17 abril 2012

Omissão do Groupon sobre qualidade de controles é legal

Eis um fato desestabilizador para qualquer pessoa que pensa em algum dia comprar ações numa empresa que acaba de abrir seu capital: mesmo quando seus executivos sabem que seus sistemas contábeis internos estão em frangalhos, eles não têm obrigação de revelar esse fato antes de a empresa negociar suas ações em bolsa.

Essa é uma lição que os acionistas do Groupon aprenderam a duras penas. Os papéis da empresa chegaram a cair 17% no começo do mês, depois de a empresa de compras coletivas on-line ter identificado uma "deficiência significativa" em seus controles internos sobre o balanço de 31 de dezembro. A empresa revisou, além disso, seus resultados do quarto trimestre, que passaram a exibir uma receita mais baixa e um prejuízo maior, depois de encontrar erros em sua contabilidade de reembolsos aos clientes.

Será que o Groupon não sabia, antes de sua oferta pública inicial (IPO), em novembro, da fragilidade de seus controles? Paul Taaffe, porta-voz da empresa, preferiu não comentar. Mas vamos supor que seus executivos efetivamente soubessem. Mesmo assim, eles não tinham de informar os investidores de antemão.

Isso por que não há qualquer exigência de revelar a fragilidade dos controles no prospecto do IPO de uma empresa. O Groupon não tinha qualquer obrigação de expor o problema antes de encaminhar sua primeira demonstração de resultados trimestral ou anual como empresa com ações negociadas em bolsa - que foi o que fez. Ludibriar dessa maneira os investidores em IPOs é perfeitamente legal, ao que se constata.

O motivo disso é a grande lacuna da Lei Sarbanes-Oxley. Ela tem dois principais artigos referentes aos controles internos das empresas, que são os sistemas e processos que as empresas devem ter para garantir que as informações que divulgam são precisas. Essas cláusulas são válidas apenas para empresas abertas, não para as que se registraram para realizar IPOs.

O prospecto do Groupon advertiu serem possíveis futuras notificações sobre fragilidades de controle. A empresa disse também ter "apenas recentemente preenchido uma série de cargos na equipe de alta direção e nos quadros financeiro e contábil". Mas não faz menção ao fato de os controles do Groupon serem ou não eficientes na época. Isso não é exigido.

Uma porta-voz da SEC, Judith Burns, confirmou: "Não há exigência de divulgar uma fragilidade significativa no prospecto." Ela falava de maneira geral, e não de qualquer empresa específica.

Mas é preciso reconhecer os méritos a quem de direito: dois autores de artigos que chegaram à conclusão perfeita sobre o Groupon foram Anthony Catanack, professor de contabilidade da Universidade Villanova, e Edward Ketz, professor de contabilidade da Universidade Estadual da Pensilvânia.

"É totalmente absurdo pensar que o Groupon esteja, em algum ponto, próximo de ter um conjunto eficiente de controles internos sobre a demonstração financeira, após ter feito 17 aquisições em pouco mais de um ano", escreveu a dupla em artigo publicado em 24 de agosto em seu blog, o Grumpy Old Accountants. "Quando uma empresa se expande para 45 países, amplia os comerciantes conveniados de 212 para 78.466 e aumenta sua base de funcionários de 37 para 9.625 em apenas dois anos, não há dúvida de que os controles internos, em algum lugar, não estão funcionando."

Mesmo antes de abrir seu capital, o Groupon reapresentou seu balanço em setembro para corrigir os erros de reconhecimento de receita -operação que reduziu as vendas de 2010 de US$ 713 milhões para US$ 313 milhões. Isso, por si só, deveria ter sinalizado para os investidores a ausência de controles do Groupon. No entanto, o mercado se comportou como se estivesse surpreso.

O fiasco do Groupon, compreensivelmente, estimulou comparações com a nova legislação de valores mobiliários que o presidente dos EUA, Barack Obama, sancionou em lei. A regra permite que empresas que recentemente abriram seu capital passem cinco anos sem fornecer relatórios sobre os controles internos formulados por auditores externos, desde que sua receita anual seja inferior a US$ 1 bilhão (O Groupon teve receita de US$ 1,6 bilhão em 2011).

A nova legislação reduz as obrigações de divulgação de outras maneiras. A correspondência pré-IPO entre as empresas e a equipe da SEC será inicialmente classificada como secreta, por exemplo. A lei é um desvio na direção oposta ao que se necessita.

Não nos enganemos, no entanto. As proteções vigentes para os investidores em IPOs eram tímidas antes da nova lei. O caso do Groupon é apenas a mais recente evidência. Existe apenas uma solução para investidores que não são especialistas: nunca compre ações de uma empresa que acaba de abrir seu capital. Por Jonathan Weil da Bloomberg News.
Fonte: Valor Econômico 17/04/2012

17 abril 2012



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