Os maiores fundos de pensão do Brasil devem ter participação menor nos futuros grandes projetos de infraestrutura do governo federal nos próximos anos, enquanto buscam reduzir a exposição do portfólio a ativos que consideram mais arriscados.
Forçados a assumir uma gestão mais conservadora, diante das perdas pesadas com ações e grandes projetos nos últimos anos, além do "envelhecimento" de suas maiores carteiras, os fundos estão encontrando nos juros altos um encaixe perfeito para acelerar a fatia de títulos públicos no portfólio.
O impulso recente nessa direção se deu com gestores das fundações centrando compras em ativos como NTN-B, papéis do governo federal vinculados à inflação.
Segundo a Associação Brasileira das Entidades Fechadas de Previdência Complementar (Abrapp), a fatia de renda fixa no patrimônio do setor subiu de 60,4 por cento no fim de 2013 para 65,9 por cento em junho último. Enquanto isso, a participação de ações caiu quase 6 pontos percentuais, a 23,4 por cento.
Já o montante dos chamados investimentos estruturados, que incluem projetos de infraestrutura, que vinha subindo sem parar desde 2010, teve um leve recuo no primeiro semestre deste ano e deve cair ainda mais.
O movimento liderado por Previ, Petros e Funcef, os três maiores fundos de pensão do país, vai na contramão do que deseja o governo federal, que tenta levá-los a participar de consórcios e forçar alguma concorrência nos futuros leilões de concessões públicas, incluindo logística e energia elétrica. Os três possuem em conjunto mais de 40 por cento dos 733 bilhões de reais em ativos do patrimônio do setor.
Desde 2012, ano do lançamento da primeira edição do Programa de Investimento em Logística (PIL), o Funcef vem reduzindo a aposta em projetos ligados à tese de crescimento econômico do país, incluindo os chamados fundos estruturados.
"Antes, entrávamos com 20 a 25 por cento dos fundos (de infraestrutura); agora não chegamos a 10 por cento", disse Maurício Marcellini Pereira, diretor de investimentos do Funcef, caixa de previdência dos empregados da Caixa Econômica Federal. "E a estratégia para os próximos anos é seguir ampliando a exposição a títulos públicos", disse Marcellini.
O Petros, dos funcionários da Petrobras, criou em abril uma gerência de gestão de risco e subiu a régua para análise de propostas de investimentos. Papel privado, agora só de empresa com rating doméstico pelo menos AA de agência internacional. Até semana passada, o fundo queria comprar debêntures da própria Petrobras, uma das poucas no país que teria esse tipo de nota, mas a operação foi suspensa pela estatal devido ao mau momento do mercado.
"Queremos muito menos risco de crédito e de mercado agora", disse o diretor de investimentos do Petros, Lício da Costa Raimundo. "A tendência é aumentar a fatia de título público."
Parte desse raciocínio é explicada pelo retorno previsto para os projetos, que na visão dos gestores não compensa a miríade de riscos, incluindo marco regulatório, ambiental e legal. Mesmo com ajustes para cima na segunda edição do PIL, neste ano, que prevê investimentos de 198,4 bilhões de reais, a rentabilidade oferecida a investidores para concessões como portos e aeroportos não supera 10 por cento.
É pouco, segundo os gestores, para justificar sair de um papel do governo, de risco muito inferior, que chega a pagar juro real entre 7 e 8 por cento atualmente.
A menor disposição das fundações para grandes projetos vem num cenário de economia em recessão - a previsão dos economistas é de queda de 3 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) em 2015 -, acesso mais difícil ao mercado de capitais e enrijecimento das condições para tomada de recursos subsidiados no BNDES.
PREVENIDO MORREU DE VELHO
Mas o conservadorismo das fundações também tem a ver com resultados negativos colhidos por eles nos últimos anos, como usina hidrelétrica de Belo Monte e a Sete Brasil. A construtora de sondas para Petrobras negocia com credores e acionistas para evitar um colapso financeiro. A Sete Brasil tem entre os sócios Previ, Funcef, Petros e Valia, enquanto Belo Monte recebeu investimentos do Petros e do Funcef.
Como consequência desse e de outros fatores, Funcef e Petros acumulavam somados um déficit superior a 11 bilhões de reais no final do ano passado. Com isso, o escrutínio dos cerca de 300 mil participantes desses dois fundos sobre os gestores cresceu.
"Os fundos precisam bater meta atuarial, o que alguns não conseguiram nos últimos anos, e o jeito mais óbvio de fazer isso agora é ir para papéis do governo", disse Guilherme Leão, diretor de Investimentos da Abrapp.
Mas mesmo fundos com performance comparativamente melhor, como o Previ, dos funcionários do Banco do Brasil, ou o Funcesp, de empregados da geradora de energia paulista Cesp e de mais nove empresas, prudência também [e a palavra de ordem.
Não bastassem o quadro político-econômico incerto do país, há outro fator que deve ampliar o descasamento de agendas das fundações e do governo nos próximos anos.
A maior parte dos recursos das fundações de estatais estão em planos de benefício definido cuja entrada de novos participantes foi fechada ao longo da década de 1990. No Previ, por exemplo, essa carteira tem cerca de 160 bilhões dos cerca de 170 bilhões de reais do patrimônio total.
Como a tendência ao longo do tempo é o volume de pagamentos a beneficiários superar o de novas contribuições, os gestores desses fundos vão tendo cada vez menos margem para aplicar em ativos de risco.
"Temos que respeitar a curva dos fundos", disse o presidente do Previ, Gueitiro Genso.
Com isso, a tendência é que o tamanho médio dos fundos de infraestrutura tenham portes menores, como já vêm acontecendo, disse Diogo Berger, diretor da área de project finance do Santander Brasil.
"A participação das fundações em project finance já vinha caindo nos últimos anos e diminuiu ainda mais", disse Berger.
O discurso de executivos do setor em relação à entrada em novos projetos, incluindo os de infraestrutura, tem ficado mais em linha com os de demais classes de investidores, como os estrangeiros.
"Os fundos precisam de estabilidade de regras", disse Leão, da Abrapp. "E temos um histórico recente de projetos que tiveram mudanças importantes e experiências negativas, que geram maior insegurança sobre novos investimentos." Por Aluísio Alves (Reuters) - Leia mais em Bol.Uol 19/10/2015
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