08 maio 2012

Tarpon vai de sonho juvenil à gestora de R$ 8 bi em 10 anos

No mundo dos pescadores, o tarpon é um peixe que vive em águas quentes e tropicais, pode alcançar mais de dois metros de comprimento e até 150 quilos. Muito bom de briga, é considerado verdadeiro troféu de pesca.

 Não foi à toa que, há dez anos, José Carlos Reis de Magalhães, o Zeca, escolheu esse nome para a sua gestora de investimentos. "Nascemos com o desejo de ser especial. Nas águas, há milhares de lambaris. Mas sempre quisemos voltar para casa com um peixe grande", conta Pedro de Andrade Faria, outro fundador da Tarpon.

 Quando surgiu, a gestora reunia uma equipe muito jovem. O desafio inicial era a credibilidade. Quem entregaria recursos para meninos na casa dos 20 anos que, apesar da energia de jovens, precisavam acoplar experiência para evitar os arroubos? A resposta inicial veio de "family and friends" e a gestora começou com R$ 2,9 milhões sob gestão.

 Para superar a ausência de história e experiência, montou um conselho consultivo, formado por grandes investidores como Guilherme Affonso Ferreira, Luis Alves e Luis Stuhlberger.

 Os meninos usaram a ousadia da juventude a seu favor e formataram um negócio que os diferencia entre as gestoras brasileiras - basicamente com cotistas estrangeiros, visão de longo prazo e investimentos em poucas companhias.

 "Nos distanciamos da gestão de curto prazo. Procuramos capital que nos viabilizasse como uma empresa de longo prazo. Hoje não queremos ser vistos como um fundo, mas como uma holding que administra participações em empresas", resume Eduardo Mufarej, sócio da Tarpon desde 2004.

 Ao mesmo tempo em que comemora dez anos, a gestora completa cinco como uma empresa aberta. Em maio de 2007, captou R$ 462 milhões que passaram a ser recursos próprios para investimentos e que aumentaram o total sob gestão para R$ 1,5 bilhão.

 Segundo Mufarej, o momento da abertura de capital foi o mais delicado em termos de relacionamento com os cotistas. "Levou um bom tempo para eles entenderem que não tomaríamos o mesmo caminho de outras gestoras que listaram ações pelo mundo", diz.

 A receita comum foi abrir capital e, no momento da oferta, os gestores venderem suas fatias, embolsando recursos. Em seguida, com o dinheiro novo, a escolha da maioria foi pela diversificação - lançando fundos setorizados, investindo em muitos ativos, olhando o curto prazo.

 "Nunca fizemos isso. Continuamos focando poucos investimentos. Tínhamos certeza de que, se fizéssemos como a média, estaríamos na média. Queríamos escapar dessa armadilha", diz Mufarej.

 Dentro da lógica da Tarpon, a abertura de capital foi um evento de "iliquidez". A gestora já havia entendido que precisava, para viabilizar a estratégia de longo prazo, encontrar recursos com esse perfil. Diante da pouca cultura brasileira de investir e da consequente dificuldade dos locais em suportar os solavancos das bolsas, foi buscar cotistas estrangeiros. As grandes parcerias - e aportes - vieram de fundos de pensão e "endowments".

 O IPO coroou a estratégia, pois ampliou o capital proprietário e deu maior segurança aos investimentos. Hoje, os ativos sob gestão beiram os R$ 8 bilhões

 Em recente palestra na Casa do Saber em São Paulo, Zeca disse que a estabilidade de capital conquistada na oferta foi decisiva para que a Tarpon chegasse onde está.

 Concordando com o imenso valor que a operação teve, Mufarej destaca também que a manutenção do DNA da gestora, de longo prazo e poucos investimentos, foi o fundamental. "Apesar do desconforto inicial, hoje ouço de 100% dos cotistas que o IPO nos alinhou ainda mais com eles", conta Mufarej.

 Quando chegou à bolsa, a Tarpon possuía sede nas Bermudas e negociava recibos de ações na Bovespa. Dois anos depois, em 2009, modificou sua estrutura, segregou as áreas de gestão de recursos de terceiros e a de investimentos com capital próprio e foi listada no Novo Mercado.

 A tributação e os custos para uma companhia de investimentos no Brasil são bastante elevados. Em tese, a Tarpon nem precisaria manter-se com o capital aberto, uma vez que já equacionou o capital sob gestão.

