20 janeiro 2014

Entenda os planos da Linx após IPO que captou R$ 528 milhões

 Desse total, companhia terá R$ 250 milhões para canalizar em movimentos de consolidação do mercado de tecnologias para o varejo. Movimento reabre interesse das organizações brasileiras na bolsa de valores

O mercado de capitais passou por um longo período de seca. O interesse das empresas (não apenas as de TI) em terem suas ações listadas na bolsa de valores minguou no pós-crise de 2008. Mas os ventos talvez tenham começado a mudar quando, em fevereiro, a Linx resolveu fazer sua oferta pública de ações (IPO, na sigla em inglês), em operação que captou R$ 528 milhões. Aparentemente, o movimento despertou o interesse de outros players nacionais.

 Na entrevista a seguir, Alberto Menache, diretor-presidente da fabricante de tecnologia para varejo, conta o processo de preparação para a abertura de capital e os rumos que a companhia deve seguir a partir de agora.

 “Para nós, não era uma questão do momento estar bom ou ruim. A decisão foi muito mais tomada em função de a Linx estar ou não pronta”, comenta o executivo, para adicionar: “Sempre tem comprador para coisa boa”. O IPO injetou nos cofres da companhia aproximadamente R$ 250 milhões para alavancar uma estratégia de crescimento inorgânico e consolidação de mercado.

 CRN Brasil – Como você avalia o atual momento da Linx? 
 Alberto Menache – Estamos crescendo de maneira consistente, com um modelo de negócios muito resiliente. Como grande parte de nossa receita está baseada em contratos de manutenção de software, dificilmente sentimos muito a crise. O que pode acontecer é que se o Brasil estivesse crescendo muito mais, talvez a gente crescesse um pouco mais. Tem situações onde o mercado continua muito pouco penetrado, com oportunidades para crescer no contexto atual. Varejo segue forte e tivemos um ano muito bom também por causa do IPO. Ficamos capitalizados e fizemos aquisições. Conseguimos uma boa publicidade também e o fator credibilidade em nosso negócio é muito importante. Da mesma forma que você não põe dinheiro em um banco no qual não confia, também não compra software de uma empresa na qual não confia, principalmente um sistema de gestão. Isso nos deu mais uma chancela no sentido de reforçar ainda mais a confiança dos nossos clientes.

 CRN Brasil – Por que optaram pelo IPO e como chegaram à conclusão de que era o momento de abrir o capital? 
 Menache – Basicamente, captamos dinheiro para mais aquisições. Tínhamos feito 11 aquisições antes do IPO e queríamos continuar nesse processo. Achávamos que tínhamos uma boa competência para isso. A empresa não precisava de dinheiro, mas fizemos uma operação que captou R$ 528 milhões. Desse total, 65% foi para o caixa da companhia, sendo o restante relativo à venda de participação de alguns acionistas, principalmente o BNDES. Do que sobra, tirando a comissão dos bancos, são R$ 310 milhões. Então, de acordo com nossa estratégia e o prospecto do IPO, 80% desses R$ 310 milhões serão destinados ao crescimento inorgânico, o que dá, a grosso modo, aproximadamente R$ 250 milhões.

CRN Brasil – Mas, então, quando foi o estalo do “agora é a hora”? 
 Menache – Bancos ganham muito dinheiro fazendo IPOs. É uma operação extremamente lucrativa para eles, que estão sempre de olho em empresas que estão mais ou menos prontas pra uma abertura de capital. Para você ter uma ideia, a comissão dos bancos no nosso processo, se somada, passou dos R$ 20 milhões. Enfim, lá por 2010/2011, haviam muitos bancos que já queriam que partíssemos para um projeto como esse. Mas nós já sabíamos, e agora está o cerne da sua pergunta, que não estávamos prontos e que tínhamos que amadurecer mais antes de dar esse passo. Então, conseguimos trazer um private equity americano, que é a General Atlantic, para nosso capital. Antes disso já tinha entrado o BNDES. Aí caminhamos mais, organizamos melhor a empresa, nos desfizemos de algumas coisas e fechamos unidades que estavam fora de nossa estratégia. Só quando sentimos que estávamos prontos partimos para o IPO. Para nós, não era uma questão do momento estar bom ou ruim. A decisão foi muito mais tomada em função de a Linx estar ou não pronta.

 CRN Brasil – O mercado sempre fala muito em ‘janelas’. Parece com saltar de asa delta: aquele momento que o vento sopra a favor, o sol brilha no mar, tudo muito perfeito. No caso de vocês, foi então uma questão interna. 
 Menache – Exatamente. É claro que tem momentos mais ou menos favoráveis, mas sempre tem comprador para coisa boa. Um negócio que me deixou muito impressionado nessa história toda foi o tanto de dinheiro disponível na mão de gente que quer investir em alguma coisa. São números impressionantes. Quando falamos com gestores, um faz a gestão de US$ 1 bilhão, outro faz a gestão de US$ 10 bilhões e outro faz de US$ 100 bilhões. Teve um que me falou que tinha sob gestão US$ 1 trilhão. Por isso a questão de se estar pronto é que precisa estar resolvida. O dinheiro está lá para ser investido e esses dados são públicos, é só ir atrás para confirmar que ele realmente existe.

