30 setembro 2015

Venda de ativos será maior desafio da CSN

A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), fabricante de aço e cimento e mineradora de ferro controlada pela família Steinbruch, vai enfrentar agora seu maior desafio: vender um pacote de ativos selecionados para abater parte de seu pesado endividamento. A busca de potenciais interessados ocorre no pior momento da indústria de commodities metálicas e minerais no mundo, muito dependente da China. O setor vive uma crise de demanda e preço que começa a afetar grandes corporações, como a Glencore, também muito endividada, Anglo­American e outras.

A CSN deu um passo importante neste mês ao conseguir alongar dois terços dos vencimentos de 2016 e 2017 com o Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal, em processo liderado pelo diretor Executivo Corporativo, Paulo Caffarelli. O mesmo deve ser feito com bancos privados para os 30% restantes da dívida de R$ 7 bilhões que vencerá nesses dois anos. A rolagem total, que inclui R$ 4,8 bilhões com BB e Caixa, corresponde a cerca de 30% do endividamento líquido.

A companhia ganha fôlego. Mas isso não basta, pois o problema da sua dívida foi jogado para a frente e ainda pode crescer, com o impacto do câmbio. O montante pode ir além dos R$ 32 bilhões do fim de junho. Subtraindo o caixa, na mesma data a dívida líquida é de R$ 21 bilhões. Os vencimentos adiados vão se concentrar, conforme acertos com os bancos, entre 2018 e 2022. E vão se somar a mais R$ 17 bilhões que vencem no mesmo período, até 2020.

O problema é que a geração de caixa da empresa entrou em rota de queda, pressionando sua dívida. Em 2014, foi de R$ 4,7 bilhões. Para este ano, no atual cenário, o resultado operacional medido pelo Ebitda é previsto em R$ 3,5 bilhões, ou menos, na avaliação de analistas.

Apenas com o serviço da dívida, a CSN paga aproximadamente R$ 2,7 bilhões ao ano. Ou seja, apenas esse quesito corrói 80% do Ebitda. Além disso, a empresa tem de arcar com investimentos correntes e nas operações industriais. Como consequência, vem queimando caixa aos poucos.

A deterioração da economia brasileira, com forte impacto sobre a demanda de aço no país, afetou as vendas da empresa para setores­chave da indústria, como automobilístico, máquinas equipamentos e bens de linha branca e para construção civil e infraestrutura. Isso obrigou a CSN a exportar 40% da produção, mas aí a margens é bem inferior às que obtém no Brasil.

Ao mesmo tempo, a desaceleração da China, maior importador de minério de ferro do mundo, jogou para baixo os preços dessa matéria­prima, segundo produto de importância na geração de receita da CSN. No período de um ano, o valor da tonelada saiu do patamar de US$ 130 para menos de US$ 50.
Atualmente está estacionado na faixa de US$ 56.

O mesmo câmbio que afeta a dívida, embora haja operações de hedge, ajuda na exportação do minério. Com dólar a R$ 4,10, traz ganho da ordem de US$ 25 por tonelada ao se comparar quando a moeda valia R$ 2,60 Mas com a alavancagem em alta e a redução da geração de caixa dos dois principais produtos, uma luz vermelha acendeu na sede da CSN, em São Paulo, no último trimestre de 2014. A situação financeira da empresa começou a gerar preocupações sobre seu futuro entre analistas e investidores em papéis da companhia.

A leitura do mercado é que Benjamin Steinbruch, que comanda a companhia, terá de abater no mínimo 20% da dívida bruta para deixar a alavancagem da siderúrgica em situação confortável.
Desde março, com a contratação de um executivo para comandar essa reestruturação ­ Caffarelli, ex­executivo do Banco do Brasil ­, a empresa pôs em campo uma estratégia com várias ações, algumas urgentes, e contratou quatro bancos para buscar compradores de ativos que estava disposta a vender.

O primeiro passo foi renegociar prazos da dívida dos próximos dois anos. Ela poderia ser uma fonte de alta pressão, oriunda de resultados que devem vir ruins com a atual crise do setor. Aço e minério de ferro são 87% da receita líquida da empresa e 82% do Ebitda.

O plano da CSN para atacar a alta alavancagem, que no fim de junho alcançou 5,61 vezes o Ebitda, está estruturado em quatro pilares: gestão do caixa, gestão do custo e capital de giro, alongamento da dívida com vencimentos em 2016 e 2017 e venda de ativos não estratégicos.

O alongamento já está praticamente feito. O outro ponto da agenda é a internação de recursos do caixa depositados em dólar no exterior. Já foram trazidos US$ 1,2 bilhão e a previsão é somar US$ 1,5 bilhão no caixa do país na forma de reais. Essa operação, com aplicação no mercado interno, à taxa Selic acima de 14% vai gerar, em valor anualizado, em torno de R$ 700 milhões de ganho financeiro, segundo explicou uma fonte ao Valor.

No quesito gestão do custo e capital de giro, com várias ações, como renegociação de contratos com centenas de fornecedores e de prazos de pagamentos com outros milhares, de 60 para 90 dias, a empresa espera uma economia de R$ 60 milhões por mês.

A empresa, com Steinbruch à frente do conselho de administração e da diretoria­executiva, tem emitido sinais de que não quer consumir caixa nesta hora de dificuldade, tampouco fazer novos empréstimos.

A avaliação é que agora não terá de sair correndo para vender ativos. Em momentos de crise e aperto financeiro de empresas, potenciais interessados costumam propor valores depreciados.