 "É um jogo de equilíbrio. Estamos sempre avaliando se valeria a pena fechar capital. Temos vários ganhos, inclusive em transparência, e por enquanto ainda vemos mais prós do que contras na estrutura atual", diz Mufarej.

 O sócio começou na Tarpon como gestor, ao lado de Zeca. Mas logo passou a ser a figura que sai em busca de novos investidores. Hoje Mufarej passa boa parte do tempo no escritório de Nova York. Nas horas vagas, é dirigente de rugby.

 Pedro Faria fez de tudo um pouco na gestora e, quando ficou claro que ela não iria administrar recursos, mas sim participações em empresas, foi o originador de negócios. Hoje é quem acompanha mais de perto o dia a dia das empresas em que investem. Todos eles, e os outros três sócios da Tarpon, estão em diversos conselhos.

 "O meu papel na sociedade é propiciar as condições para desenvolvermos nossas visões em empresas", diz Faria. "Não somos uma gestora que só compra e vende papéis. Somos parceiros."

 Quando faz o investimento, a equipe da Tarpon define alguns aspectos que acham importante para ajudar a aprimorar na companhia. "Temos mais uma cabeça de empresário do que de gestor.

" Faria conheceu Zeca no banco Patrimônio, onde o hoje sócio começou, como estagiário. Em 2001, ele vivia um momento de transição no Patrimônio e Zeca já havia passado por outros lugares. Quando veio o convite, Faria estava em uma temporada de estudos em Chicago, com o compromisso de voltar ao antigo emprego. Inicialmente, participou da Tarpon no conselho. Sete meses depois, transferiu-se para a gestora. 

Supersticioso, fez questão de escolher o verde para ser a cor da gestora. O nome Tarpon também remete à prosperidade e multiplicação, representação simbólica do peixe. Diz a lenda que Zeca sempre sonhou em pescar um tarpon. Fisgou o seu primeiro logo após abrir a gestora, na Costa Rica. A partir daí não se sabe ao certo quantos mais foram parar em seu anzol. Por Ana Paula Ragazzi
 Fonte: Valor Econômico 08/05/2012


Tarpon busca construir parcerias com empresas

 Em seus dez anos de vida, a Tarpon esteve à frente de operações de destaque no mercado brasileiro. Em 2006, lançou a primeira oferta hostil de compra de controle em 27 anos no Brasil, para a Acesita. Em 2008, tentou formatar uma outra oferta, para ficar com a Sadia. E é da gestora o caso de maior sucesso de ativismo no Brasil, em sua intervenção na gestão da Cremer, em 2009.

 Nesses tempo, os sócios contam que aprenderam a criar bons e perenes relacionamentos. "Em operações recentes, notamos uma escolha por fazer negócio com a Tarpon, não uma escolha pelo capital. Isso aumenta nossa responsabilidade", conta Pedro de Andrade Faria.

 "A percepção é a de que estamos lá para agregar. Temos mais de 45 parcerias bem-sucedidas, com retorno de 30% ao ano.

" O tamanho que a gestora atingiu hoje também permite que possa agir sozinha, sem ter de reunir-se com outros investidores para alcançar participação relevante em uma empresa.

 Em 2009, na Cremer, fabricante de produtos médico-hospitalares, um pool de gestores se aliou para promover mudanças na companhia - os fundos queriam que a empresa distribuísse seu caixa e melhorasse a rentabilidade do negócio. Um dos executivos da Tarpon assumiu a presidência da empresa, José Carneiro, que está no cargo até hoje.

 "A Cremer foi a primeira empresa em que tivemos um espaço efetivo para implementar aprimorações em vários aspectos. Governança, gestão, alocação de capital e decisão. Foi com essa experiência que percebemos que poderíamos replicar o modelo com sucesso em outras companhias. Descobrimos a nossa vocação", resume Faria.

 O investimento em Acesita foi o que mostrou à gestora a necessidade de captar investidores de longo prazo. Uma queda no preço das ações era enxergada pela Tarpon como oportunidade - no entanto, ela enfrentou uma chuva de resgates. Foi obrigada a deixar o investimento, em um primeiro momento, porque os cotistas saíram. Como contou José Carlos Reis de Magalhães, o Zeca, a ouvintes na Casa do Saber, a experiência foi determinante para buscarem relação de sócios com clientes. Foi com parceiros que tentou levar o controle da Acesita, porém sem sucesso.