 CRN Brasil – O que é esse estar pronto? 
 Menache – Ter um bom negócio, ter um negócio previsível, falar a verdade e entregar aquilo que você se comprometeu a fazer. 

CRN Brasil – O que muda na rotina de uma empresa de capital aberto? 
 Menache – Vou te dizer o seguinte, uma empresa que não tenha se preparado como nós nos preparamos, quando abre o capital e depois vai ver o que aconteceu, verá que a mudança é da água para o vinho. É uma coisa quase que dramática, como de fato foi o que ocorreu com muitas empresas que fizeram IPO em 2007 e não estavam preparadas. Quando você se prepara, tem algumas mudanças, mas elas são mais um passo. Você já subiu 90 andares de 100 que precisa subir. É necessário percorrer aquele restante, mas você não está tão distante assim do seu objetivo.

 Falando em termos práticos, é preciso criar uma área de relações com investidores, se acostumar com divulgações trimestrais e ter um foco ainda maior em resultado. Em nossas vidas, fatiamos o tempo em dias, semanas, meses e anos; os investidores fatiam o ano em quatro trimestres e querem ver os resultados dessa maneira. Diria que tem novas competências que passam a ser necessárias, criamos uma vice-presidência de finanças e relações com investidores, mas a minha vida particularmente foi muito intensa na preparação para o IPO e se tornou um pouco menos complexa logo no dia seguinte.

 CRN Brasil – Algum exemplo do que fazia antes e que não é mais necessário agora? 
 Menache – Não é isso. A preparação exige uma série de apresentações, materiais, reuniões com advogados. Como adotamos uma estratégia de não contaminar, no mal sentido, a organização, nos sobrecarregamos demais para que a organização não fosse afetada com o processo, não perdesse tempo, continuasse vendendo, atendendo cliente, criando produto. Basicamente, grande papel de toda companhia foi entregar e continuar entregando bons resultados. Mas a parte da preparação do processo concentramos muito em nós, e isso foi muito trabalhoso.

 CRN Brasil – Ouviu alguma coisa legal de algum dos funcionários da Linx quanto ao processo de abertura de capital? 
 Menache – Uma pergunta que ouvia muito é “o que o fato de sermos uma empresa de capital aberto muda na nossa vida?”. E, na prática, quando você faz as coisas direito, nada deveria mudar. Ou seja, é continuar trabalhando, vendendo, entregando, falando a verdade. Tem que tomar cuidado com o que fala, mas a essência não muda. E digo mais: se mudasse muito a vida das pessoas, a empresa não estava preparada.

 CRN Brasil – Você citou que o IPO gerou cerca de R$ 250 milhões para investir em aquisições. Com esse dinheiro em caixa, para onde caminha o crescimento inorgânico da companhia? 
 Menache – Esse ano, fizemos um número maior de aquisições do que nos anteriores. Compramos diversas empresas pequenas, algumas médias. Nosso plano para o ano que vem é seguir na mesma rotina. Identificando oportunidades boas, empresas com bons empreendedores e que estejam alinhadas ao nosso objetivo. Isso é muito importante. Atualmente temos sido muito procurados por empresários que desejam vender seus negócios, só que eles não olharam para aquilo que é a nossa estratégia, que é fazer software para varejo. Então aparecem companhias de outras coisas, e isso não nos atrai. Mas quem for muito bom naquilo que faz, e a gente identificar um time empreendedor, um bom mercado potencial, é algo que sempre nos interessamos muito.

 CRN Brasil – O mais importante no alvo de aquisições é que sejam sempre companhias de software ou sempre organizações que atuem com foco no varejo? 
 Menache – Falamos sempre em empresas de tecnologia para varejo.

 CRN Brasil – O que é uma boa empresa para vocês? 
 Menache – É uma companhia que tenha boa tecnologia, bons clientes, boa reputação – isso é fundamental –, que seja rentável, que tenha crescimento. Acho que esses são alguns dos elementos que gostamos.

 CRN Brasil – Como está a estratégia de canais? 
 Menache – A Linx sempre foi muito mais forte na venda direta do que por canais. Os parceiros fazem uma complementação geográfica. Particularmente, as duas últimas aquisições que fizemos têm 100% de seus negócios através de revendas e é algo que pretendemos manter. Hoje, nosso número total de canais já deve passar de 200. É bem verdade que são revendas bastante pequenas e regionais, mas eles têm tomado uma atenção cada vez maior dentro do nosso negócio.

 CRN Brasil – É algo que tende a crescer daqui para frente? Por exemplo, estender o portfólio de vocês para essas companhias que trabalhavam com produtos de empresas adquiridas? 
 Menache – Sim, na medida que elas estejam capacitadas para suportar a venda de mais soluções. Muitas vezes não adianta esse canal, que tem quatro pessoas e já não dá conta da demanda que existe, querer fazer mais coisa. A partir do momento que essa revenda se capacitar e estiver apta, a ideia é oferecer mais coisas.

