As oportunidades estão aí, mas as empresas interessadas em fazer algum movimento devem ser realistas
Não é segredo que o Brasil vem passando por tempos difíceis e que os investidores – com razão – consideram o país um ambiente de alto risco. Sabe-se também que o Investimento Estrangeiro Direto (IED) tem diminuído drasticamente. Por exemplo, de maio a junho deste ano, o IED caiu de US$ 6,6 bilhões para, aproximadamente, US$ 5,4 bilhões. Em apenas um mês, um decréscimo de mais de um bilhão de dólares.
As estatísticas sugerem que essa não é uma fase temporária – uma desaceleração cíclica –, que retornará ao normal em breve. Existem grandes impedimentos estruturais. O atual cenário regulatório do Brasil, por exemplo, fez com que o país ficasse menos atraente para o investimento estrangeiro. Este é o caso especialmente nas indústrias de extração, em específico o enorme e problemático segmento de oil & gas, que agora atravessa um grande escândalo envolvendo a Petrobras. Somado a isso, a atual crise política do país denota que a possibilidade de algum grande acordo para resolver os problemas fiscais e estruturais do Brasil está fora da pauta. Isso é especialmente verdadeiro agora que processos de Impeachment foram movidos pela Câmara dos Deputados contra a presidente Dilma Rousseff por, supostamente, maquiar as contas fiscais. Como consequência disso, a sustentabilidade da cultura, tanto governamental como empresarial do Brasil, está sendo questionada dentro e fora do País.
No entanto, dentro de todo este obscurantismo – e em parte devido a isso também – existe luz no final do túnel, e não é a luz de um trem descarrilando trazendo outras calamidades.
Na verdade, em muitas áreas, tornou-se mais rentável e menos dispendioso investir e conduzir negócios no Brasil. Em razão da atual turbulência econômica, ativos de potencial e alto valor e grandes oportunidades estão depreciadas, principalmente, se levarmos em consideração a desvalorização do real em relação ao dólar. Mesmo com a indústria de oil & gas em apuros, uma nova legislação foi introduzida alterando as regras de exploração do petróleo. Se aprovada, as novas regras tornarão o país mais atraente para empresas investirem na exploração das bacias marítimas nacionais. Empresas de private equity estão reservando capital para aquisições estratégicas em vários setores, como agricultura, educação, imobiliário, energia e tecnologia, incluindo a indústria de oil & gas.
As oportunidades estão aí, e alguns players já estão aproveitando essas chances. No entanto, as empresas interessadas em fazer algum movimento devem ser realistas. Precisam se certificar de que não estão comprando uma bomba-relógio que explodirá com as denúncias de corrupção, reestruturações forçadas e outras formas de disputa. Os investidores devem evitar ser sugados para dentro do turbilhão de dificuldades econômicas do Brasil para que possam, por meio dos desafios de médio prazo, emergir com retornos altos em longo prazo.
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Ao longo dos últimos anos, o Brasil foi abalado pela instabilidade social e pelos escândalos. As altas taxas de juros, em torno de 14,5%, combinadas à contínua queda dos preços mundiais do petróleo (em meados de julho deste ano, um barril de petróleo estava a US$ 54; no início de outubro, caiu para menos de US$ 45), fez com que o Brasil experimentasse o que só pode ser denominado, generosamente, como crescimento econômico medíocre. De acordo com o Banco Mundial, o crescimento da porcentagem do Produto Interno Bruto (PIB) caiu da alta de 7,6%, em 2010, para zero, em 2014, e agora segue em queda livre. O Banco Central do Brasil diz que o país está em recessão técnica, com dois trimestres de crescimento negativo, e a maioria dos economistas das principais instituições financeiras do Brasil espera um crescimento de menos de 1% em 2016. Em entrevista, Olivier Blanchard, Conselheiro Econômico e Diretor do Departamento de Pesquisa do Fundo Monetário Internacional (FMI), previu uma recessão significativa no Brasil, devido à “baixa na confiança dos negócios e do consumidor”. Em outubro, o FMI revisou sua perspectiva, projetando um encolhimento de 3% na economia este ano, e 1% em 2016.
Somando-se os problemas econômicos do País, a inflação subiu para 9,56% ao ano em agosto, e o desemprego aumentou para quase 7%, um aumento de 2,6% entre dezembro de 2014 e junho de 2015. E isso também deve aumentar no ano que vem.
E como se estas estatísticas não fossem ruins o suficiente, em setembro de 2015, a Standard & Poor’s rebaixou a classificação de crédito do Brasil. Espera-se que a Moody’s and Fitch siga o mesmo exemplo, o que significa que um número relevante de fundos de pensões (que exigem grau de classificação de investimento por duas agências) será obrigado a alienar.
