11 junho 2018

Buffett e Dimon querem o fim do guidance trimestral

O foco no curto prazo está distorcendo o capitalismo

Warren Buffett e Jamie Dimon estão exortando os CEOs americanos a parar de oferecer um ‘guidance’ trimestral aos investidores, numa tentativa de reformar um mercado de capitais visto cada vez mais como curtoprazista.

Numa entrevista à CNBC que vai ao ar hoje cedo e num artigo de opinião no The Wall Street Journal, os dois anunciaram que o Business Roundtable — uma associação de quase 200 empresários da qual Dimon é chairman — concordou em apoiar as empresas que deixarem de oferecer projeções de curto prazo para seus resultados.

“Toda geração de americanos tem a responsabilidade de deixar uma sociedade mais forte e mais próspera do que aquela que encontrou. As maiores realizações dos EUA sempre derivaram de investimentos de longo prazo. Tanto na política nacional quanto nos negócios, uma estratégia eficaz de longo prazo impulsiona o crescimento econômico e a criação de empregos. Para as empresas de capital aberto, esses mesmos princípios são verdadeiros,” os dois dizem no artigo no Journal.

“Em nossa experiência, o guidance de resultados trimestral muitas vezes leva a um enfoque não saudável nos lucros de curto prazo, em detrimento da estratégia, do crescimento e da sustentabilidade de longo prazo.”

Dimon é o chairman e CEO do JP Morgan Chase; Buffett é chairman e CEO da Berkshire Hathaway.

O guidance consiste nas empresas estimarem o faturamento e o lucro para os analistas de mercado, que inserem a informação em seus modelos para chegar a recomendações de compra ou venda para os investidores.

Na entrevista à CNBC, que antecipou alguns trechos esta madrugada, Buffett disse que a prática “está enviando a mensagem errada”. “Quando as empresas passam a viver para atingir o guidance, elas fazem muitas coisas que vão contra os interesses de longo prazo dos acionistas.”

A distinção feita por Buffett não é banal, pois explicita uma tensão presente no dia-a-dia do mundo corporativo: as companhias são geridas para o investidor que entra e sai da ação, ou para o poupador de longo prazo, o fundo de pensão ou de previdência que carrega posições durante anos?


No artigo no Journal, eles escrevem: “As empresas frequentemente seguram os gastos com tecnologia, contratação, pesquisa e desenvolvimento para atingir as estimativas trimestrais que podem ser afetadas por fatores fora do controle da companhia, como flutuações nos preços das commodities, volatilidade no mercado de ações e até o clima.”

Buffett e Dimon trabalham no assunto há pelo menos dois anos, quando publicaram um conjunto de regras de governança voluntárias que foi endossado por mais de 12 CEOs. Um dos princípios era de que as empresas não deveriam se sentir obrigadas a dar o guidance trimestral.

Historicamente, o guidance é visto como uma forma das empresas gerenciarem as expectativas do mercado, prover mais transparência e reduzir a volatilidade de sua ação.

“Mas, num estudo de 2006, a McKinsey descobriu que o guidance trimestral não afeta os múltiplos de uma companhia nem reduz a volatilidade de sua ação,” disse a CNBC. “O único benefício significativo observado foi um aumento nos volumes de negociação, o que é bom para day traders mas não é útil para a maioria dos outros investidores.”

Pior: o estudo mostrou que o guidance toma um tempo precioso da administração e faz com que ela se concentre demais no curto prazo. Naquela época, segundo a CNBC, empresas como Coca-Cola, UPS e AT&T disseram que não dariam mais guidance trimestral.

Ainda no artigo para o Journal, Buffett e Dimon afirmam que a pressão curtoprazista do mercado contribuiu para o declínio no número de empresas listadas nos últimos 20 anos, ao alienar aquelas que têm uma visão de longo prazo.

Mas os dois deixaram claro de que cada empresa sabe o que funciona melhor para si.

“Nossa visão sobre as previsões trimestrais não devem ser interpretadas como uma oposição aos relatórios trimestrais e anuais. A transparência sobre os resultados financeiros e operacionais é um aspecto essencial do mercado de capitais dos EUA, e apoiamos a transparência com os acionistas a respeito das métricas financeiras e operacionais reais. … A comunicação clara dos objetivos estratégicos de uma empresa, juntamente com métricas que podem ser avaliadas ao longo do tempo, sempre será fundamental para os acionistas. Mas essas informações, que podem incluir desempenho operacional não-financeiro, devem ser fornecidas em um cronograma considerado apropriado às necessidades de cada empresa específica e de seus investidores, seja anual ou não.” Geraldo Samor Leia mais em braziljournal 07/06/2018

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