 CRN Brasil – Há algo específico no horizonte para fortalecer ou ampliar as vendas indiretas? 
 Menache – Temos hoje uma diretoria de canais, coisa que não tínhamos no passado. Foi criada em 2012 e responde para o nosso diretor comercial. Temos ampliado o escopo e criado suporte diferenciado para a revendas, de atendimento, capacitação e certificação. Isso tem avançado.

 CRN Brasil – Atualmente, quanto as vendas indiretas representam dentro das receitas da companhia? 
Menache – Diria que por volta de 80 e poucos por cento da nossa venda é direta e o restante é através canais.

 CRN Brasil – Qual a sua percepção sobre o momento econômico? 
 Menache – Não olhamos muito para isso. Olhamos que temos grande mercado e precisamos fazer o nosso melhor. Podemos crescer um pouco mais ou menos dependendo da economia, mas, como falei, enxergamos muita oportunidade independente do PIB. Adivinhar qual vai ser o PIB do ano que vem, para nós, faz pouca diferença.

 CRN Brasil – E a parte da indústria de TI como um todo? 
 Menache – Olhamos para aqueles que são focados no nosso segmento, que é uma indústria absolutamente fragmentada, formada por muitas pequenas empresas regionais que, muitas vezes, fazem um software adequado a determinada cidade, mas não tem braço ou disponibilidade humana e financeira para fazer um sistema que atenda o País todo. É isso que posso dizer sobre a indústria que a gente está.

 CRN Brasil – Quais as vantagens de ser um fornecedor de nicho? 
 Menache – A primeira, e isso tem uma relevância significativa, é que eu não chego no meu cliente para entender o que ele faz e adaptar o que eu faço. Isso é fundamental. Eu chego entendendo o que é o mercado dele e do que ele faz e tento melhorar isso. Temos um grau de profundidade e essa é a diferença.

 CRN Brasil – Voltando um pouco a conversa, no processo de abertura, vocês chegaram a cogitar, em algum momento, dar um passo atrás? 
 Menache – Sinceramente não, mas não teria medo em dar um passo atrás. Fizemos uma consulta prévia a investidores. Estávamos preparados para o caso de a reação não ser aquela que esperávamos. A empresa não precisava daquela captação, não havia necessidade de caixa.

 CRN Brasil – Depois de vocês, empresas brasileiras de TI retomaram o discurso de IPO. Veremos novas aberturas de capital? 
 Menache – Acho que tem algumas que vão fazer uma listagem, outras farão o IPO. A dificuldade no Brasil é que você ainda não tem um mercado demandando por empresas de pequeno porte. As companhias que têm porte suficiente para fazer a abertura de capital e que são atrativas para o investidor, não só pelo tamanho, acabam ficando escassas. No setor de TI, de maneira mais ampla, veremos algumas coisas, mesmo que não seja em um número realmente significativo. Vamos ver alguns movimentos. Acho muito importante que o mercado cresça. Isso é bom para todos.

 CRN Brasil – Há uma proliferação de startups. Muitos desses jovens empreendedores veem o IPO como algo glamoroso. Qual seria o conselho para essas pessoas?
 Menache – Primeira coisa é que se você está em busca de glamour, mude de ramo. Não é o isso que vai te fazer ser bem-sucedido. Pense a longo prazo. Talvez demore 30 anos para que sua empresa se torne relevante. Para mim, a ação tem que ser de curto prazo e o plano tem que ser de longo prazo. Se você construir hoje o seu amanhã, vai ter algo que vai sustentar o seu negócio hoje, mas que talvez não seja sustentável a longo prazo. Meu conselho seria: pensem um pouco além, mas mantenham os pés no chão.

 CRN Brasil – Como a empresa encara conceitos como cloud e mobilidade? 
 Menache – Só pensamos em cloud. Hoje, aproximadamente 30% de nossa receita vem de software oferecido na nuvem. Estamos investindo em mobilidade, compramos uma startup nessa frente e temos alguns cases na área.

 CRN Brasil – E a parte de social business e big data? 
 Menache – A questão é que você não tem, atualmente, gente preparada para entender, analisar, compilar dados e saber o que fazer com isso. Você tem dados e não tem análise. Nosso grande desafio é tentar entregar isso de maneira mais simples para nosso cliente, para que ele tome ações mais efetivas. Não há clareza no mundo do varejo de como se vai extrair valor a partir do big data. As empresas têm um processo de maturidade de TI e ainda vão demorar um pouco para chegar lá. Algumas chegarão antes, outras depois. Mas ainda são escassos os casos práticos disso. Quem sair na frente vai colher antes os benefícios e é algo que cada vez mais vai fazer do futuro das companhias. Por Felipe Dreher
Fonte: crn.itweb 20/01/2014

20 janeiro 2014



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