As empresas brasileiras voltaram a buscar oportunidades de investimento fora do país no ano passado, após um 2012 em que as companhias nacionais praticamente estancaram o processo gradual de internacionalização observado nos anos anteriores. De acordo com dados do Banco Central, a saída líquida de recursos do Brasil para aquisição de participações no capital de empresas estrangeiras foi de US$ 14,8 bilhões no ano passado, quase o dobro dos US$ 7,6 bilhões de 2012, mas ainda inferior à média observada entre 2010 e 2011, de US$ 23,2 bilhões.
Como os investimentos ainda foram bastante concentrados em um único setor, o de serviços financeiros, com 47,7% do total, os economistas ouvidos pelo Valor afirmam que é cedo para avaliar se o maior ímpeto de internacionalização das companhias nacionais visto no ano passado vai se consolidar em 2014, mas afirmam que é natural que o país, em um período de crescimento doméstico morno e recuperação das principais economias do mundo, volte a olhar para ativos estrangeiros.
Para Antonio Corrêa de Lacerda, professor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), 2013 foi um ano em que os balanços das empresas melhoraram, o que pode ter ajudado a alavancar alguns negócios. "O fato de as empresas estarem mais solventes pode ter sido um fator motivador". A expectativa do BTG Pactual, por exemplo, é que o lucro das empresas listadas em bolsa tenha subido 14,1% no acumulado do ano passado, para R$ 157 bilhões, retomando algum fôlego depois do tombo de 18,8% nos ganhos em 2012.
Para Luis Afonso Lima, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e da Globalização Econômica (Sobeet), os dados mostram que os investimentos brasileiros no exterior voltaram a mostrar a tendência que havia sido observada nos últimos quatro anos.
No entanto, Lacerda, da PUC, observa que houve concentração relevante das operações realizadas em 2013. O setor financeiro, por exemplo, foi responsável por 47,7% das aquisições no ano passado, mais do que os 33,9% em 2012. Em sua avaliação, é possível que tenha havido movimento de antecipação de aquisições, já que a partir de meados do ano passado se consolidou a visão de que, com a perspectiva de início da retirada de estímulos pelo Federal Reserve (Fed, o Banco Central americano), a tendência para o real era de desvalorização em relação ao dólar. "Neste cenário, quanto antes o investimento é feito, mais vantajosas são as condições, o que pode ter movido algumas decisões", afirma Lacerda.
Uma pesquisa da KPMG também reforça a percepção de que o aumento de investimentos fora do país no ano passado foi bastante concentrado. De acordo com o levantamento, as transações envolvendo a internacionalização de empresas brasileiras repetiu o mesmo número observado em 2012, com 37 negócios fechados no ano passado. Luis Motta, sócio da KMPG no Brasil e líder para a área de fusões e aquisições, afirma que houve mudança de característica em 2013, com operações mais concentradas em menos ramos de atividade. O setor alimentício, por exemplo, foi responsável por oito das transações realizadas no ano passado, de acordo com o levantamento da consultoria. No setor financeiro, foram três negócios e em tecnologia da informação, mais quatro.
Apesar da estabilidade do número de transações, Motta não avalia que o número foi negativo, especialmente em um ano em que o total de operações de fusões e aquisições caiu 2,5%, para 816 negócios. Para o sócio da KPMG, esse é um possível indício de que o processo de internacionalização vai voltar a ganhar força, ainda que gradualmente. "As empresas começam a olhar oportunidades no exterior, especialmente diante de um cenário global mais favorável".
Caso a recuperação das principais economias desenvolvidas do país se concretize, afirma André Sacconato, diretor de pesquisa da Brain, associação privada que reúne bancos e entidades do mercado financeiro, "é razoável que a tendência de aumento dos investimentos brasileiros no exterior se consolide". No ano passado, por exemplo, a participação dos Estados Unidos entre os principais destinos do investimento brasileiro direto aumentou para 15,2%, em relação aos 13,4% registrados um ano antes.
As empresas domésticas também devem investir mais nos países andinos, como México, Chile, Peru e Colômbia, avalia Sacconato. Além da proximidade geográfica, esses países têm apresentado indicadores econômicos melhores do que os do Brasil. A expansão na América Latina tem sido particularmente forte no setor financeiro. O Itaú, por exemplo, adquiriu a operação de varejo do Citi no Uruguai, em uma operação que não teve valores revelados. Já o BTG Pactual montou do zero uma corretora no México, após ter comprado o chileno Celfin em 2012.
Mesmo a crise na Argentina pode abrir oportunidades para companhias brasileiras, na avaliação de Lacerda, professor da PUC. "É um mercado interessante e sobre o qual o empresário brasileiro tem maior familiaridade", afirma. No ano passado, por exemplo, a Braskem, maior produtora de resinas plásticas das Américas, adquiriu fatia majoritária da fabricante de PVC argentina Solvay Indupa, em um negócio que avaliou a Indupa em cerca de US$ 290 milhões.
No médio e longo prazos, afirma Lacerda, "não há dúvida de que cada vez mais as empresas nacionais vão buscar mercado externo, com ampliação ao acesso do mercado de capitais, até como forma de driblar barreiras tarifárias e não-tarifárias", afirma.
O saldo total de Investimentos Brasileiros no Exterior (IBD), no entanto, mostra que US$ 3,5 bilhões retornaram ao Brasil no ano passado, mais do que os US$ 2,8 bilhões de 2012. As saídas de recursos do país com o aumento das compras de participação de capital no exterior foram superadas pelo forte aumento dos empréstimos intercompanhia das filiais no exterior para as matrizes no Brasil. Entre 2012 e 2013, esses ingressos avançaram 76%, para US$ 18,3 bilhões no ano passado.
Afonso Lima, da Sobeet, nota que houve aumento não apenas das amortizações (na qual as filiais "quitam" empréstimos tomados com a matriz, uma operação mais tradicional), mas também, e principalmente, dos empréstimos das filiais para a sede no país. Para o presidente da Sobeet, o aumento atípico dessas operações, que passaram de US$ 14,1 bilhões para US$ 21,2 bilhões entre 2012 e 2013, responde ao mesmo estímulo que levou ao forte avanço dos empréstimos intercompanhia das multinacionais estrangeiras para as filiais no Brasil no ano passado.
Em junho, com o objetivo de atrair dólares para o país em um momento de perda de valor do real em relação ao dólar, o governo zerou a alíquota de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) sobre aplicações de investidores estrangeiros em renda fixa, que era de 6%. As empresas, diz Afonso Lima, aproveitaram esse momento para trazer recursos para o Brasil, o que não deve mais se repetir em 2014. (Com colaboração de Natalia Viri, de São Paulo) Por Tainara Machado | Valor Econômico
Fonte: resenhaeletronica 03/02/2014
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