Sem pressa, as principais indústrias farmacêuticas nacionais começam a se articular para ir à bolsa. O laboratório Aché, especializado em genéricos e medicamentos de prescrição médica, é o mais adiantado nesse processo e poderá fazer sua estreia no mercado de capitais a partir do segundo semestre, apurou o Valor. Outras companhias do setor, como Eurofarma, Biolab, Cristália e EMS, não descartam seguir o mesmo caminho - embora ainda não estejam com a operação no forno.
Analistas e fontes do mercado financeiro ouvidos pelo Valor afirmaram que o interesse do mercado nos papéis dessas farmacêuticas é forte no curto e médio prazo, mas se essas companhias continuarem calcando suas apostas somente no segmento de genéricos o futuro dessas empresas na bolsa não é nada promissor. O mercado espera investimento em inovação.
O setor farmacêutico só está representado na bolsa por meio da Hypermarcas - hoje cerca de 45% das receitas da empresa vêm desse segmento. A empresa foi bastante atuante na consolidação do setor, com aquisições relevantes, como Neo Química e Mantecorp. Na avaliação do mercado, inclusive, chegou a pagar preços muito altos para ficar com os ativos.
Boa parte dos laboratórios nacionais virou alvo de grandes multinacionais interessadas em crescer no país, sobretudo no segmento de genéricos. Esses produtos representaram 22% do total de medicamentos vendidos no país em 2011 e deverão dobrar sua participação até 2015.
A expectativa do mercado para um movimento de abertura de capital das grandes farmacêuticas nacionais começou a ganhar força nos últimos três anos, como forma de essas companhias promoverem sua expansão dentro e fora do país e fazerem frente às estrangeiras.
A francesa Sanofi-Aventis começou a puxar a fila desse movimento no fim de 2009, ao adquirir a nacional Medley, que estava endividada. A americana Pfizer adquiriu 40% de participação da nacional Teuto, também especializada em genéricos.
Apesar de estarem de olho em oportunidades de ir ao mercado para não se tornarem alvo de aquisições, essas companhias não têm necessidades urgentes de recursos. Isso porque o negócio farmacêutico é forte gerador de caixa. A maior parte dessas operações na bolsa tende a incluir ofertas secundárias, em que os atuais acionistas vendem pedaços de suas fatias aos novos sócios.
A questão é que a janela de mercado ainda não é favorável a esse tipo de operação. A bolsa brasileira não recebe uma nova companhia desde julho do ano passado. Os investidores estão ainda muito seletivos e em buscas e à espera de uma grande operação que possa reabrir o mercado. Tendem também a pedir descontos para comprar os papéis.
Muitos dos controladores das farmacêuticas brasileiras não estão dispostos a vender suas ações com desconto. E, como não têm urgência de obter recursos, podem esperar por uma situação de mercado mais favorável, que lhes permita conseguir múltiplos melhores. Além disso, observam especialistas, em muitos casos, as empresas do setor ainda precisam promover melhorias em governança e também profissionalização.
O Aché foi uma das primeiras companhias a se preparar para abir o capital. Mas está segurando a operação por conta da crise global e do desempenho ruim da bolsa no ano passado. Com uma oferta no Novo Mercado, um percentual entre 20% e 25% da companhia deverá ficar na bolsa. Procurado, o laboratório informou que "a abertura de capital não faz parte da pauta do Aché neste momento". Desde 2010, o Aché está se movimentando para expandir seus negócios, por meio tanto de aquisições - tentou o Mantecorp, mas perdeu o páreo para a Hypermarcas - quanto por parcerias - em 2011 a companhia tentou fechar um acordo com a inglesa GSK, mas as negociações não avançaram.
O recente movimento de aquisições também acabou contribuindo para que as empresas possam ter calma antes de acessar a bolsa porque ajudou a inflar os preços dos ativos nacionais. Também contribuiu para que eles ficassem mais caros a forte expansão do mercado de genéricos. De seu lado, os candidatos a consolidadores têm reclamado dos preços elevados, o que dá mais tranquilidade às empresas em se defender.
De acordo com uma fonte, o mercado teria interesse em comprar papéis das grandes farmacêuticas nacionais, como Aché, Biolab, Eurofarma, EMS e Cristália, por exemplo. Mas essas empresas teriam de fazer uma oferta para levantar no mínimo US$ 300 milhões, para conseguirem boa liquidez na bolsa. Ele lembra que hoje essas companhias são sustentadas pelas genéricos. Mas, no longo prazo, vão ter que investir em inovação. "Caso contrário, os papéis perdem o interesse", disse.
Conforme seu resultado de 2010, o mais recente disponível, o Aché investiu R$ 43 milhões em inovação, pesquisa e inovação naquele ano, ou 53% mais que 2009. E a administração pretendia distribuir aos seus acionistas R$ 202 milhões, ou 61% do seu lucro líquido.
"Não haverá uma avalanche de ofertas no setor no curto prazo. Mas acredito que a operação do Aché ocorra mais cedo do que tarde", afirmou uma fonte. Na visão dele, a EMS, maior companhia farmacêutica nacional, não precisa de recursos, pois tem uma geração de caixa imensa. Outras, como Biolab e Eurofarma, têm condições de ir ao mercado e deveriam olhar a possibilidade com atenção, para não se transformarem em alvos.
O EMS estuda abrir o capital de suas empresas controladas, especializadas em genéricos, como Legrand, Germed e Nova Química. Procurada, a companhia informou que não pretende ir à bolsa.
A Biolab informou ao Valor que o atual ambiente de mercado não está propício para ofertas secundárias. A companhia diz que tem todas as condições de governança, mas a abertura de capital não está nos planos no curto prazo. "A empresa não tem dívidas, tem caixa e os ativos de qualidade no Brasil estão caros e raros", disse uma fonte da empresa. A Eurofarma também não descarta uma oferta, mas não a prepara para logo. A empresa começou a trabalhar a governança, com publicação de relatórios anuais, elaboração de planejamento estratégico, um conselho consultivo e a transformação da companhia em S.A. (sociedade anônima).
Para diversificarem seus negócios e se tornarem mais competitivos comparados às multinacionais, os laboratórios Aché, EMS, União Química e a companhia Hypermarcas decidiram criar a BioBrasil, a superfarmacêutica nacional com o apoio do BNDES, para pesquisar e desenvolver medicamentos biológicos e biossimilares. Em outro bloco, Eurofarma, Biolab, Cristália e Libbs também se articulam para criar uma nova companhia para também investir em medicamentos biológicos, também com apoio do BNDES.
"Se essas empresas realmente decidirem diversificar sua atuação, aí sim os papéis dessas companhias no mercado seriam atraentes", disse uma fonte do setor.Por Ana Paula Ragazzi e Mônica Scaramuzzo
Fonte:Valor16/03/2012
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