22 abril 2019

Após um ano, só 4 fintechs obtêm aval do BC para virar instituição financeira

A regulação do Banco Central para permitir a transformação de fintechs em instituições financeiras completa um ano neste mês com apenas quatro empresas enquadradas nas regras.

A aprovação mais recente foi divulgada na semana passada, da Mova, enquanto outras 14 estão com processo de abertura em tramitação no BC.

Com as regras, o regulador pretende aumentar a competição no mercado de crédito, controlado pelos cinco grandes bancos do país. A falta de concorrência é vista como uma das razões para os altos juros cobrados do consumidor.

Sem a migração, fintechs de crédito funcionam como correspondentes bancários e precisam de um banco para formalizar o empréstimo dentro do sistema financeiro, o que pode encarecer custos à medida que as operações crescem.

São duas regulações distintas: a SCD (Sociedade de Crédito Direto), que permite a fintechs emprestar dinheiro próprio, e a SEP (Sociedade e Empréstimo entre Pessoas), que regula o peer-to-peer lending, quando a instituição funciona como intermediária entre um credor e uma pessoa que precisa de um empréstimo.

Apesar da estrutura simplificada na comparação com a criação de um novo banco, as regras ainda são rígidas.

A primeira barreira de entrada é a exigência de R$ 1 milhão de patrimônio, o que significa que a empresa novata precisa manter parada parte dos recursos captados com investidores, em vez de dar outro destino, como conceder crédito.

Além disso, há exigências societárias e de regras de controle, para evitar possíveis danos ao sistema financeiro.

Na prática, o que aconteceu é que, das 4 primeiras aprovadas, 3 não estavam diretamente ligadas à ABCD (Associação Brasileira de Crédito Digital) e à ABFintechs (Associação Brasileira de Fintechs), duas entidades que serviram de ponte para a interlocução entre as fintechs e o BC durante a formulação das regras.

“O que gente observou foram empresas com porte maior e que queriam ser desbravadoras”, diz Rafael Pereira, presidente da ABCD (Associação Brasileira de Crédito Digital).

Para Guilherme Horn, conselheiro da ABFintechs (associação de fintechs), ao criar as novas regras, o BC não poderia dizer que seriam exclusivamente para fintechs.

“É uma nova modalidade de instituição financeira, há empresas que viram uma oportunidade de se enquadrar em regulamentações com menos requisitos do que uma instituição tradicional”, diz.

É o caso da QI Tech, que atuava no mercado de crédito havia mais de 15 anos. Com a nova regulação, a empresa viu uma oportunidade de negócio: em vez de contratar um banco que formalize o crédito, decidiu se credenciar no BC para, como fintech, prestar o serviço a outras instituições.

Os bancos que operam como formalizadores das concessões de crédito das fintechs são conhecidos como bancos de serviço (“bank as a service”, no jargão do setor) e operam de forma semelhante nos países desenvolvidos.

“O serviço é ruim, não tem tecnologia, o legado é antigo e voltado para causa própria, para a carteira de crédito do banco”, diz Beatriz Degani, presidente da QI Tech.

“A gente viu oportunidade maior em prover os serviços para outras fintechs ou varejistas online que querem viabilizar isso para eles”, acrescenta.

A QI Tech formalizou R$ 20 milhões em crédito desde março e espera terminar o ano com R$ 500 milhões.

Outra das desbravadoras é a Creditas, especializada em crédito com garantia. A fintech, vinculada à ABCD, entregou a documentação ao BC um mês após a publicação das novas regras.

“Quando a regulação saiu, a decisão já estava tomada”, diz Fabio Zveibil, da Creditas.

Apesar da autorização, a Creditas levará um tempo para começar a operar por meio da SCD (Sociedade de Crédito Direto, que permite a fintechs emprestar dinheiro próprio), pelo trabalho de integração com os sistemas de garantias de imóveis e veículos.

O motivo para a migração, diz Zveibil, não é tanto a economia de custos, mas a autonomia dos bancos para desenvolvimento de novos produtos financeiros.