 Além das atitudes mais ousadas, a Tarpon tem sido aprovada pelos cotistas por sua estratégia de gestão capaz de se antecipar ao mercado. A administradora de recursos passou por vários ciclos de investimento. Em 2005, quando a bolsa não vivia um bom momento, concentrou sua estratégia em "private equity".

 Nessa época comprou participações na Brasil Agro, Direcional Engenharia e na Arezzo.

 Veio então a crise financeira global de 2008 e o capital proprietário conquistado com o IPO, em um momento de escassez de recursos e resgates em outros fundos, possibilitou à gestora investir em ações que estavam muito descontadas na bolsa. Nesse período, aumentou a exposição ao varejo, como exemplos, Lojas Hering e Marisa.

 Da metade de 2010 até o fim de 2011, o mercado viveu uma fase em que não havia recursos novos para a bolsa. "Foi quando houve claramente uma rotação de posições. O cenário era de pouco crescimento no mundo e, aqui, investidores buscavam exatamente histórias de crescimento", diz sócio Eduardo Mufarej.

 As chamadas "small caps", empresas de pequeno e médio portes, passaram a chamar atenção.

 "Nunca na história do mercado o prêmio de 'small caps' para 'large caps' foi tão grande", conta Mufarej. "Mas nós já tínhamos investidos nas pequenas antes e aproveitamos para realizar lucros e aplicar os recursos nas maiores, que ficaram para trás", diz. Foi o momento de vender fatia na Hering e de formar posições em Metalúrgica Gerdau e Cyrela - hoje as fatias em cada uma estão em 15% nas preferenciais da metalúrgica e de 10% nas ordinárias da construtora.

 As investidas em empresas maiores fizeram com que o mercado questionasse se eles não estariam exagerando ao avaliar que poderiam fazer ativismo em companhias desse porte.

 Mufarej explica que a gestora não tem perfil agressivo e só se associa a empresas quando enxerga oportunidade de agregar valor. "Fazer um investimento como esse, em que seremos parceiros, teremos um assento no conselho significa que vamos ter acesso a informações que vão restringir os nossos investimentos. Então eu só vou fazer isso se concluir que será positivo me engajar. Se não, vira um esforço para nada", diz.

 Além de Gerdau e Cyrela, a gestora tem fatia relevante em Brasil Foods, de 8%. Resultado da união entre Sadia e Perdigão, esse é um dos investimentos representativos para o fundo que ainda não trouxe retornos satisfatórios.

 Esse é, na verdade, um caso antigo para a Tarpon. A gestora investiu em Sadia em 2002, quando o mercado não olhava tanto para o papel, e saiu da posição em 2005. Três anos depois os sócios foram surpreendidos pelos graves problemas da empresa com derivativos. Ali enxergaram a oportunidade. Já conheciam o negócio, a família fundadora e possuíam acesso a capital, graças ao relacionamento com cotistas.

 Fizeram uma proposta para ficar com o controle, ao lado da família fundadora, injetando R$ 2 bilhões. Indicariam ainda o presidente e o diretor financeiro, para se certificarem de mudanças na gestão. O negócio não saiu, como se sabe. E restou à Tarpon comprar novas ações na oferta feita pela empresa e atingir fatia relevante. Desde o ano passado, estão também no conselho da companhia.

 Para a gestora, o risco de uma empresa é a possibilidade de deterioração permanente do negócio, sem voltar a gerar valor. Se enxerga que a empresa está em momento delicado, mas pode consertar o rumo e se tornar muito rentável, forma as suas posições, que, não raro, chegam a representar até mais de um terço do fundo - investidos em uma única companhia.

 A Tarpon informou ontem que no primeiro trimestre do ano teve lucro líquido de R$ 12 milhões. Os ativos sob gestão ficaram em R$ 7,5 bilhões, com alta de 10%. A empresa destacou que o período foi de forte valorização para Marisa e Gerdau e leve desvalorização em Brasil Foods.

 Em sua história, há também casos de pouco sucesso. A empresa ainda não obteve retorno com o investimento em Springs/Coteminas. E na Brenco, de etanol, viu dificuldades por não estar sozinha no controle. Também a abertura de capital da Direcional Engenharia não teve a demanda esperada.

 Hoje, voltou a ver oportunidades fora da bolsa - fechou negócio com a grife Morena Rosa. E, daqui para a frente, tende a olhar mais investimentos fora do Brasil - sob a leitura de que lá fora os preços estão mais atraentes. Por Ana Paula Ragazzi
Fonte: Valor Econômico 08/05/201

08 maio 2012



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