25 fevereiro 2013

A CVC é obrigada a desviar de rota

Fundador volta ao comando da companhia em meio a esforço para organizar franquias

Beth, Adauto, José Carlos, Arley... É pelo primeiro nome que Guilherme Paulus, fundador da maior agência de turismo do País, a CVC, refere-se aos principais franqueados da marca. O executivo, que estava no conselho de administração desde que vendeu 70% da companhia ao fundo de private equity Carlyle, em 2010, voltou ao comando da empresa no início do mês. O motivo foi a saída repentina do presidente Xiko Lopes, que ficou pouco mais de um ano à frente do negócio. A familiaridade de Paulus com a rede de franqueados pode ajudar em um trabalho que a CVC está tendo dificuldade em terminar: a uniformização dos contratos com seus parceiros comerciais.

 Desde que assumiu a empresa, o Carlyle aplicou à CVC pílulas do receituário clássico do private equity: profissionalização da gestão, formalização de contratos, aceleração do crescimento e preparação para uma oferta pública de ações, que pode servir de porta de saída para o fundo recuperar os cerca de R$ 700 milhões que aplicou na companhia. No entanto, muitas das tentativas de dar um novo ritmo ao negócio esbarraram em dificuldades no ano passado, segundo fontes de mercado.

 Para começar, a entrada de Lopes, no início de 2012, foi marcada por uma debandada de executivos, alguns dos quais se abrigaram em concorrentes, como a rival Flytour. Acostumados a uma relação de camaradagem com os únicos dois presidentes que a CVC havia tido em 40 anos de história - Paulus e Valter Patriani -, a equipe se espantou com o estilo mais distante de Lopes, impressão que se espalhou para os franqueados, que sempre se consideraram "crias" do fundador, já que originalmente eram empregados da CVC. "Foi como se, de repente, tudo o que o Guilherme havia feito não valesse nada", diz um funcionário.

 Junto com os problemas de clima, os executivos tiveram de lidar também com um mercado de turismo mais fraco. O crescimento já não era o mesmo a que se estava historicamente acostumado no setor. A CVC, que vinha de expansões anuais de 10% a 15% na última década, viu o faturamento avançar 7% em 2012. A empresa foi afetada pela concorrência de agências online, como Viajanet e Decolar.com, e pelo aumento do endividamento da classe C. "O ano de 2013 também promete ser difícil - e vamos ter de nos adaptar", diz Paulus.

 O retorno do fundador à presidência, embora programado para não durar muito, é visto por fontes como uma forma de acalmar os ânimos dos funcionários. A longa relação de Paulus com os franqueados também deverá ajudar a acelerar o processo de organização das 742 lojas exclusivas da CVC. "Havia vários tipos de contrato, na minha época tudo era negociado no fio do bigode", lembra o fundador. "Agora, o contrato será padronizado, será um sistema de franquia." Paulus diz que a renegociação dos contratos está adiantada, mas define o processo como "difícil".

 Segundo fontes de mercado, a demora em concluir essas negociações teria motivado a saída de Lopes. "Não importa o que eles digam, foi esse problema com os franqueados que motivou a mudança", diz uma fonte do setor de turismo. No entanto, outra fonte da CVC contou ao Estado que o Carlyle foi pego de surpresa pelo pedido de demissão, apesar de o clima já não ser dos melhores. Procurado para comentar o assunto, o fundo não respondeu aos pedidos de entrevista da reportagem.

Criatividade.
Para compensar a desaceleração em seu crescimento, a CVC está apostando em novas opções de pacotes, incluindo a retomada de viagens rodoviárias. A companhia pretende montar pacotes ao redor do calendário de campeonatos de futebol, para transportar as torcidas organizadas. Além disso, prepara-se para um aumento do fluxo internacional de turistas, especialmente para Miami e Paris.

 No entanto, a expansão que antigamente era comum pode ser uma meta irreal para os dias atuais. "A tendência do setor é crescer menos. As famílias que compraram carro, geladeira e televisão estão endividadas e precisam cortar gastos em algum lugar", diz Leonel Rossi, vice-presidente da Associação Brasileira de Agências de Viagens (Abav). "Muitos vão deixar de viajar para pagar as contas."

 As agências online são outra pedra no sapato da CVC. No Brasil, esse mercado soma entre 8% e 10% da receita do setor de turismo, bem abaixo dos 40% a 45% dos Estados Unidos, afirma o fundador da Viajanet, Bob Rossato. Em 2009, ano de fundação da Viajanet, o site vendeu R$ 55 milhões. No ano passado, a receita foi de R$ 400 milhões. "A classe C já tem computador e sabe comprar online. É uma tendência irreversível", diz Rossato.

 Para Paulus, porém, o foco da CVC ainda é a rede de franquias - apesar da agência ter colocado no ar, em outubro, um novo site de vendas. "Nossa tradição é a venda de pacotes completos com serviço. Não podemos mudar do dia para a noite", diz. Franqueados como Beth, Adauto, José Carlos e Arley agradecem.
Fonte: estadao 25/02/2013

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