20 setembro 2017

Bolsa a 100 mil pontos entra no radar

Mesmo depois de ter renovado a máxima histórica, os analistas de ações não só mantêm o otimismo com o desempenho da bolsa de valores como passaram a revisar seus cenários. Projeções colhidas junto a 11 instituições apontam para uma valorização média adicional de 5% até o fim deste ano, para cerca de 80 mil pontos. Para 2018, as estimativas chegam a superar 100 mil pontos.

As previsões estão baseadas na visão de que o lucro das empresas vai crescer no cenário de retomada gradual da economia e, principalmente, de queda do juro. Hoje, o mercado trabalha com uma taxa Selic de 7% até o fim de 2018.

O Bradesco BBI, que revisou no começo de setembro as projeções para o Ibovespa de 73 mil para 78 mil pontos neste ano, vê um crescimento de 24% no lucro das empresas do Ibovespa neste ano. Segundo André Carvalho, estrategista de ações para América Latina e chefe de análise de ações do banco, a redução dos juros vai acelerar a recuperação da demanda doméstica, com efeito sobre o resultado das empresas. "Esse cenário aumenta o apetite por ativos de risco", diz.

Os analistas da Itaú Asset Management ainda não revisaram suas estimativas para o Ibovespa, mas começam a considerar o efeito positivo que a queda de juros deve trazer para o desempenho das empresas, em maior grau do que a própria aceleração da atividade. Em relatório, a gestora diz que a queda de aproximadamente 7 pontos percentuais da Selic desde o início do ciclo de alívio monetário deve produzir um crescimento médio de 17% no lucro combinado das empresas que fazem parte do Ibovespa neste e no próximo ano.

Nas contas da Guide Investimentos, o Ibovespa tem potencial para encerrar o ano entre 82 mil e 85 mil pontos, e alcançar 100 mil pontos no fim de 2018. Segundo o economista Ignácio Crespo, o cálculo considera uma alta de 12% no lucro das companhias. Apesar de acreditar na valorização do Ibovespa, Crespo mantém recomendação neutra. "É possível que façamos um revisão em breve, recomendando adicionar mais risco às carteiras", diz.

A safra de balanços referentes ao segundo trimestre já trouxe bons indicadores, confirmando a leitura de que as empresas, assim como a economia, poderiam começar uma trajetória firme de recuperação. O estrategista da Itaú BBA, Luiz Cherman, observa que 41% das empresas acompanhadas pela instituição apresentaram resultados melhores que o esperado nesse período. Ele ainda não redefiniu as projeções para o Ibovespa, mas admite que os indicadores corroboram um cenário mais positivo. "Os dados econômicos domésticos têm mostrado sinal de recuperação, o que já levou à revisão para cima do PIB de 0,3% para 0,8%, puxado principalmente pelo setor de serviços, exportações e consumo mais forte", diz.

Embora o juro seja o elemento preponderante na reavaliação das estimativas para o Ibovespa, os analistas admitem que a expectativa melhor para a economia também tem influenciado positivamente o cenário para a bolsa. Segundo a última pesquisa Focus, a projeção de crescimento do PIB está em 0,6% neste ano e em 2,20% em 2018. Mas já há economistas com um cenário ainda mais otimista, de expansão perto de 3% para 2018, sustentado por surpresas positivas vindas de dados de varejo e produção industrial.

O estrategista da Eleven Research, Adeodato Volpi Netto, também enxerga na combinação entre queda estrutural de juros e retomada consistente da atividade um elemento benigno para o lucro das empresas. E destaca que o juro menor traz um benefício adicional à bolsa, que deve receber fluxo novo de recursos com a menor atratividade da renda fixa. "É o fim definitivo do paraíso da renda fixa", diz.

O sócio-gestor da Canepa Asset Management, Alexandre Póvoa, concorda que a posição técnica dos investidores locais - pessoas físicas e clientes institucionais -, é um elemento importante nesse ambiente positivo para a renda variável, uma vez que eles com uma exposição baixa em bolsa, o que ajuda muito no processo de alta das cotações. "No momento em que há expectativa de manutenção de juros baixos por um período mais longo e o retorno esperado para o mercado de juros e dólar ficam menores, cresce o fluxo potencial para a bolsa", diz.

Por ora, quem tem sustentado em grande parte a recuperação da bolsa é o investidor estrangeiro, ao ampliar consistentemente sua participação no mercado local como reflexo de um ambiente global muito favorável ao risco. Os não residentes respondem por mais de 50% das negociações no mercado de ações e desde o início do ano já colocaram R$ 14,28 bilhões na bolsa de valores. Com os juros baixos ao redor do mundo, os investidores procuram ativos que oferecem melhor potencial de retorno, caso da bolsa brasileira.

Vale observar que esse investidor olha para os preços das ações em dólar, que estão ainda longe de retomar os picos históricos. Quando o Ibovespa atingiu os 73.516 pontos, em maio de 2008, o valor em dólar era equivalente a cerca de 44 mil pontos. Hoje, está perto dos 24 mil pontos.

O ambiente político considerado menos adverso hoje é outro elemento favorável para a bolsa, uma vez que aumenta as chances de continuidade da agenda de reformas, avalia o estrategista da Garde Asset Management, Alexandre Lintz. A avaliação dos investidores é de que a nova denúncia da Procuradoria Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer não deve ser aceita pela Câmara dos Deputados, abrindo espaço para que a reforma da Previdência seja votada no mês que vem.

Para o economista da INVX Global, Eduardo Velho, há uma chance real de aprovação da reforma da Previdência ainda neste ano. "Nesse cenário de aprovação até dezembro, o Ibovespa atingiria 80.400 pontos. Na ausência dessa reforma, o índice ficaria em 78 mil pontos", diz.

Essa diferença pode ser explicada, entre outras razões, pelas expectativas sobre o rumo do juro. Sem uma reforma da Previdência, dizem analistas, a Selic pode voltar a subir mais rápida e intensamente a partir do fim de 2018, com efeito reverso sobre o mercado de ações.

Apesar de as condições macroeconômicas estarem melhorando, o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, chama atenção para a péssima situação fiscal do país e as enormes incertezas sobre o rumo da reforma da Previdência. Na visão dele, há uma torcida combinada com tolerância por parte dos investidores, que favorece o Ibovespa.

De todo modo, é o quadro político - e seus efeitos sobre o rumo das reformas estruturais - o principal risco para esse cenário mais positivo que está sendo traçado pelos analistas. A incerteza acerca da eleição nubla as projeções para a bolsa em 2018, na visão de Póvoa, da Canepa. Ele considera que só a partir de março ou abril será possível fazer uma estimativa mais consistente para o índice. "As eleições vão ditar as regras do mercado."

Outro elemento de incerteza vem de fora. Uma mudança nas condições de liquidez internacional ou o início de um conflito entre Estados Unidos e Coreia do Norte poderiam mudar a disposição dos investidores. Ontem, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pediu novas sanções à Coreia do Norte, em discurso na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).

São esses riscos que têm feito os investidores vez por outra embolsar os ganhos quando o Ibovespa anda mais um pouco. Desde que renovou o recorde histórico após de nove anos, na semana passada, o índice tem passado por momentos de realização de lucros. Depois de subir 0,31% na segunda-feira, o Ibovespa fechou ontem praticamente estável, a 75.974 pontos.  - Valor Econômico Leia mais em portal.newsnet 20/09/2017
 

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