O cenário favorável às fusões e aquisições, moldado pela evolução positiva do Risco País na última década, e o consequente ingresso dos fundos de investimento em Private Equity, trazem uma nova realidade ao mercado de capitais brasileiros e, na garupa, uma pergunta que tem deixado os empresários em saias cada vez mais justas: quanto vale a sua empresa?
Para se chegar a uma resposta ao questionamento, afirmam os especialistas, é preciso tempo, paciência, conhecimentos técnicos e muito cuidado para não deixar de receber o retorno justo na hora de comprar ou vender. No entanto, o fato de se ter em mente o preço real do empreendimento pode se tornar uma potente ferramenta para gerar novos negócios e até mesmo alavancar as atividades existentes.
Na carona das circunstâncias, consultores, boutiques financeiras e empresas especializadas em avaliação se colocam no mercado com a intenção de atuar como mediadores nas duas pontas da cadeia. Buscam vendedores, de acordo com a demanda dos grandes fundos ou, do contrário, procuram por compradores para negócios dos mais variados segmentos e tamanhos. E são raros os casos de casos de sócios ou proprietários sem experiência em abertura de capital em bolsa que não se surpreendem com o resultado final do processo de precificação.
Em ação no segmento há pelo menos sete anos, o especialista em Direito Comercial, Tributário e Mercado Financeiro Rogério Sfoggia já liderou diversas operações nos mais variados portes e diz perceber a evolução das fusões e aquisições, principalmente a partir de 2010 e 2011, quando o superávit do fluxo de dólares no mercado brasileiro superou US$ 65 bilhões.
O movimento segue forte em 2012. Prova disso é que, no mês de maio, de acordo com um levantamento da PricewaterhouseCoopers (PwC), foram realizadas 86 transações, o maior número registrado desde dezembro de 2010 e o segundo melhor desempenho da história.
Ao todo, a soma projeta um total de 327 fusões e aquisições no ano, resultado que representa um índice 3% acima do que o do ano passado. Os dados ainda demostram que o Brasil mantém um perfil multisetorial. O campo de TI permanece como o alvo principal das empresas que realizam investimentos no País, com 43 operações realizadas. Em logística foram 35 transações, varejo 29, e, em serviços públicos, 27.
“Empresários que nunca passaram por um processo de fusão e aquisição, principalmente aqueles que montaram seus negócios e trabalharam neles a vida inteira, não fazem a menor ideia de quanto valem suas empresas. Isso porque desconhecem os critérios técnicos de uma avaliação. Existem metodologias que podem ser utilizadas para isso”, alerta Sfoggia.
Na opinião do consultor, a maior parte dos proprietários que não recebe aconselhamento profissional tende a acreditar que seus negócios têm uma avaliação inferior ao que realmente valem. Isso porque as fórmulas técnicas utilizadas no cálculo não consideram a má gestão e o endividamento. Muitas vezes, os dois fatores juntos são responsáveis por influenciar negativamente a rentabilidade. Entretanto, na aferição dos critérios, os fenômenos costumam ser tratados em separado. Por isso, os resultados de uma determinada empresa, que à primeira vista não parecem atrativos, podem significar apenas uma má gestão, ocasionada pela falta de profissionalização.
“Já presenciei casos em que o faturamento era de R$ 100 milhões, mas o lucro líquido era de apenas 1% em razão do nível elevado de endividamento e erros de gestão. Com um comprador profissional para precificar a empresa, não seriam levados em consideração esses fatores e outras variáveis capazes de justificar o desempenho”, explica. Com isso, a empresa pode valer muito mais do que o empresário imagina. Ou seja, por puro desconhecimento os empresários não se estruturam de uma maneira atrativa para os compradores.
Com base nisso, Sfoggia separa as transações em duas modalidades. As que seguem estritamente os critérios profissionais e ocorrem com um fundo de investimentos por trás, ou entre empresas sem gestão adequada. No segundo caso, é preciso estar atento para não perder dinheiro, pois o mais provável, segundo ele, é que haja supervalorização ou subvaloração.