Isso pode dificultar a venda de ativos, uma vez que, na avaliação do mercado, Steinbruch não aceitará vender ativos, como o Tecon (operador de contêineres), por preço que considere abaixo do justo. Para analistas, o empresário não tem saída neste momento: terá que se desfazer de alguns ativos.

O mercado reconhece, todavia, que a CSN possui dois grandes atributos, um ponto positivo para o empresário. Um caixa robusto, que beirava R$ 9 bilhões (não consolidado) no fim de junho, e um amplo portfólio de bens, de onde alguns foram selecionados por não serem estratégicos ao negócio da siderúrgica. Nesse perfil encaixa­se o terminal de operação de contêineres, o Tecon Sepetiba, em Itaguaí (RJ), um elemento estranho às atividades da CSN.

O pacote de ativos oferecidos no mercado numa primeira fase ­ outros poderão ser adicionados no futuro ­ contempla, além do Tecon, participações em duas hidrelétricas (Itá, no Sul, e Igarapava, na divisa de Minas com São Paulo), o excedente de ações na ferrovia MRS Logística, na qual é uma das controladoras, e 17% no capital total da Usiminas.

Entre analistas, especialistas e agências de rating não há um consenso de quanto a CSN poderá captar com essas vendas. A agência de rating Fitch prevê que conseguirá apenas R$ 2,2 bilhões. Já o Bank of America Merril Lynch estima entre R$ 3 bilhões e R$ 5 bilhões. Conforme apurou o Valor.

Steinbruch não cogita receber menos de R$ 6 bilhões a R$ 6,5 bilhões por esses ativos. Os bancos Goldman Sachs, Bradesco, do Brasil e Credito Suisse, este último só para Usiminas, estão encarregados da missão.

Na visão do BTG Pactual, de acordo com relatório divulgado em agosto, para começar a equilibrar as contas a CSN precisaria vender ao menos R$ 5 bilhões, o que considera uma tarefa difícil.

O Tecon Sepetiba pode ser o primeiro ativo a ganhar novo dono. Ou um sócio que esteja disposto a ficar com 50% do negócio e dividir o controle com Steinbruch. As informações no mercado apontam mais de 20 interessados pelo terminal e uma negociação pode vir a ocorrer em seis meses a um ano.
As ações da Usiminas são vistas, à primeira vista, como as mais difíceis de se desfazer, devido à depreciação de papéis de siderúrgicas com o fraco mercado de aço no Brasil e mundo e pelo fato de não comporem o bloco de controle da rival. A aposta é que ganhem valor estratégico em decorrência da briga dos dois controladores da Usiminas, a japonesa Nippon Steel e a italiana Ternium ­ Techint, servindo como vantagem para um ou para outro numa decisão do impasse.

As ações excedentes da MRS Logística também podem encontrar uma certa dificuldade de atração de investidores, que, no caso, seriam financeiros. Os papéis a serem oferecidos, em torno de 20% (a CSN permanceria com cerca de 18%, sem perder sua condição de acionista do bloco de controle) não garantem direito de voto nas decisões estratégicas da ferrovia.

Já para as hidrelétricas não se vislumbra dificuldades, pois o setor, apesar de todos os problemas enfrentados desde 2012, volta a ser visto como atrativo por investidores. Trata­se de um gerador de receita bom baixa oscilação.

Steinbruch, desde 2002, quando assumiu a gestão direta da empresa com a saída de Maria Silvia Bastos Marques da presidência, comanda a CSN com rigor ­ acumulou desde lá as presidências do conselho e da diretoriaexecutiva e avalia cada detalhe em todas as áreas da empresa, principalmente o caixa. A situação atual da empresa, no entanto, conforme a avaliação do mercado, é fruto de algumas decisões equivocadas adotadas pelo empresário nos últimos anos e pela sua resiliência em adotar medidas rápidas para conter o avanço da alavancagem da empresa.

Uma das decisões criticadas é a aquisição de ações da Usiminas, num afã de tomar o controle da concorrente. Nessa operação, estima­se que queimou mais de R$ 3 bilhões do caixa. Esses papéis, sem nenhum poder de mando na Usiminas, a valor atual de mercado, valem menos de R$ 1 bilhão. A CSN também pagou gordos dividendos até 2014, o que beneficiou todos os acionistas: a família ficava com cerca de 50%.

Diante do agravamento da situação financeira da CSN, no começo do ano foram tomada várias medidas para trazer a empresa de volta ao eixo. Além de contratar Caffarelli, Steinbruch levou também o ex­ministro Ciro Gomes para destravar a construção da ferrovia Transnordestina ­ outra dor de cabeça da CSN ­, onde já aportou quase R$ 2,5 bilhões. O projeto, que se encontra empacado, depende da liberação de recursos federais para ganhar velocidade e ser concluído antes do fim da década, com quase 10 anos de atraso.

Outro ex­ministro, Pedro Brito, que comandou a Secretaria Especial de Portos, foi recrutado para reorganizar a operação do Tecon, visando a alienação do terminal portuário.

O novo foco de atuação da CSN, após a reestruturação e venda de ativos, será fabricar e distribuir aço, produzir cimento ­ negócio considerado de menor expressão pelo mercado ­ e mineração de ferro, usando sistema integrado de mina, ferrovia e porto.

Esse último negócio deve ganhar nova configuração com o plano de fusão em curso da mina Casa de Pedra, que é 100% da CSN, com a mineradora Namisa, cujo capital pertence 40% a sócios asiáticos. - Valor Econômico | Leia mais em portal.lacan 30/09/2015

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