Começou a ser arquitetada nos últimos dias uma operação de compra do Banco Cruzeiro do Sul pelo BTG Pactual. As conversas existentes não são conclusivas e não se pode afirmar que caminharão para uma aquisição, já que as dificuldades são grandes. Segundo pessoas a par do tema ouvidas pelo Valor, as tratativas são preliminares, mas podem evoluir rapidamente.
As conversas começaram entre o BTG, de André Esteves, e autoridades em Brasília, preocupadas com a evolução recente da liquidez e do capital do banco da família Indio da Costa. O caso vem sendo intensamente discutido nos últimos dias pelo Banco Central e pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC), que buscam uma saída negociada para o problema.
A aquisição poderia envolver o banco inteiro ou uma parte relevante do ativo, segundo uma fonte. BC e FGC já haviam buscado antes um interessado em assumir o Cruzeiro do Sul, até então sem sucesso.
O BTG foi também o banco que assumiu no ano passado o PanAmericano, então pertencente ao empresário Sílvio Santos, depois da descoberta de fraudes que levaram a instituição a um rombo patrimonial de R$ 4 bilhões. A operação foi costurada pelo Banco Central e pelo Fundo Garantidor de Créditos para evitar a liquidação do PanAmericano, sob o argumento de se evitar um problema sistêmico, com contágio de outras instituições de menor porte.
A aquisição ocorreu em condições bastante vantajosas para o BTG. As perdas patrimoniais foram cobertas pelo FGC, e o BTG assumiu o banco limpo das fraudes e com acesso a funding fornecido pela Caixa Econômica Federal, que já era sócia do PanAmericano.
Se as negociações para assumir o Cruzeiro prosperarem, o mais provável é que o BTG opte por fundir suas operações com as do PanAmericano.
A taxa de retorno dos bônus emitidos pelo Cruzeiro do Sul disparou desde o início de maio, indicando que os investidores passaram a enxergar maior risco na instituição. Embora o recrudescimento da crise na Europa tenha feito subir os retornos dos papéis de dívida de outros bancos brasileiros no exterior, a alta é bem mais acentuada no caso do Cruzeiro, cujos títulos se descolaram dos de seus pares, como o BMG (ver página C7).
Banco especializado em crédito consignado, aquele com desconto em folha de pagamento, o Cruzeiro do Sul vem sofrendo com dificuldade de funding desde a crise de 2008.
A venda de carteira para grandes bancos, uma das principais fontes de financiamento das instituições pequenas e médias, praticamente estancou, principalmente depois da quebra do PanAmericano, do Schahin e do Morada, no ano passado. Em novembro de 2011, diante de evidente dificuldade do Cruzeiro do Sul de se financiar no mercado, o Fundo Garantidor de Créditos estruturou um fundo de direitos creditórios (FIDC) bilionário para comprar ativos do banco e, assim, dar funding à instituição, conforme revelou o Valor na época.
Esse fundo já absorveu carteiras de crédito de R$ 4,2 bilhões do banco. Até agora, o FGC já adquiriu cotas do fundo no valor de R$ 651 milhões. O restante está nas mãos do próprio banco por enquanto. Está previsto que o FGC comprará mais R$ 851 milhões no segundo semestre e outros R$ 1,4 bilhão em 2013.
A venda dessas carteiras ao FIDC tem ajudado o resultado do banco, mas não foi suficiente para equacionar a situação.
O Cruzeiro do Sul levou ao limite o modelo de negócios estabelecido entre as instituições de menor porte de gerar créditos e vendê-los, como forma de obter funding para continuar girando a operação e liberar espaço em seus balanços. Quase a totalidade da carteira de créditos de R$ 7 bilhões está fora de seu balanço, vendida a fundos de direitos creditórios cujo cotista é a própria instituição. Sob marcação cerrada do Banco Central, que tem exigido que os bancos tratem da mesma maneira as carteiras que carregam em balanço e aquelas colocadas dentro de fundos de direitos creditórios, o Cruzeiro passou a constituir provisões para empréstimos em atraso também para as carteiras vendidas a esses fundos, o que pesou sobre seu resultado.
Há mais de dois anos o Cruzeiro do Sul está sob investigação do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários por conta das operações de venda de créditos para os fundos dos quais é cotista. O BC abriu um procedimento administrativo em janeiro de 2010 porque considerou que as taxas de desconto aplicadas nas cessões de carteira do banco aos fundos ficaram abaixo das praticadas no mercado. Isso quer dizer que as operações davam ganho adicional ao banco, que obtinha um preço melhor na venda dos ativos. Ainda em 2010, a CVM intimou a Cruzeiro do Sul DTVM a prestar informações sobre o mesmo assunto, na qualidade de administradora dos FIDCs. O processo envolve o banco da família Indio da Costa e também seus administradores.
O balanço do primeiro trimestre do banco recebeu ressalvas dos auditores independentes, da Ernst & Young, que consideraram que o prejuízo registrado, de R$ 57,8 milhões, ficou aquém do devido.
Depois da quebra do PanAmericano, o Banco Central deflagrou um pente fino nos bancos pequenos e médios. A inspeção resultou, por exemplo, na intervenção e posterior liquidação do Banco Morada, onde foram encontradas fraudes. Além disso, o BC apertou as exigências de constituição de provisões sobre a carteira de crédito e de classificação de risco das mesmas. Por Vanessa Adachi e Cristiano Romero
Fonte:Valor Econômico 31/05/2012
Nenhum comentário:
Postar um comentário