29 maio 2018

Percepção de risco aumenta e pressiona juro futuro e dólar

A fragilidade do governo Temer e os riscos fiscais decorrentes das concessões do Executivo aos caminhoneiros paralisados levaram a percepção de risco nos mercados de câmbio e juros a um patamar ainda mais alto. As taxas de juros negociadas na B3 tiveram uma nova rodada de forte alta, com os vencimentos mais longos acumulando já quase 200 pontos-base de elevação desde as mínimas do ano. E o dólar subiu 1,72%, a R$ 3,7281, na maior valorização desde dezembro do ano passado. Apenas ontem, a moeda devolveu quase toda a queda de 2,03% acumulada durante a semana passada.

A sensação no mercado é que o governo sai do episódio com ainda menos espaço para debater e articular qualquer medida no sentido de corrigir as contas públicas. Pior: o Executivo precisou fazer concessões na casa dos bilhões de reais para os caminhoneiros, ação que vai contra a necessidade de ajuste das contas públicas. Ainda que a reforma da Previdência seja esperada apenas para o ano que vem, a impressão é que o momento em que ela será trazida de volta ao debate está cada vez mais distante.

Italo Lombardi, estrategista sênior para mercados emergentes do Crédit Agricole em Nova York, diz que não é apenas o governo Temer que sai enfraquecido do episódio da paralisação dos caminhoneiros, mas toda a agenda econômica elogiada pelo mercado financeiro. Segundo ele, o aparente apoio popular à greve, que começou como uma demanda por redução dos preços do diesel, deteriora mais o sentimento porque endossa a falta de perspectiva de que candidaturas tidas como centristas - em tese favoráveis a uma política econômica mais liberal -- reajam.

"É uma agenda econômica que claramente a população está rechaçando. Não consigo ver nos partidos um vencedor claro. Mas consigo ver perdedores claros: o governo e sua agenda econômica." Em uma nova tentativa de acalmar os ânimos, o Banco Central informou que manterá neste fim de mês e também a partir do início de junho as ofertas de novos contratos de swap cambial. Ou seja, o BC continuará a prover dinheiro "novo" ao mercado. Serão ofertados hoje mais 15 mil contratos de swap cambial (US$ 750 milhões). "É o famoso enxugar gelo", diz um operador em tom cético.

Em nota em seu site, o BC reiterou que poderá revisar os lotes de ofertas líquidas de swaps e que "se reserva o direito de realizar atuações discricionárias". E além de garantir a oferta de recursos novos ao mercado, o BC se apressou para informar ao mercado que dará início já na próxima sexta-feira (1º de junho) às operações para rolagem de 175.230 contratos de Swap cambial vincendos em julho, o equivalente a mais de US$ 8,5 bilhões.

O recado reforçado do Banco Central veio no mesmo dia em que a atuação do Tesouro Nacional para dar saída aos investidores conseguiu no máximo limitar a piora dos preços no mercado de renda fixa. A instituição se dispôs a comprar até 1 milhão de Notas do Tesouro Nacional-Série F (NTN-F, prefixado de prazo mais longo). A adesão, entretanto, foi considerada baixa por alguns especialistas, já que o volume recomprado representou apenas 28,25% da oferta total.

"Por não termos visto um lote grande de oferta nem uma queda das taxas, o resultado do leilão não passa uma tranquilidade", diz Bruno Mota Gouvêa, diretor da Renascença. As intervenções do Tesouro prosseguem hoje e na quarta-feira.

"O principal impacto, na minha visão, é a sinalização ao mercado de que o Tesouro está disposto a prover liquidez mais cedo que muitos players esperavam", diz David Cohen, sócio-gestor da Paineiras Investimentos. "Para o médio prazo, porém, o que seguirá ditando o rumo das taxas longas é o cenário eleitoral cada vez mais incerto e o cenário externo que também não tem ajudado os emergentes", acrescenta.

E não se descarta a adoção de uma estratégia mais duradoura. Na avaliação do estrategista-chefe do Votorantim Asset Management, Marcos de Callis, uma interrupção prolongada dos leilões de venda de títulos públicos prefixados poderia abrir espaço para ajustes de oferta e demanda no mercado. "Não seria uma surpresa se, daqui até eleições, o Tesouro mudasse a política de gestão de dívida", diz.

De toda forma, o mercado preferiu correr para a compra de taxa, buscando proteção contra um cenário de juro ainda mais alto à frente. A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) com vencimento em janeiro de 2023 - um dos mais observados para avaliação de percepção de risco - chegou a bater 10,44% na máxima do dia, no maior patamar desde novembro do ano passado. Entre os vencimentos ainda mais longos, o DI para janeiro de 2029 foi a 11,62%, máxima desde dezembro de 2016.

Parte da pressão nos juros teve como argumento o movimento do câmbio. O real, de longe, foi a moeda de pior desempenho no dia entre as principais divisas. Enquanto a moeda brasileira perdeu 1,69%, a coroa sueca, segunda maior queda, tinha baixa de 0,6%. - Valor Econômico Jornalista: Lucas Hirata e José de Castro Leia mais em portal.newsnet 29/05/2018

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