A poucas horas de dar o início às apresentações a investidores, a abertura de capital da XP Investimentos enfrenta uma prova de fogo. Grupos preocupados com o avanço da plataforma de produtos de investimento lançaram os últimos esforços para interceptar a abertura de capital, ao manifestar interesse na aquisição do controle da empresa. Uma das propostas teria partido do Itaú Unibanco, segundo fontes. Um investidor estrangeiro também teria se interessado pela plataforma.
Até a noite de ontem, porém, os acionistas da XP sinalizavam a intenção de se manter firmes nos planos de abertura de capital. A empresa protocolou na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) seu pedido de oferta. Assim, com a largada do processo e o início do "road show", há pouco tempo para se levar negociações em banho-maria. "Uma aquisição não se fecha em uma semana", lembrou uma pessoa próxima da operação.
A expectativa é que a corretora seja avaliada entre R$ 12 bilhões e R$ 14 bilhões na oferta, que deve movimentar por volta de R$ 4 bilhões, segundo fontes de mercado. Nesse meio tempo, o Itaú teria feito uma proposta para comprar a companhia, mas a XP teria rejeitado ceder o controle. Procurados, a corretora e o banco não comentaram o assunto.
Uma negociação com uma instituição financeira traria uma série de implicações para o modelo pregado pela XP, que se apresenta aos investidores como uma alternativa livre de conflitos de interesse. Por isso as negociações em torno disso não seriam simples.
Os acionistas da XP hoje são um grupo de pessoas físicas liderado por Guilherme Benchimol, um dos fundadores e presidente da XP, além das gestoras General Atlantic, dos Estados Unidos, e da brasileira Dynamo.
Até por volta das 20h30 de ontem, executivos encarregados do processo de IPO ainda não sabiam qual transação - oferta de ações ou aquisição - venceria. Para eles, porém, se tornaria bastante difícil fazer uma apresentação a investidores no Brasil e no exterior com uma potencial compra também em curso.
Por isso alguns executivos avaliavam que uma definição por um tipo de negócio ou outro deveria ser feito antes de quinta-feira, data prevista para o começo das apresentações a potenciais compradores dos papéis. Por enquanto, a XP ainda está num processo inicial do IPO.
Com a promessa de conseguir aplicações mais rentáveis e com custos menores, as plataformas independentes de investimento como a XP têm avançado sobre um mercado dominado pelos grandes bancos de varejo. Nas palavras do presidente de uma grande instituição, o chamado "efeito XP", ou seja, a migração de recursos dos bancos para essas plataformas, é a maior preocupação dele no momento quando se fala em concorrência.
O Itaú é justamente quem tem se mostrado mais ativo na resposta à concorrência. O banco abriu recentemente a possibilidade de os clientes do segmento de alta renda (Personnalité) investirem em produtos de outras instituições, a exemplo do que fazem as plataformas independentes. Os demais bancos de varejo avaliam seguir na mesma direção ou pelo menos reforçar a prateleira de produtos de investimento com opções semelhantes às das plataformas.
Uma das ironias nesse processo é que os bancos indiretamente colaboraram para o crescimento da XP. Um dos produtos de investimento de maior sucesso na corretora são os CDBs de bancos de médio porte. Além da rentabilidade mais gorda, o grande atrativo é o baixo risco, graças à cobertura até R$ 250 mil do fundo garantidor de créditos (FGC), cujos recursos vêm principalmente dos grandes bancos.
Outra "isca" usada para atrair os clientes é o Tesouro Direto. As plataformas oferecem a possibilidade de investir em títulos do governo, com risco zero, e sem cobrança de taxas. Uma vez conquistado o investidor, as corretoras podem oferecer produtos com margens melhores, como CDBs e fundos.
A possibilidade de aplicar em produtos de outras gestoras, como a Verde Asset, de Luis Stuhlberger, ou a Gávea Investimentos, do ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga, também tem atraído os investidores. "O modelo da XP no fundo não é muito diferente de um banco, embora eles digam o contrário", diz o executivo de uma instituição. De fato, os bancos já possuem plataforma aberta, embora disponível apenas para os clientes mais endinheirados, do segmento private.
No Itaú, os clientes de alta renda (Personnalité) passaram a ter acesso a fundos de outras gestoras e até mesmo CDBs de outros bancos, mas em quantidade bem menor. As taxas são as mesmas cobradas pelo mesmo produto na XP, mas o acesso depende do valor que o cliente possui no banco - e na maioria das vezes maior que a aplicação mínima exigida pela concorrente.
Um dos desafios dos bancos ao ampliarem a oferta de produtos de terceiros é mostrar que estão dispostos a deixar parte do dinheiro na mesa para não perder tudo. Investimentos como o Tesouro Direto e títulos isentos de imposto de renda, como os certificados de recebíveis imobiliários (CDI) e do agronegócio (CRA), já estão disponíveis nas corretoras ligadas aos bancos. "Ainda somos muito conservadores em como fazer a oferta desses produtos", diz o diretor de um grande banco.
Sem a disposição de brigar por preços, os bancos procuram se valer do maior conhecimento da vida financeira do cliente como forma de evitar o "canto da sereia" das corretoras, segundo o diretor de uma instituição. Os gerentes têm sido orientados, por exemplo, a oferecer alternativas de aplicação quando houver recursos parados na conta.
Os bancos também têm intensificado o processo de segmentação dos clientes. O corte anterior, que era definido apenas pela renda, vem sendo aprimorado para antecipar quem está mais propenso a migrar seus investimentos. A abordagem é reforçada quando os sistemas identificam uma transferência efetiva para a concorrência.
Para ir além da mera discussão sobre taxas, os bancos também procuram vender o conceito de assessoria financeira. O Bradesco reforçou essa estrutura após a aquisição do HSBC Brasil, que contava com foco maior em clientes de alta renda. Com a queda da taxa de juros, a aposta é que a consultoria de investimentos ganhará mais importância. O banco não descarta vir a oferecer produtos de outras instituições em seu balcão, que já é feita para os clientes de alta renda, mas apenas em produtos de mercado de capitais.
O movimento de aquisição de corretoras independentes por bancos não é inédito. O maior negócio do tipo foi feito pelo próprio Bradesco, que pagou R$ 830 milhões pela corretora Agora, na época líder no mercado de ações para pessoas físicas, em 2008.- Valor Econômico Leia mais em portal.newsnet 10/05/2017
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