Consequentemente, o índice de aprovação da presidente do Brasil, Dilma Rousseff, caiu para 8% no verão passado, quando os manifestantes - conscientes dos escândalos políticos e das dificuldades econômicas - encheram as ruas em todo o país.
No setor de oil & gas nacional (que representa 13% do PIB do país), o atual quadro regulatório torna difícil, para as empresas estrangeiras de petróleo e gás, o investimento na exploração e extração. A retirada de royalties pelo governo, a participação nos lucros e os impostos taxados fazem com que os investidores percebam que os riscos superam os benefícios num dos mais promissores países para extração de petróleo e gás. Além disso, segundo a legislação brasileira, a companhia petrolífera nacional é obrigada a manter uma participação mínima de 30% em todos os projetos de exploração do pré-sal. Isso criou um gargalo, já que a Petrobras tem graves restrições financeiras devido à investigação sobre as práticas de seus negócios. Com a empresa incapaz de atingir os requeridos 30%, a exploração acabou sendo severamente prejudicada. Dessa maneira, apesar das empresas estrangeiras continuarem tentando, elas estão cada vez reduzindo mais seus investimentos.
A tudo isso, soma-se o fato de que o Brasil é um dos dois únicos países do mundo produtores de petróleo (o outro é a Venezuela) que agora está produzindo menos do que há 10 anos.
Como consequência, a Petrobras está declaradamente colocando ativos avaliados em US$ 14 bilhões à venda. Sem dúvida, esses ativos serão vendidos a preços de liquidação.
Onde estão as oportunidades
De acordo com a Latin America Private Equity and Venture Capital Association, a companhia de investimentos Advent International, com sede em Boston, lançou um novo fundo com US$2 bilhões, com foco em aquisições e financiamentos de expansão, principalmente no Brasil, México e Argentina.
A Advent acredita e procura atingir setores que prometem alto crescimento: serviços financeiros, serviços aeroportuários, serviços de business e varejo e de bens de consumo.
E estes não são os únicos setores maduros para investimento no Brasil. Oportunidades atrativas residem também na agricultura, na educação, no setor imobiliário e de energia, apenas para citar alguns.
Agricultura
Desde o fim de 2014, o real passou a apresentar queda de mais de 40% em relação ao dólar americano. Sendo assim, as indústrias de exportação tornaram-se mais atraentes, especialmente as que não são de capital intensivo ou dependentes de importações. Assim se descreve a agricultura, onde as mercadorias brasileiras têm preços mais competitivos nos mercados mundiais. Não por acaso, o governo brasileiro dobrou seu compromisso com o setor agrícola, em reconhecimento das dificuldades no setor de oil & gas e manufatura. Em junho, foi introduzida uma legislação a fim de estimular o investimento estrangeiro em terras brasileiras. Ao lado disso, o governo brasileiro firmou um acordo com o governo dos Estados Unidos para exportações de carne.
Após uma reunião em junho entre o presidente Barack Obama e a presidente Dilma Rousseff, a Casa Branca divulgou detalhes de um acordo para a expansão na "negociação bilateral de carne". A negociação fez com que o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos alterasse uma regulamentação que proibia a importação de carne bovina fresca do Brasil. O Brasil é hoje o segundo maior exportador de carne bovina do mundo, depois da Índia (juntos, ambos os países representam 4% das exportações de carne bovina do mundo), e com a abertura do mercado nos EUA, a participação global do Brasil deve crescer.
Frente a outros indicadores econômicos mais atrasados, a safra nacional de 2015 deve ser 8,6% maior do que a de 2014, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Grãos como soja, milho e arroz devem registrar crescimento de 11,9%, 6,5% e 3,6%, respectivamente (a produção de café e feijão deverá diminuir). De acordo com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil já produz mais trigo do que a Rússia e a mesma quantidade de arroz que os Estados Unidos.
A agricultura tem sido especialmente importante para a economia brasileira, crescendo 1,8% ao ano, durante o segundo trimestre de 2015, mesmo quando toda a economia encolheu 2,6%. O investimento no setor agrícola está aumentando, e empresas de private equity estão desenvolvendo ofertas que incidem sobre os índices agropecuários brasileiros.
A demanda mundial por alimentos não vai encolher. É como Mark Twain, escritor e humorista norte-americano, há muito tempo aconselhou os investidores, "Comprem terras. Não há mais ninguém fazendo isso".
