04 julho 2018

Governo dá aval a avanço do acordo entre Boeing e Embraer

Após meses de negociações, o governo federal deu aval ao prosseguimento do acordo entre a americana Boeing e a brasileira Embraer. As duas fabricantes de aviões irão formalizar nos próximos dias um memorando com os detalhes da criação de uma terceira empresa, que absorverá a linha de aviação regional da brasileira.

O controle da nova empresa será 80% americano, e 20%, brasileiro. Seu conselho terá presença de brasileiro. O negócio ainda não está certo. Terá de ser informado ao governo, que procederá auditorias que podem levar de três a quatro meses.

Depois, se o processo avançar, o Conselho de Administração da empresa precisa ser consultado, e pela presença da União nele com uma ação com direito a veto, haverá um mês pela deliberação final.

As negociações estão travadas, e houve o temor no governo de que as objeções colocadas impedissem o negócio e dessem ares ideológicos ao imbróglio. O próprio presidente Michel Temer já disse que não perderia a "Embraer nacional", e o presidenciável Ciro Gomes falou em "retoma-lá" caso fosse vendida.

Há muito de teatro, pois a maioria controle da Embraer está na mão de fundos estrangeiros. O que o governo tem é uma ação preferencial que lhe dá poder de vetar negócios, herança da privatização da ex-estatal em 1994.

Com o arranjo, segundo as contas das duas empresas, ficará resolvida a questão do financiamento da área de despesa --entrave central da discussão. O governo ficou satisfeito até aqui com os termos prévios apresentados, segundo a reportagem apurou. Ninguém, nem do lado estatal, nem das empresas, comenta o caso.

A nova empresa ficará com a divisão de aviação regional, nicho no qual a Embraer domina o mercado mundial. A Boeing está de olho na Embraer desde o ano passado, quando a sua rival europeia Airbus comprou a linha regional da maior adversária da Embraer, a canadense Bombardier.

Como também não tinha aviões menores no catálogo, modelos de 70 a 130 passageiros, a Boeing fez uma oferta para levar toda a Embraer no fim do ano passado. Coisa de mais de R$ 20 bilhões.

Além dos E2, linha pronta de nova geração regional (42% do lucro líquido), os americanos queriam a área de engenharia da brasileira, vista como dinâmica para fazer deslanchar projetos empacados em suas pranchetas. Só que a divisão militar da Embraer, responsável por apenas 15% de seu lucro líquido mas de grande importância estratégica, era um óbice óbvio por questões de soberania nacional.

O governo queria garantias sobre projetos estratégicos com a empresa --não só projetos militares, como o novo caça brasileiro feito em conjunto com os suecos da Saab, mas controle de tráfego aéreo e participação no submarino nuclear brasileiro.

A solução foi deixar a área militar, assim como a de serviços e a de aviação executiva (25% do lucro), no âmbito da "velha Embraer" 100% nacional.

O financiamento de pesquisa ainda está para ser detalhado, pois até aqui havia vasos comunicantes entre a área milimetra e a civil da empresa. Isso, até para não ferir normas da Organização Mundial do Comércio, precisa estar delimitado.

Também não se está claro como ficará a transfusão de fundos da nova empresa para a velha Embraer -se por divisão de resultados proporcionalmente à participação ou com algum outro mecanismo.

Para a Embraer, o negócio permitirá a integração de sua estrutura a uma das grandes cadeias globais de produção aeronáutica. A nova empresa poderá fornecer peças à matriz americana, e a velha Embraer teoricamente poderá usar a estrutura de vendas da Boeing em todo mundo. Com isso, terá maior facilidade para colocar produtos como o cargueiro militar KC-390 e o caça Super Tucano em mercados. A aviação executiva, ramo quase inexistente na Boeing, pode ser favorecida também.

Os críticos do acordo duvidam de tais benefícios. Para o governo, que desde o primeiro momento asseverou sua posição privilegiada para vetar o negócio, a questão da soberania na divisão de defesa era a única cláusula pétrea.

Como o caso já foi e voltou algumas vezes, e a politização do tema atingiu até discussões sobre privatizações no Supremo Tribunal Federal, cautela é recomendável sobre os próximos passos. - Folhapress Leia mais em Jornal do Comércio 04/07/2018 
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