Fechamento de capital ou redução de ações disponíveis para negociação em bolsa está no horizonte de diversas companhias do setor de saúde.
A possibilidade de fechamento de capital ou de redução da quantidade de ações disponíveis para negociação em bolsa está no horizonte de diversas companhias do setor de saúde. Nesse grupo estão, por motivos diferentes, Dasa, Fleury, Odontoprev, além de Cremer e Providência.
Duas empresas com hospitais e operadoras de planos de saúde já deixaram de ser uma opção para os investidores. A Medial, em 2009 comprada pela Amil. E a própria Amil, adquirida pela americana UnitedHealth em 2012.
Acredito que se trata mais de uma coincidência do que de algum problema entre os negócios do setor e o relacionamento com a bolsa, diz Pedro Zabeu, analista da Fator Corretora. Todas essas empresas têm escala suficiente para manter uma estrutura de governança de companhia aberta, o que, inclusive reduz custos para elas em termos de acesso a capitalizações.
No final do ano passado, médicos que concentram 41,2% do Fleury anunciaram a contratação do JP Morgan para avaliar a venda de sua participação. O bastidor é que eles estariam insatisfeitos com o preço atribuído pelo mercado à empresa e buscam, então, uma melhor opção para monetizar o investimento. Os médicos têm o controle do Fleury em acordo com o Bradesco Saúde, que possui 16,4%. Como a fatia dos médicos é bastante relevante, a entrada de um novo investidor, ainda que no acordo, levantará a discussão sobre a troca de controle na companhia. Nesse caso, o comprador deverá estender a oferta aos minoritários do Fleury. Isso poderia levar ao fechamento de capital ou fazer com que a quantidade de ações livre para negociação em bolsa (free float) seja bastante reduzida. Atualmente, 37,29% do capital do Fleury está em circulação.
Os comentários de mercado são de que alguns fundos de participações estariam disputando o Fleury e, inclusive, dispostos a pagar múltiplos bastante elevados, avaliando a rede a valor superior aos R$ 2,86 bilhões atuais em bolsa.
Uma fonte ouvida pelo Valor avalia que essa disposição dos interessados no Fleury foi o catalisador da oferta de Edson Bueno, criador da Amil, pelo controle da Dasa. Uma venda do Fleury a múltiplos elevados poderia transformar a Dasa em um novo alvo para investidores estratégico e a valores mais altos, alinhados com o da venda de seus concorrentes. A Dasa vale na bolsa hoje R$ 4,6 bilhões.
Bueno saiu com a oferta pelo controle da rede de laboratórios 20 dias depois de o Cade ter julgado a fusão entre a Dasa e a MD1 Diagnósticos - este é o veículo de investimento atual de Bueno na Dasa. Apenas depois desse julgamento ele poderia fazer uma movimentação e o fez quase que imediatamente. O empresário ofereceu R$ 15 por papel, mas encontrou resistência de alguns acionistas, que desejavam que ele pagasse mais pelo controle da empresa.
Bueno, então, retirou a condição de ficar com o controle da oferta e manteve o lance por todas as ações da empresa. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) chegou a suspender o leilão afirmando que ele não poderia retirar a condição. Nesta quarta-feira foi informado que chegaram a um entendimento. A CVM autorizou uma oferta unificada: se a adesão dos acionistas alcançar os 26,41% do capital da empresa mais uma ação, Bueno fará obrigatoriamente uma oferta pelo controle da Dasa. Se não atingir esse total, a oferta será sem um número mínimo de papéis. O leilão foi remarcado para 10 de fevereiro. Bueno já teve uma sinalização de que, aos R$ 15 oferecidos, pode elevar sua fatia na Dasa hoje em 23,5%, para 45%, retirando essa diferença em ações da livre circulação na bolsa, pelo menos.
São movimentos contrários. Os médicos querem vender as ações no Fleury para fazer dinheiro. E Bueno, que já tem liquidez por conta da venda da Amil, está querendo voltar a controlar uma empresa, diz Zabeu.
Para Gustavo Ballvé, sócio da Edge Investimentos, tanto Dasa quanto Fleury tiveram problemas na integração de diversas e grandes aquisições. Quando demora para reverter a situação, certo ou não, o mercado derruba a ação e os donos ou controladores se irritam com o esse 'curto-prazismo' dos investidores e até mesmo querem provar que o negócio vale mais, diz Ballvé. Na visão dele, esse foi o caso da Amil, vendida por Bueno a múltiplos bem altos a um investidor estratégico estrangeiro que pagou o prêmio para entrar no Brasil. Aparentemente Bueno e os médicos têm essa avaliação sobre Dasa e Fleury, afirma.
Um gestor ouvido pelo Valor e que prefere não se identificar avalia que os fundos estão olhando para o setor com grande apetite por conta das expectativas de elevado crescimento para essas empresas. A avaliação é baseada no incremento de renda e envelhecimento da população brasileira. No entanto, ele acredita que comandar um negócio como esse não é tarefa simples.
O negócio de laboratório é de muito difícil gestão. As margens são comprimidas, uma vez que ele fica espremido entre os planos de saúde e os fornecedores, que são grandes e concentrados em [poucas] empresas. Dessa forma, não conseguem repassar preços e têm que buscar melhorar as margens aumentando apenas a produtividade, diz. Nesse sentido, talvez um empresário do setor possa sair-se melhor do que um administrador mais financeiro.
Outro caso de apostas de fechamento de capital é o da OdontoPrev, ainda mais depois que o fundador Randal Zanetti, vendeu suas ações na empresa para a Bradesco Saúde, ano passado. Para analistas, faria muito sentido para o Bradesco incorporar a OdontoPrev a seu negócio.
