Depois da ofensiva no setor energético, com a compra de usinas hidrelétricas e a entrada no pré-sal, os chineses se preparam para estrear na área de rodovias. Eles estão em negociações adiantadas para adquirir a BR153, no trecho entre Anápolis (GO) e Palmas (TO), concedido à Galvão Engenharia e que jamais teve iniciadas as obras de duplicação.
Um desfecho do negócio pode ocorrer em 90 dias. Esse foi o prazo dado pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) para obter uma solução para as obras na rodovia. Em recuperação judicial e envolvida na Operação Lava-Jato, a Galvão arrematou a concessão da BR153 e assinou contrato em setembro de 2014, mas praticamente abandonou os canteiros no trecho privatizado.
A agência deu um ultimato à empreiteira, que terá que escolher entre a conclusão da primeira fase das obras e a venda do controle da concessão. A ANTT já emitiu um parecer, alertando para o risco elevado de insolvência da concessionária, sem caixa suficiente para arcar com suas obrigações contratuais. Uma reunião entre a Galvão, a agência e os investidores chineses estava prevista para a semana passada, mas foi cancelada. O contrato prevê investimentos de R$ 2,7 bilhões nos cinco primeiros anos período em que a rodovia deverá ser totalmente duplicada.
De acordo com fontes do governo e da iniciativa privada, os chineses também planejam entrar na disputa pela Rodovia do Frango, corredor logístico que atravessa uma região produtora de carnes no Paraná e em Santa Catarina. Esse trecho deveria ter sido leiloado no ano passado, mas esbarrou em questionamentos do Tribunal de Contas da União (TCU) e provavelmente será licitado no primeiro semestre.
O olhar mais atento de Pequim para as rodovias ocorre em função do atraso nos leilões de ferrovias. A estatal CRCC, sigla da China Railway Construction Company, firmou parceria com a Camargo Corrêa para disputar a Ferrovia de Integração do CentroOeste (Fico). O projeto liga os municípios de Campinorte (GO) e Lucas do Rio Verde (MT).
Sem perspectivas concretas de avanço na Fico, que nunca foi colocada em leilão, os chineses aproveitaram uma reunião recente com autoridades brasileiras para deixar claro que escolheram um novo alvo para entrar no segmento: a ferrovia Rio-Vitória.
Trata-se de um traçado de 577 quilômetros, orçado em mais de R$ 7 bilhões, conectando terminais portuários nas imediações das duas capitais. A China, no entanto, demonstrou preferência pelo modelo em que a estatal Valec adquire integralmente a futura capacidade de transporte da ferrovia e revende esse direito no mercado. Na prática, isso garante demanda aos investidores. Diante da resistência do mercado, o governo havia desistido desse modelo, mas nunca revogou os atos legais que o sustentavam.
Desde que a presidente Dilma Rousseff se reuniu, em maio do ano passado, com o primeiro-ministro chinês, Li Kiqiang, vários investimentos importantes foram anunciados pelos asiáticos. Em novembro, o grupo NHA oficializou a aquisição de 23,7% da companhia aérea Azul, em uma transação de R$ 1,7 bilhão.
Na mesma semana, a estatal China Three Gorges (CTG) protagonizou o leilão de hidrelétricas, ao arrematar as usinas de Jupiá e Ilha Solteira, ambas no Estado de São Paulo, por R$ 13,8 bilhões. Antes, a mesma empresa havia adquirido o controle das hidrelétricas de Salto (GO) e Garibaldi (SC), negócios que movimentaram cerca de R$ 1,75 bilhão.
Além da aquisição de ativos, a China tem demonstrado apetite pela área financeira.
Em 2014, os empréstimos chineses para a América Latina somaram US$ 22,1 bilhões, cifra superior à desembolsada por fontes "tradicionais", como Banco Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Para o Brasil, foram destinados US$ 8,6 bilhões naquele ano, segundo o centro de estudos Diálogo Interamericano, de Washington.
Entre as operações mais relevantes está a captação de US$ 7 bilhões pela Petrobras, que enfrenta dificuldade para acessar os demais mercados internacionais desde que perdeu o grau de investimento pela Moody's, no início de 2015. Uma parte da operação veio do Banco de Desenvolvimento da China (BDC), enquanto o restante ficou a cargo do Industrial and Commercial Bank of China Leasing (ICBC).
Embora a Petrobras não tenha divulgado os termos do acordo, a aproximação com a China resultou em aumento das exportações de petróleo do Brasil para o país asiático. Os desembarques do produto somaram US$ 4,1 bilhões em 2015, alta de 20% em relação ao exercício anterior. Com isso, os chineses desbancaram os Estados Unidos como principal destino do petróleo brasileiro.
Além da estatal, grupos privados também firmaram protocolos de entendimento para operações de crédito com bancos chineses, como a operadora de telefonia Oi (US$ 1,2 bilhão, com o BDC) e a Vale (US$ 3 bilhões, com o ICBC).
Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (IbreFGV), Lívio Ribeiro recomenda cautela com esses empréstimos. "Parece ótimo pedir dinheiro para a China, mas é importante saber qual é o retorno esperado, qual a contrapartida", diz. Os investidores do país só vão se interessar por obras em que a taxa de retorno seja alta e aí o potencial de atração de qualquer investidor é alto , ou na qual tenham alguma contrapartida, seja com uso de fornecedores chineses ou
venda de produtos, completa.
Ribeiro lembra que os financiamentos concedidos para a Argentina, por exemplo, estavam atrelados a algumas condições pré-estabelecidas, como a aquisição de produtos chineses. Por Daniel Rittner, Murillo Camarotto e Tainara Machado | De Brasília e São Paulo Fonte: Valor Econômico Leia mais em sinicon 12/01/2016
-
Nenhum comentário:
Postar um comentário