Formação de preços
Dicas
Nunca negocie sem antes avaliar. Procure consultorias e empresas especializadas no assunto
- Comprar ou Vender O objetivo deve ser sempre calcular o preço justo e evitar perdas, independentemente do tamanho do negócio.
- Criar uma nova empresa O objetivo deve ser calcular o valor justo do projeto, comparando-o com os investimentos necessários. Se o valor justo é maior, o negócio será viável economicamente.
- Fusões e aquisições O objetivo deve ser calcular o novo valor da empresa modificada. Se superar o valor da soma da empresa antes da modificação mais o novo investimento, a viabilidade econômica será garantida.
Para obter o preço ou valor de uma empresa, é necessário projetar expectativas e cenários e escolher uma metodologia precisa. Existem várias no mercado e a de melhor resultado será aquela elaborada com base em padrões matemáticos, contáveis e financeiros.
- Métodos com base em dividendos pagos e crescimento histórico, muitas vezes, desconsideram fatores como vendas, custos, inflação esperada, juros do mercado e impostos.
- Índices de mercado como o Preço/Lucro (P/L), levam em conta dados do passado que podem não se repetir no futuro e relegam postulados financeiros e o equilíbrio contábil.
- Na Teoria de Opções o valor depende de eventos desconhecidos. O exemplo seria uma mineradora com custos de extração insuficientes para lucro, em razão dos preços internacionais do mineral ainda estarem baixos.
- O Fluxo de Caixa Descontado (FCD) aproxima os preços de mercado, com base na procura equilibrada pelo preço justo.
Antes de concretizar a opção pela compra ou venda e definição do preço final, a análise deve contemplar algumas etapas como:
- Calcular o investimento inicial
- Preparar a lista de premissas, a projeção de vendas, a de custos e a de despesas.
- Em seguida, é necessário calcular a projeção de financiamento, o retorno esperado, o retorno requerido e o retorno equilibrado.
- Estes fatores resultarão na definição do retorno justo, para, mais tarde, chegar ao valor justo esperado ou intrínseco da empresa.
- A avaliação entregue deve ser compreendida por qualquer financeiro no mundo, seja escandinavo, mexicano, africano ou japonês.
- Conferir para que em qualquer projeção de expectativas ou cenário escolhido, o balanço geral esteja equilibrado contabilmente.
- Conferir também para que em qualquer projeção de expectativas ou cenário escolhido, o demonstrativo do fluxo de caixa esteja equilibrado contabilmente.
- Valor Justo Esperado: é o valor pelo qual uma empresa poderia ser negociada em um mercado competitivo e aberto, ou em troca justa entre vendedor e comprador que se pressupõem conhecedores do negócio, sem que a transação possua caráter de urgência.
- Valor Intrínseco: é uma opinião de valor, produzida por um avaliador, analista, baseada na percepção das características inerentes ao investimento, sem tomar em consideração um investidor específico.
- Valor fundamental: é uma perspectiva utilizada no mercado de capitais em que o valor intrínseco da ação pode ser determinado por meio de uma avaliação rigorosa de variáveis como lucro, dividendos, estrutura financeira, qualidade da gestão e perspectivas de mercado.
- Valor para o investidor (investment value): Ao contrário dos conceitos anteriores, são consideradas variáveis específicas que dizem respeito ao investidor.
- Valor residual: É o valor da empresa no final do período de previsão discreta explícita.
- Valor contabilístico ajustado: É dado pelo valor contabilístico, após a adição ou subtração de valores ao ativo e ao passivo contabilístico da empresa.
- Valor substancial: Consiste na adição das estimativas de valor para cada item do património social da empresa, com base em critérios específicos como preços históricos e preços correntes.
Para evitar disparidades no momento de precificar os negócios, um dos aliados do mercado é o Ebitda (sigla para Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization). Em resumo, o dado é constituído de um valor de lucro que desconsidera os juros e impostos e serve de parâmetro para as negociações. De acordo com o momento, cada setor econômico possui um multiplicador base.
