02 setembro 2011

Tributação: o fantasma ronda os distribuidores

Depois da Tech Data e seus problemas para conseguir se adaptar ao novo regime de ST (substituição tributária), investigamos junto aos canais de distribuição como eles estão trabalhando para minimizar o impacto dos tributos e como cada um resolveu seu problema e para nossa surpresa alguns nomes de peso no mercado não quiseram contribuir com a discussão da questão.

A pergunta que o mercado se faz nas últimas semanas é: como as questões tributárias, e mais notadamente a substituição tributária ou ST, tem afetado as distribuidoras de tecnologia? Esse questionamento surgiu depois que a Tech Data encolheu sua operação “devido as mudanças nas políticas fiscais do Brasil”, como ela indicou em seu comunicado ao mercado.

O tema é espinhoso. Tanto é verdade que algumas distribuidoras como Avnet, Alcateia, Afina e SND – esta última inclusive ao receber algumas perguntas por e-mail indicou por meio de sua assessoria que “os porta-vozes da empresa não têm disponibilidade para responder ao questionário, que está bem complexo na opinião deles”. Uma pena, mas outros executivos não declinaram de discutir o tema.

Primeiro é interessante situar que a ST é a forma pela qual se retêm de forma antecipada os valores de ICMS e que são englobados uma série de produtos, entre eles os eletrônicos e o de informática. Na prática, no lugar de uma cadeia de ICMS que deveria ser paga pelos diversos elos de vendas indiretas, o imposto é pago apenas em seu início por meio do agente da primeira compra.

Essa realidade gera por parte dos distribuidores uma série de críticas e mesmo uma posição da Abradisti no sentido de aliviar os problemas decorrentes da ST nesse elo da cadeia, o principal responsável pelo recolhimento do tributo – como já mostramos no Portal do Canal. E os valores dos produtos sofrem distorções de acordo com o estado no qual está o canal ou mesmo o cliente final.

O consultor Pedro Luiz Roccato na época da entrada da ST em vigor apontou que o modelo de tributação não teve um tempo hábil para sua implementação junto aos distribuidores. “Principalmente devido à complexidade das mudanças exigidas nos sistemas de gestão (ERP) e processos de vendas, base de cálculo, recolhimentos, etc. A situação foi agravada ainda mais porque muitos apostaram que a data de entrada em vigor seria postergada, o que não aconteceu”, explicou.

Local ou geral?

No entanto, como explica Francisco Gandin, diretor executivo da ApliDigital, a ST afeta quem está localizado em São Paulo, como a distribuidora que ele comanda. “Temos uma carga de tributos que nem sempre é repassada para os clientes, se o estado não tem o regime de ST a ST fica aqui, em São Paulo. E quando um distribuidor está localizado aonde não tem ST e vende para um lugar que não tem, não acontece nada”, ensina.

Em São Paulo, a empresa que está aqui recolhe o imposto local, de 18%, e ao vender para um estado com alíquota menor a diferença fica como um crédito para a companhia. O problema é que muitas vezes esse crédito fica numa espécie de “limbo”. “Acabamos não conseguindo trocar o crédito de forma estruturada, ele se acumula e tem uma baixa utilização. Isso acaba por onerar o produto, que é algo que a lei não objetivava. O crédito acaba sendo utilizado de forma lenta de acordo com o volume que temos, principalmente no fluxo de caixa. Os fabricantes estão assumindo esse credito. É um assunto urgente e importante”, completa Fábio Gaia, presidente da Officer.

A formulação da ST também é criticada por Luis Claudio Carvalho, diretor de operações do Westcon Group. “Sempre que algo novo surge no horizonte, gasta-se muito tempo e dinheiro para moldar o negócio à nova realidade. É preciso entender as novas regras e adaptá-las aos nossos processos. É preciso ainda um bom tempo até que toda a cadeia de distribuição absorva esse entendimento. Para se ter uma ideia, mesmo passado algum tempo de implementação da ST, até hoje algumas empresas do setor ainda estão desinformadas e confusas. Para piorar, quando achamos que finalmente estamos atualizados, uma nova lei surge e muda tudo”, aponta.

A saída, no caso da Westcon, é contar com apoio de um grupo interno, de consultorias e advogados externos especializados nessa área. “Procuramos assim nos adaptar o mais rapidamente a qualquer mudança, tentando oferecer opções que causem o menor impacto para nossos clientes. Além disso, temos um investimento pesado em desenvolvimento de sistemas para que essas novas regras sejam implementadas de forma ágil”, assegura.
O pior é que, quando um distribuidor sai de São Paulo, a revenda paulista passa a ser responsável pela ST. Nesse caso, a revenda tem que pagar o tributo antecipadamente a venda e isso afeta o fluxo de caixa dos canais.

Tempo é dinheiro, mesmo

Já a ApliDigital, que admite que precisou de algum tempo para se adaptar às novas regras. “Tivemos que entender o novo cenário e adaptar todos os sistemas de gestão e de vendas da empresa. Sem contar com o treinamento interno e mesmo externo para os canais, pois a grande maioria não tinha conhecimento dessas regras”, relembra Gandin, que revela assumir todo o gasto com ST, até mesmo o que poderia incidir no canal.

Ninguém, no entanto, quis comentar o efeito negativo ou mesmo os problemas de gestão da Tech Data. E mesmo para aqueles que se adaptam às regras, de tempos em tempos, é preciso se atualizar quando uma nova lista de itens e convênios entre estados é divulgada. Ou seja, o trabalho não cessa.

Saídas como a abrir filiais ou escritórios remotos para “driblar” a ST não são vistas como uma boa opção. Afinal, o custo de abertura e manutenção dessas operações pode ser tão ou mais elevada que o imposto em si. O ideal, mesmo, seria se a guerra dos estados por tributos cessasse ou fosse extinta com leis de unificação ou de restrição a criação de tributos, como acontece hoje. “Nessa batalha, com a ST, o estado paulista tem tomado ações que tem expulsado as empresas daqui, porque elas deixaram de ser competitivas”, critica Gandin.

A questão é que uma reforma fiscal que filtrasse e resolvesse essa guerra ainda é apenas algo distante. Mas não é só isso. “A questão não é apenas homogeneizar a cobrança de impostos entre os estados, mas também criar um ambiente no qual os tributos sejam cobrados de forma coerente, sem asfixiar ninguém, especialmente o consumidor final que paga a conta. Para nós, que somos uma empresa global com presença em todos os continentes e grandes mercados mundiais, chega a ser engraçado, e ao mesmo tempo triste, ver a reação de espanto e horror de nossos colegas de outros países ao tentarmos explicar a complexidade do sistema tributário brasileiro”, admite Carvalho, que se diz cético quanto a uma resolução no curto ou médio prazo.

Será que veremos outras distribuidoras, como a Tech Data, sofrendo na carne e sangrando em público por conta de questões tributárias? O tempo dirá...
Fonte:portaldocanal31/08/2011

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