“Mas há um custo inicial. Já ouvi caras muito pequenos perguntando como fazer [para migrar para SCD]. Faz muito sentido começar com o parceiro bancário”, afirma Zveibil, da Creditas.

Roberto Felipe Tesch, presidente e sócio fundador da Mova, traz o exemplo concreto da flexibilidade de se adequar às novas regras. A fintech recebeu autorização para ser uma SEP (Sociedade e Empréstimo entre Pessoas, que regula o peer-to-peer lending) e fará empréstimos a empresas e a pessoas que pretendem financiar cursos de pós-graduação.

Como o dinheiro do investidor precisa ser pulverizado para que um eventual calote não signifique a perda de todo o valor investido, era preciso gerar uma série de boletos para cada crédito. Isso encareceria o custo e dificultaria a operação.

Com a SEP, a empresa desenvolve a própria operação do zero, sem passar por um banco, apesar de ter como sócio o grupo Omni. Consegue emitir um único boleto de pagamento, concentrando o valor que foi pulverizado.

“Fica muito mais ágil e com uma estrutura enxuta, mas requer estrutura inicial e investimento”, afirma Tesch.

O sistema começará a ser testado entre junho e julho, quando a fintech fará os primeiros empréstimos.

Não existe um levantamento de quantas fintechs de crédito operam no país e que poderiam se transformar em instituições financeiras. A ABFintechs sugere cerca de cem, mas há nesse montante comparadores de taxas de juros e empresas que renegociam dívidas em atraso, por exemplo.

Para Larissa Arruy, sócia do Mattos Filho, essa diversidade de fintechs explica a relativa demora na aprovação do Banco Central.

Cada aprovação levou entre quatro e oito meses —o regulador tem obrigação de concluir a análise em até um ano.

“As fintechs têm naturezas diferentes. Umas oferecem crédito com garantia, outras são focadas em um público específico. Tudo isso influencia no tempo de análise.”

Ela acrescenta que principal tarefa das fintechs foi separar a parte que efetivamente é uma atividade financeira e que precisa ser submetida à regulação das outras atividades exercidas, como serviços de tecnologia.

“Quando há uma empresa que desenvolveu um software de análise de crédito, que ela também licencia para terceiros, esse software está fora da questão regulatória. Não necessariamente faz sentido trazer para atividade regulada”, exemplifica a advogada.

O Banco Central exigiu novo CNPJ das empresas para a instituição financeira, apartado do usado pela fintech inicialmente.

Pereira, da ABCD, diz ainda que deve demorar para a nova regulação trazer transformações para o mercado, pelo prazo de adaptação ao novo sistema e às novas regras.

“É todo um conjunto de ações que vem em direção das necessidades do mercado financeiro”, afirma, ao citar, além da regulação das fintechs, o cadastro positivo e o open banking.

O open banking assume que os dados pertencem ao cliente e, com autorização dele, podem transitar entre instituições financeiras.

O BC discute com o setor financeiro as regras para essa troca de informações, e a primeira etapa de regulação pode sair ainda neste ano. Fintechs que não forem instituições financeiras podem ficar de fora do sistema.

SAIBA MAIS SOBRE AS FINTECHS DE CRÉDITO

Novas regras
BC criou duas regras que permitem às novatas oferecer empréstimos:

1. SCD (Sociedade de Crédito Direto)
A fintech usa dinheiro próprio (captado com investidores, por exemplo) para emprestar a quem pede crédito; ela não pode pegar dinheiro de outros clientes, como fazem os bancos, para emprestar

2 . SEP (Sociedade e Empréstimo entre Pessoas)
Fintechs que funcionam como intermediárias entre investidores e pessoas que pedem crédito (peer-to-peer lending); cada investidor pode emprestar no máximo R$ 15 mil para um único tomador

Vantagens
Após um ano, só 4 fintechs obtêm aval do BC para virar instituição financeira Folhapress Leia mais em vitorianews22/04/2019


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