá-la imediatamente às restrições e amarras da administração pública, por isso a transação poderá ser feita tanto pela Elo quanto pelo Banco Votorantim ou pela BV Financeira.
O caso do Santander tem características especificas. Em condições normais de temperatura e pressão, os espanhóis são quem tem mais a ganhar com a compra da Credicard. Além de duplicar sua fatia de mercado, o banco ganha uma marca tradicional no Brasil, algo que faz falta em sua estratégia. Outra vantagem é turbinar sua empresa de adquirência e processamento de transações GetNet. No entanto, mesmo que a subsidiária brasileira do Santander tenha caixa para pagar a fatura, ela terá de enfrentar, além da concorrência, a situação complicada dos bancos na Europa, o que torna mais difícil para o presidente Marcial Portela convencer os acionistas a desembolsar dinheiro.
E a situação do vendedor? No caso do Citi, a venda da Credicard representa uma desistência definitiva da conquista de uma posição relevante no varejo brasileiro. A mais recente tentativa do Citi de ganhar musculatura foi iniciada em 2006 com um agressivo processo de abertura de agências. Esse processo foi interrompido com a crise dos financiamentos imobiliários nos Estados Unidos e, a partir de agora, o Citi deverá concentrar-se apenas nas operações corporativas e nos clientes de alta renda. Para isso, o banco comandado por Helio Magalhães, que fez carreira na American Express, manterá a bandeira Diners. Procurado, o Citi informou que não comenta rumores de mercado. Da mesma forma, Santander, Itaú, Bradesco, Banco do Brasil e Banco Votorantim não concederam entrevista. Façam suas apostas, senhores.
Por Cláudio GRADILONE
Fonte: istoedinheiro 22/03/2013
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