Educação
Em 2013, menos de 15% da população brasileira entre 18 e 24 anos estava matriculada em universidades. Nos Estados Unidos, o número era de 36%. A crescente classe média brasileira, devido ao aumento do acesso ao capital, está à procura de melhorar as oportunidades educacionais dos jovens. Em reconhecimento, o governo está incentivando o investimento no ensino privado, principalmente por empresas de private equity.
Em 2014, por exemplo, a Bozano Investimentos levantou US$ 309 milhões em investimentos com foco no setor de educação, com 40% dos fundos oriundos do conglomerado de mídia alemão, Bertelsmann. O portfólio de empresas de educação da Bozano inclui a Anima Educação (que gerencia escolas de nível superior) e várias startups. Um segundo fundo da Bozano e da Bertelsmann, no valor de US$ 38 milhões, tem como alvo o segmento de tecnologia educacional.
Em setembro de 2015, a Advent anunciou que estava trabalhando na consolidação do setor de ensino privado no Brasil, salientando que a indústria teve muitos ativos de qualidade à disposição, mesmo em meio a tempos econômicos difíceis.
O surgimento de uma nova classe média na última década também tem gerado demanda por serviços educacionais de baixo custo e a criação de incentivos do governo (como a bolsa Prouni e incentivos fiscais para as universidades com fins lucrativos). Isto tem beneficiado os investidores no segmento; no entanto, como muitas instituições de ensino tornaram-se fortemente dependentes de subsídios do governo, essas organizações continuam vulneráveis à mudanças regulatórias e possíveis cortes no orçamento.
É notório que o crescimento do ensino privado no Brasil não ocorre sem ressalvas. Assim como nos Estados Unidos, este tipo de educação muitas vezes deixa estudantes sobrecarregados com empréstimos a juros altíssimos. O setor de educação privada também levanta questões sobre igualdade de acesso e oportunidades em um país onde o ensino superior é gratuito para aqueles que podem passar em exames de admissão altamente competitivos. Além disso, muitas instituições de ensino privado estão sob investigação pública por práticas enganosas para aumento das taxas de inscrição ou pela baixa pontuação em classificações educacionais. Os investidores devem ter o cuidado de avaliar adequadamente a reputação local dos prestadores de ensino privado antes de fechar alguma parceria com eles.
Setor imobiliário
De acordo com o relatório de junho da Bloomberg Business, a gigante e multinacional de private equity e investimentos bancários, Blackstone Group, de Nova York, está à caça de investimentos imobiliários no Brasil. A Blackstone estabeleceu um fundo imobiliário global de US$ 15 bilhões, com sede em São Paulo, onde a quantidade de construções explodiu durante o período de expansão econômica do Brasil. Foram construídos mais de 7,5 milhões de metros quadrados de escritórios de alto padrão para locação, que agora estão vazios. Consequentemente, os valores caíram mais de 20% desde então e estão mais baratos.
Com sede em Toronto, a Brookfield Asset Management, com mais de US$ 200 bilhões sob sua gestão, está levantando US$ 1 bilhão em investimentos para o setor imobiliário brasileiro. Em setembro de 2014, a Brookfield adquiriu um edifício histórico no centro financeiro de São Paulo por US$ 312 milhões. A Brookfield também está planejando a compra de um portfólio de escritórios da BR Properties, uma das maiores empresas de imóveis comerciais do Brasil, por US$ 590 milhões.
A companhia reconhece que o mercado de imóveis comerciais no Brasil pode não melhorar em dois ou três anos, mas a estratégia da empresa é de longo prazo e disciplinada. "Estamos investindo grandes somas de capital [no Brasil]", disse Bruce Flatt, CEO da Brookfield. “Acredito que estamos adquirindo alguns ativos incríveis e que se tornarão investimentos grandes e valiosos no longo prazo".
Energia
Há apenas dois anos, a Agência Internacional de Energia informou que o Brasil poderia abastecer um terço das necessidades de petróleo do mundo até 2035.
Esse óleo ainda está aqui, esperando para ser extraído, refinado e colocado no mercado.
E, apesar dos enormes desafios enfrentados pelo setor de energia, o Royal Dutch Shell sinalizou um plano para investir US$ 5 bilhões em agosto, principalmente no Brasil, após a aquisição da BG Group, companhia petrolífera multinacional britânica. Isso representa uma forte demonstração de confiança no potencial da vasta bacia do pré-sal, uma confiança que pode ter sido sustentada pela recente legislação introduzida pelo ex-governador de São Paulo, alterando a regra que exige a contribuição de 30% destinada à Petrobras.
As empresas que alcançarem agora uma posição de destaque no setor energético do Brasil serão capazes de colher enormes recompensas no caminho.