A Odontoprev já esgotou o crescimento em planos para grandes empresas. O que deverá mover a expansão do negócio agora será a venda para empresas menores e planos individuais, afirma Zabeu, da Fator. Sendo assim, o Bradesco, com sua rede de agências, pode comandar esse crescimento. Por essa razão, teria uma justificativa para incorporar a empresa, avalia o analista completando que seria o mesmo racional do Itaú, quando deslistou a operadora de cartões Redecard.
Fernando Araujo, gestor da FCL Capital, diz que o movimento que pode reduzir as opções no setor para o investidor em bolsa, ao menos no curto prazo, tem menos relação com o setor de saúde em si e mais relação com o fato de a bolsa estar negociando a níveis bem depreciados.
Em períodos de mercado valorizado, muitas empresas correm para abrir o capital. Em períodos de baixa, como o atual, ocorre o contrário, resume. Mas os investidores gostam bastante do setor e ele conta com tendências positivas, pelo envelhecimento e enriquecimento da população, diz Araujo.
Pregão é porta de saída para fundos
As possibilidades de baixas no setor de saúde na bolsa não se limitam às grandes do segmento, que é representado hoje na bolsa por empresas que se dedicam a negócios diversos. Por razões distintas, a Cremer, fornecedora de produtos para cuidados com a saúde nas áreas de primeiros socorros, cirurgia, tratamento e higiene; e a Providência, fabricante de materiais usados na produção de fraldas e absorventes, também são candidatas a deixar o mercado. No entanto, analistas observam que, apesar do momento atual, existem boas perspectivas de que, no futuro, o segmento tenha até mesmo maior representatividade em bolsa.
Muitos fundos de participações investiram em saúde recentemente e podem usar a bolsa como porta de saída para o investimento, afirma Gustavo Ballvé, sócio da Edge Investimento s. E me surpreende o fato de no Brasil ainda não existir na bolsa um grupo privado operando uma rede de hospitais, diz.
A lista de empresas com participação de fundos é grande: o BTG investiu na Rede D 'Or; o Kinea, no Grupo Delfin, dono de uma rede de seis clínicas de medicina diagnóstica no Nordeste; o Pátria, na Alliar; e o Gávea, no Hermes Pardini.
Ballvé destaca que, no exterior, movimentos de deslistagem são comuns em qualquer setor e, muitas vezes, seguidos por uma volta ao mercado anos depois. Muitas vezes a administração busca essa solução, atraindo um novo investidor, e depois se espera entre 2 e 5 anos e a empresa volta a ser listada para dar saída para o fundo, se capitalizar ou pagar dívidas, diz. A lógica é que o mercado de ações acaba 'não deixando' os gestores ou os controladores tomarem as iniciativas que no curto prazo machucam os resultados, impactando as ações, mas que no longo 'endireitam' a empresa. Isso não é comum por aqui, mas um dia vai acontecer também , diz.
A Cremer, na verdade, já passou por esse procedimento. Ela abriu capital nos anos 70 e, entre 2003 e 2004, por conta de sua situação de endividamento, teve o controle transferido para Merrill Lynch. Por conta de uma reestruturação, fechou capital em 2004. Mas voltou à bolsa em 2007, no auge da onda de ofertas de ações no Brasil. Dois anos depois, a gestora de recursos Tarpon entrou para o controle da empresa, em movimento alinhado com outros fundos. No entanto, recentemente, a Tarpon aumentou fortemente sua posição na empresa e hoje concentra 72% da companhia, mas sem revelar qual a estratégia para o negócio. Outros 10,59% estão nas mão do M&G Investment Management e, no mercado para negociação, resta apenas 17,20% das ações. Pela grande concentração das ações com a Tarpon, um fechamento de capital também é ; uma possibilidade - embora na configuração atual, para lançar a operação, tenha de negociar com a M&G. A Tarpon também é acionista da Dasa e questionou o valor oferecido por Bueno pela empresa.
Fundos que são acionistas da Providência anunciaram esta semana que venderam participação conjunta de 71,25% na empresa por R$ 555,87 milhões, ou R$ 9,75 por ação, para o grupo PGI Brasil e haverá uma oferta para os minoritários. O negócio ainda depende da aprovação dos órgãos regulatórios, assim como o valor a ser pago por ser afetado por questões judiciais, referentes a benefícios fiscais de incorporação de ágio - enquanto não houver uma decisão sobre essa causa, R$ 106 milhões envolvidos na negociação ficarão bloqueados.
Pedro Zabeu, analista da Fator Corretora, comenta que esse valor representa R$ 1,87 por ação do total de R$ 9,75 oferecidos. Como essa questão pode se arrastar por anos na Justiça, e existe risco de a Providência perder a causa, acredito que exista a possibilidade de uma negociação com os minoritários para o pagamento de um valor menor, mas que os desvincule de esperar o julgamento da questão, afirma.
Enquanto novas empresas não vêm para a bolsa, ainda há opções de investimento como a Qualicorp, corretora e administradora de planos de saúde, que está valendo na bolsa R$ 5,5 bilhões. O investimento nessa empresa tem atraído grandes fundos como Credit Suisse, FMR, 3G e BlackRock. Uma outra opção está no segmento de farmácias. BR Pharma, Raia Drogasil e Profarma são englobadas no segmento por terem grande parte das receitas vinculada à venda de medicamentos. No entanto, esse negócio também tem muita proximidade com o das empresas de varejo, não sendo puramente atrelado à saúde.
No caso dessas empresas, comenta Zabeu, da Fator, é esperado até mesmo um movimento de consolidação. E o fato de estar na bolsa, poder ter acesso a capital mais barato e usar ações como moeda de negociação, pode fazer a diferenca.
Valor Econômico Por Ana Paula Ragazzi
Fonte: sindsegs 31/01/2014
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