Em um cenário com a taxa básica de juros em sua mínima histórica, a reforma da previdência aprovada em níveis satisfatórios e a redução substancial do Estado no financiamento às atividades econômicas, o ano que se aproxima promete ser um dos mais promissores para o mercado de capitais.
Os agentes encontram-se com o desafio (e a oportunidade) de estruturar opções de investimentos capazes de atrair a liquidez disponível, que hoje hesita entre a renda variável e os fundos de investimento imobiliário.
Do ponto de vista da legislação ou regulação a ser editada, há três temas que tendem a pautar a agenda e podem efetivamente contribuir para o maior desenvolvimento do mercado de capitais.
No segmento de renda variável, o primeiro tema a ser enfrentado é a revisão dos limites a ações sem direito a voto, ou com voto restrito, e ao voto plural. Se, por um lado, celebrou-se, em 2019, um aumento substancial nas ofertas de ações de companhias brasileiras, por outro verificou-se a migração de operações relevantes para o mercado internacional.
Embora a principal razão para essa migração tenha fundamento na maior liquidez e no melhor valuation proporcionados pelo mercado internacional, o fato é que a maior flexibilidade deste mercado a mecanismos para alavancagem do controle contribuiu para que a captação de recursos por instrumentos de equity de determinadas companhias brasileiras relevantes fosse realizada por estruturas de investimento internacionais. As ofertas públicas de ações e a capitalização das empresas de tecnologia e financeiras são exemplos desse movimento, que exige reflexão sobre as normas em vigor.
O segundo tema relevante é a atualização as regras, presentes na Lei Federal n. 12.431, para o financiamento à infraestrutura por instrumentos de mercado de capitais. O tratamento tributário benéfico aos investidores desta lei contribuiu substancialmente para a utilização do mercado de capitais no financiamento à infraestrutura, porém a constatação é que há espaço para avanços.
Estes avanços incluem (i) a possibilidade da emissão dos instrumentos em moeda estrangeiras e suas consequências tributárias, (ii) o aumento do prazo-limite tanto para alocação mínima de recursos em fundos de infraestrutura, quanto para utilização de despesas para fins de reembolso, e, (iii) por fim, a criação de regras específicas para atração de investimento por investidores institucionais, sobretudos entidades de previdência, que são tradicionais financiadores da infraestrutura.
Já o terceiro tema é a regulamentação, pela CVM, da Lei da Liberdade Econômica, que tende a gerar impactos substanciais nos fundos de investimento, cuja indústria, no Brasil, conforme dados divulgados pela ANBIMA, supera o valor de R$4,5 trilhões. Esta regulamentação deve impactar de forma mais relevante o FIP e o FIDC, cuja modernização, neste último, já vinha sido liderada pela CVM.
A primeira alteração relevante colocada pela lei foi o regime de responsabilidade dos investidores, dos prestadores de serviço e do fundo, aproximando-o da disciplina das sociedades, com impacto relevante sobretudo para o mercado de private equity. Isso porque:
passa-se a permitir a estipulação, no respectivo regulamento, de limitação da responsabilidade para investidores, com reversão de uma tradição regulatória da CVM que determina, em suas normas, que eventual patrimônio líquido negativo do fundo gera obrigação de aporte pelo investidor.
limitou a exposição de prestadores de serviços ao restringir ao patrimônio do fundo a responsabilidade por suas obrigações, exceto no caso de dolo ou má-fé do prestador, permitir-se a previsão de responsabilidade limitada dos prestadores de serviço, perante o condomínio e entre si, sem presunção de solidariedade, com parâmetros de aferição da responsabilidade, e reconhecer-se a existência de riscos e o fato de que a obrigação do prestador é de meio.
Outra novidade é a autorização para segregarem-se parcelas do patrimônio por classe, conforme vir a determinar o respectivo regulamento, em sistema semelhante ao da companhia securitizadora das Leis Federais nº 9.514 e 11.076. Até então, o regime condominial do fundo, e a ausência de previsão legal, exigiam estruturas que não tinham o mesmo efeito da segregação patrimonial por força de lei. Por fim, a dispensa de registro em cartório do regulamento, substituído pelo seu envio à CVM, busca reduzir custos e prazos no início das atividades dos fundos.
A depender da regulamentação, esta segregação pode trazer eficiências e estruturas sofisticadas para atração de investimentos, principalmente se for permitida a ... Por Thiago Giantomassi - sócio de mercado de capitais e M&A, Demarest Advogados..Leia mais em estadão 27/122/2019
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