Companhias de construção civil são vendidas com preço fixado entre dez e 20 vezes o valor do Ebitida. As farmacêuticas entre sete e 15 vezes. Atualmente, também pode ser conhecido o patamar considerado positivo para uma empresa de varejo, por exemplo. Assim, qualquer desempenho abaixo do estabelecidos lançará luz sobre os problemas de gestão.
Companhias com capital aberto têm que disponibilizar essas informações em balanço. Mas, como a economia não gira apenas para as grandes, a sócia-executiva da ABC Capital Partner, Deia Gorayeb, que esteve à frente de operações recentes no Rio Grande do Sul, destaca a necessidade de análises profundas nas áreas de finanças, planejamento estratégico e comercial.
Segundo ela, ainda existe uma infinidade de grandes corporações na primeira ou segunda geração de administradores. Às vezes, isso ocasiona surpresas com o “apego” e a falta de modernização na gestão. “Muitos entendem que o valor do negócio, além do financeiro, teria algo de emocional, o que dificulta um pouco o trabalho”, revela.
Isso é perceptível, de acordo com Deia, no que tange ao valor pretendido para as marcas. “Para os empresários, a marca tem muito valor, mas para o mercado financeiro o verdadeiro valor está nos resultados que podem ser obtidos. Sem resultados não há valoração, e algumas pessoas ficam extremamente chateadas quando são confrontados com a realidade”, conta.
A situação contrária costuma ser menos usual e mais restrita ao universo nos negócios de menor porte. Neste caso, as autoavaliações são mais humildes e o preço real, muitas vezes, é motivo de espanto por superar todas as expectativas dos proprietários.
Avaliação é aliada contra crise financeira
A economia dinâmica, a competição acirrada e a conquista de novos mercados determinam que o cálculo justo do valor de uma empresa possa superar a própria necessidade da compra ou venda. Sob a ótica macroeconômica, as finanças corporativas dependem de dois aspectos: a rentabilidade e o risco. Com base nessa constatação, o especialista em finanças, consultor nas áreas de avaliação de empresas, projetos de engenharia, construção de fábricas e recuperação de empresas Isaac Hayon Sasson defende que quando se consegue chegar ao preço real de um empreendimento, é possível evitar “dois dos maiores males da humanidade”, as bolhas e as crises financeiras.
“Todas as crises - recentes ou históricas - foram originadas por bolhas, que nada mais são do que valorar algo de maneira equivocada. A mais recente, a do subprime, não é diferente, e papéis que valiam US$ 8,00 eram vendidos a US$ 40,00, em razão da confiança de que teriam um lastro que na verdade não existia. Em síntese, tudo está ligado ao valor que se dá a algo”, resume.
Para ele, o fato de submeter uma avaliação de preço à empresa resulta em um diagnóstico completo de todas as áreas envolvidas e também colabora na identificação de pontos prioritários para investimentos. “Se os empresários estiverem aptos a avaliar algo que produz renda, estarão com um enorme poder na mão. Pode ser uma máquina, uma pessoa, um atleta, por exemplo, um animal ou até mesmo uma fábrica. Qualquer coisa que produza um fluxo de caixa permite que se faça esta avaliação”, afirma.
Palestrante e ministrante de cursos sobre o assunto, Sasson ainda mantém um site com artigos direcionados ao esclarecimento do tema. Entretanto, na prática, diz ele, o valor de uma empresa está ligado de forma direta ao seu futuro. Em razão disso, explica que atualmente são aceitos três tipos de avaliações: O Fluxo de Caixa Descontado (FDC), que considera o valor do dinheiro no tempo, os índices de Preço e Lucro (P/L), que funcionam mais para a análise dos papéis vendidos em bolsa de valores, e a Teoria de Opções, que depende de eventos ainda desconhecidos. Por Rafael Vigna
Fonte: Jornal do Comércio 09/07/2012
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