Dito isto, a situação política e econômica no Brasil continua volátil. Muitas empresas estrangeiras já foram sugadas pelo escândalo da Petrobras, incluindo vários bancos suíços que as autoridades brasileiras, supostamente, usaram para a lavagem de subornos. Além das 23 empresas brasileiras de engenharia e construção envolvidas no escândalo, entre as empresas estrangeiras acusadas de suborno estão uma fabricante de automóveis e outra de aviões, ambas baseadas no Reino Unido, assim como um fornecedor holandês de navios de petróleo e uma lista enorme de outras mais.
Portanto, cabe aos investidores e empresas que procuram o Brasil agir com cautela.
Guia de precaução para investidores no Brasil
Uma das muitas razões pelas quais a Shell adquiriu a BG se deve à forte cultura de compliance e gestão de risco da empresa. Em outras palavras, a Shell foi capaz de adquirir uma empresa sólida a um preço baixo e receberá os benefícios assim que o Brasil retornar à normalidade. Isso pode ser um modelo a ser seguido pelos investidores cautelosos: investir em empresas com programas anticorrupção e de compliance, a fim de evitar que sejam sugados para dentro do redemoinho cada vez maior de investigações de corrupção do Brasil.
Assim, as empresas devem prestar muita atenção nas especificidades da Lei Anticorrupção do Brasil, promulgada em 2013, e nas suas diferenças em relação à Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), dos EUA, e à Lei de Suborno, do Reino Unido. Por exemplo, a FCPA exige intenção para a acusação. Já a Lei Anticorrupção brasileira não: o fato de que um suborno foi oferecido é suficiente para estabelecer a responsabilidade. Ao contrário da FCPA, a Lei Anticorrupção não impõe responsabilidade criminal; isso, no entanto, não significa que a lei não tem garras, já que ela pode mandatar sanções administrativas. Estas sanções podem impor uma multa de até 20% sobre os lucros de uma empresa por ano, antes da constatação de uma violação, e também podem incluir perda de bens, suspensão das operações do negócio e até mesmo dissolução compulsória da empresa.
Dada à gravidade destas sanções, as empresas devem estabelecer políticas fortes de compliance, apoiadas por uma equipe interna adequada de consultores locais, e todos os investidores devem utilizar os princípios de gestão de risco, alinhados com o ambiente político e social do Brasil. Isto significa que a gestão de riscos deve levar em consideração, de forma adequada, os fundos e as fontes, incluindo uma equipe local confiável, que esteja familiarizada com os costumes brasileiros, complementada por assessores jurídicos e de comunicação.
Por fim, as grandes empresas devem alavancar sua influência econômica a fim de impulsionar a mudança, se envolvendo no processo político, tanto em nível federal como local, tendo em mente que o lobbying ainda não é uma prática regulamentada no Brasil (a lei referente ao lobby está definhando no Congresso Nacional há mais de 20 anos). Como defendido pelo relatório da FTI Consulting, "O que as empresas fazem de certo (e errado) em mercados emergentes", as empresas de sucesso tentam ajudar os países a estabelecer um ambiente regulatório racional, que beneficie tanto os investidores como a economia local. Regulamentos racionais, economicamente benéficos para investidores e para a economia do país, e que evitem os caprichos das mudanças políticas.
Oportunidades no Brasil
Dizem que é sempre mais escuro um pouco antes do amanhecer. Agora, o Brasil está passando por este momento negro da sua história econômica. Mas a aurora virá.
É possível identificar os ativos problemáticos no Brasil – na agricultura, na educação, no ramo imobiliário, na energia e nos outros setores, como tecnologia – com forte potencial para bons retornos em médio e em longo prazo. Muitas dessas empresas devem ser capazes de resistir à tempestade a fim de emergir com um balanço positivo.
É fundamental, porém, que os investidores possam identificar as empresas saudáveis e que podem suportar as intensas pressões negativas e econômicas, bem como as incertezas políticas que serão inevitáveis nos próximos anos no Brasil. E os investidores inteligentes farão isso se baseando em uma abordagem de gestão de risco forte, para evitar que os problemas operacionais ou de reputação possam colocar em risco seus investimentos.
No longo prazo, o Brasil continuará a ser a maior economia da América Latina e uma geografia privilegiada para negócios. Sem dúvida, haverá mais dificuldades por vir, mas os investidores não devem subestimar a capacidade de resistência daquele que tem sido por muitas vezes chamado de "o País do futuro". Por Cynthia Catlett - Managing Director da FTI Consulting e Christopher DeSá -Senior Director da FTI Consulting. | Leia mais em Administradores.com, 22/12/2015
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